"Eu me orgulho de dizer que sou doutora mas também sei fazer beiju, sei fazer farinha, ralo mandioca, carrego mandioca, capino roça, planto com minha mãe, faço tudo isso", diz Francineia Bitencourt Fontes, conhecida como Fran Baniwa, citando algumas das principais tarefas do cotidiano dos baniwas.
Ela foi a primeira mulher do povo a ter um mestrado e, em breve, se tornará também a primeira doutora, com tese sobre o papel das mulheres na sociedade baniwa, que será defendida no Museu Nacional, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na comunidade, desde cedo se aprende a trabalhar na roça, acompanhando os pais na lida diária. As crianças brincam, exploram o entorno, mas também observam e aprendem na prática a realizar as atividades que todos precisam fazer para viver — plantar, colher, caçar, pescar, cozinhar, fabricar utensílios.
Com uma população de cerca de sete mil pessoas em território nacional, os baniwas vivem na fronteira do Brasil com a Colômbia e a Venezuela, em aldeias localizadas às margens do Rio Içana e seus afluentes, em comunidades no Alto Rio Negro e nas cidades de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel e Barcelos (AM).
Fran Baniwa ressalta a rica bagagem que carrega, que une o conhecimento de dois mundos, o indígena e o não indígena. Munida desses saberes, a antropóloga baniwa vê um contraste entre o status do trabalho e a organização do tempo em cada um.
"No capitalismo, a gente só pensa no trabalho, trabalho, trabalho e esquece que há um espaço para aproveitar, respirar ar puro, ter uma vida diferente. Às vezes, a gente acaba esquecendo de viver por causa do trabalho, ele nos escraviza", diz. "Mas também porque, no mundo não indígena, sem trabalhar você não sobrevive. Aqui não, a gente tem a floresta, da qual a gente tira o nosso sustento."