No quarto episódio da série de vídeos de Ecoa "Cada ação importa", sobre iniciativas e atitudes que contribuem para um mundo melhor, o educador e antropólogo Tião Rocha conta como é possível fazer educação sem escola, transformando comunidades em salas de aula.
"Um belo dia, como professor da Universidade Federal de Ouro Preto, tive uma coisa que os americanos chamam de 'insight'. Nós, mineiros, chamamos de clarão mesmo. Cheguei e falei: chega. A partir de hoje não quero mais ser professor, quero ser educador. Professor é aquele que ensina, educador é aquele que aprende. E eu queria aprender. Foi a partir daí que criei o CPCD, Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento, uma instituição de aprendizagem. Como é que a gente faz para que todos aprendam tudo que precisam, no seu tempo e no seu ritmo?"
Foi na cidade de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, que Tião teve a resposta: convocando a comunidade e compartilhando o que as pessoas querem, sabem e fazem na região. "Usamos a pedagogia que chamo de 'copo cheio', que é chegar numa comunidade e olhar para o lado cheio do copo, a potência. Quem mede lado vazio mede carência, mede o que falta, e o que me interessa é medir o que tem."
Em Araçuaí, as casas, os quintais e as varandas se tornaram espaços escolares, salas de aulas no sentido de encontro e de troca. "Eu batia na porta e falava: o que que a senhora sabe fazer ou pode fazer? 'Sei fazer nada, não, Tião. Quem tem que fazer isso é a prefeitura, o Estado...'. Mas a senhora não sabe fazer nada bem feito? Eu não acredito. 'Eu sei fazer biscoito'. Então a senhora pode dar uma aula disso. Falei: meninada, só vai comer biscoito quem escrever o nome, seu próprio nome. Pronto, foi o que bastou! Em um instantinho eles escreviam: An-tô-nio."
Com o objetivo de melhorar não só a educação mas a qualidade de vida daquela população, Tião buscou criar uma cidade que educa. "Como é que essa comunidade convive com a questão ambiental, com a questão do trabalho, com a questão da seca? É possível a gente aproveitar os três meses de água por ano, e viver os 12 meses que precisa, nove meses sem água? Nós fomos aprender com o Instituto de Permacultura da Amazônia, dos pampas, do cerrado e trouxemos e adaptamos ao nosso jeito, no Vale do Jequitinhonha."
Após o esforço e trabalho em conjunto, em 2006, durante o 9º Congresso Internacional de Cidades Educadoras, em Lyon, na França, Araçuaí ganhou o prêmio de referência como cidade educadora.
Depois disso, pra cá vieram estudiosos e pesquisadores para saber: o que aconteceu aqui? Eles chegaram à conclusão do seguinte: existe aqui nesta região algo que os americanos chamam de 'empowerment', que é traduzido como empoderamento da comunidade. Aí eu falei: Não, aqui não chama empoderamento, não. Aqui chama 'empodimento'. Não é poder, é potência. Nós podemos. Nós podemos transformar isso aqui."
Tião Rocha, antropólogo e educador