"Quando eu era criança, me achava fisicamente 'diferente' das minhas amigas brancas, mas sabia que eu não era negra. E, na minha cabeça, só existia branco, negro ou asiático", diz a tradutora Bruna Miranda, 26, que há um ano vem buscando mais detalhes sobre sua origem. "Com a ajuda de um tio que mora em São Luís, no Maranhão, tenho feito uma pesquisa pelos registros e certidões de nascimento da família. Alguns indícios me levam a acreditar que sou descendente Tupinambá. É doloroso viver nesse limbo entre saber que tenho uma ascendência mas, ao mesmo tempo, não saber de onde vim".
Bruna não é a única brasileira que demorou para descobrir de onde vêm seus traços e cores. Afinal, em nosso imaginário, há pouquíssimas variações sobre o que é ser indígena. Em geral, a figura que vem à cabeça é de pessoas de cabelos pretos e lisos, pele dourada, olhos puxados. Têm o corpo nu ou minimamente recoberto com acessórios feitos de penas, palha, sementes, ossos. Na cabeça, usam um exuberante cocar.
Mas, em uma população marcada pela pluralidade e miscigenação, não é possível definir uma só forma de ser ou parecer indígena. Muitos de nós, brasileiros e brasileiras, somos descendentes (ainda que distantes) dos povos originais das Américas, que habitavam este território muito antes da chegada dos europeus.
Segundo as contagens oficiais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), menos de 0,5% da população brasileira é formada por indígenas. Os mais de 240 povos somam só 896.917 pessoas, segundo o último Censo, de 2010. Dessas, três em cada nove vivem em cidades, e o restante, em áreas rurais. Ainda assim, o próprio órgão reconhece que esse número é subestimado. Afinal, ele não inclui os povos que não fizeram contato com os brancos e pessoas que desconhecem ou preferem não assumir sua origem.
Nos últimos anos, porém, vem aumentando a quantidade de gente que busca saber mais sobre suas raízes. Tal movimento foi iniciado com a promulgação da Constituição, em 1988 (quando os indígenas passaram a ser reconhecidos cidadãos brasileiros), e tem ganhado ainda mais força na última década. "Isso representou a proteção de direitos e interesses e impulsionou um fenômeno de busca pela autodeclaração, pela afirmação da identidade", diz o escritor Daniel Munduruku, doutor em educação pela Universidade de São Paulo (USP) e fundador do Instituto UKA - Casa de Saberes Ancestrais.
A reportagem de Ecoa conversou com cinco pessoas que têm buscado e afirmado suas origens indígenas. São relatos marcados não apenas pela curiosidade, mas pela dor de saber que um pedaço da própria história foi omitido e que nem sempre pode ser recuperado.