O futuro desse planeta nascerá do lado de lá do Atlântico. E será cada vez mais preto.
Ou, como declarou em 2016 Achille Mbembe, filósofo camaronês e um dos principais estudiosos do pós-colonialismo: "O mundo de amanhã será a África", referindo-se ao fato de que daqui 30 a 50 anos uma em cada três pessoas no planeta será africana ou descendente de uma em diáspora. Na visão do intelectual, torna-se necessário pensar caminhos para que essa vantagem populacional se traduza em produção de riquezas em vez de uma maior precarização da vida de negros e negras no mundo.
E se perguntarem qual será a cara desse futuro, talvez possamos dizer que se parecerá com um pássaro, muito conhecido em algumas culturas africanas. Diferente dos outros, o bicho pode ser facilmente reconhecido por estar sempre olhando para trás enquanto voa para frente. E por isso é comumente usado para ilustrar o conceito de Sankofa, que tem como base um provérbio vindo do que hoje conhecemos por Gana, que diz: "não é errado voltar para buscar aquilo que esquecemos", em tradução para o português. Comumente também observamos a utilização dessa imagem para representar um movimento que justamente nasce para abrir espaços largos para o negro em diáspora fantasiar imagens de futuro.
O afrofuturismo, assim como o pássaro, apesar da grande ligação com o que ainda está por vir, sempre olha para trás. Busca os saberes ancestrais enquanto avança. O movimento formalmente recebeu esse nome no começo dos anos 1990 e possui algumas definições — só nessa reportagem, seis pessoas dão seis visões diferentes, porém não excludentes. O afrofuturismo vive em uma constante conversa entre o que é a realidade e o que é ficção. Apesar das obras mais conhecidas serem no campo do cinema, música e literatura, o diálogo com a ciência e a tecnologia também se faz de forma direta.
Enquanto pessoas negras estão escrevendo obras ficcionais, cientistas, professores, estudiosos trabalham para provar na prática e formalizar os conhecimentos que o movimento prega.
Ficção e realidade andam juntas, se completam e buscam, também juntas, construir o movimento que tem como principal trunfo apresentar novas narrativas que contam histórias do povo negro para além das tragédias, da dor e do sofrimento, buscando no passado pré-colonial respostas para perguntas que podem construir um outro tipo de presente e de futuro.