"Sou médica. Aprendi tudo que sei em minha graduação de medicina na Universidade do Vale do Sapucaí, em Pouso Alegre, sul de Minas Gerais, e nas experiências profissionais que tive durante os anos. Mas costumo dizer que quando um novo paciente pisa em meu consultório pela primeira vez, tenho que aprender a ser médica do zero.
Digo isso porque é comum consideramos que a doença é a mesma para várias pessoas, mas, na verdade, a experiência do adoecimento é única para cada paciente. No final das contas, a gente é especialista em medicina, mas aquela pessoa é especialista nela mesma.
Só percebi isso com mais clareza quando fui para Pará de Minas, cidade próxima de Belo Horizonte (MG), para trabalhar com medicina de família e comunidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Precisamos não apenas ouvir o que é falado, mas também o que não é falado. Observar mesmo.
Subjetividade essa que me vem antes da medicina, para falar a verdade, e chegou em forma de arte. Tenho em minha família muitos médicos, claro, mas também muitos músicos. Sempre fui deixando essas influências chegarem, e com 14 anos, comecei a cantar profissionalmente.
Certa vez recebi um convite do pessoal da residência de medicina de família do Rio de Janeiro para trabalhar lá por um ano. Aproveitei para me dedicar a conhecer profundamente o samba carioca, que é o estilo que mais canto hoje.
Quando voltei, dividia meu tempo entre atender meus pacientes durante o dia no interior, e a noite eu voltava para cantar em Belo Horizonte. Diariamente, eram sempre os mesmos 400 km que separavam geograficamente uma profissão da outra.
Foi essa decisão de não escolher entre uma ou outra que me iniciou de alguma forma no atendimento médico humanizado."