Maria Mendes foi chamada à sala do chefe. Uma espécie de aquário de onde ele observava suas funcionárias. "Queria saber por que você vai tanto ao banheiro", ele perguntou. Ela, então, retirou de sua bolsa um absorvente e o mostrou. "É por isso. Você não sabe que mulher menstrua?".
"Dentro da fábrica a gente sofria muita discriminação", lembra. Diferentemente dos homens, as mulheres eram impedidas até de fumar nas dependências da empresa. "Um critério absurdo", pontua. "Assim que soube pelo diretor do sindicato dos metalúrgicos que aquilo não estava certo, já acendi meu cigarro. Daí começou nossa organização."
Maria Mendes foi uma entre os milhares de trabalhadores que participaram das greves do ABC paulista entre 1978 e 1980. A região da Grande São Paulo, que inclui os municípios de Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Diadema, viu a primeira manifestação nascer em 12 de maio de 1978 e se expandir fábricas adentro.
Uma busca simples na internet pode dar a falsa impressão de que a presença de mulheres foi algo incomum no movimento, o que não é verdade. Em meio às demandas por aumento de salário e liberdade sindical, encontravam-se reivindicações específicas delas.
"Nossa bandeira sempre foi direito à creche, salários iguais e contra o assédio sexual nas fábricas", explica Maria. "E na empresa onde trabalhei quem puxou a greve foram as mulheres. Nós entramos na seção dos homens e paramos as máquinas". Hoje, aos 74 anos, ela não precisa mais pisar no chão da fábrica. Mas a luta que encampou ficou para a história.