Eram quase 19h de uma terça-feira quando um carro estacionou em uma praça na Vila Matilde, zona leste de São Paulo (SP). O cheiro bom de comida e o barulho do isopor raspando no banco de trás entregavam o porta-malas cheio de marmitas — todas prontas para serem distribuídas às pessoas que aguardavam em fila única na calçada.
O xeque paulistano Rodrigo Jalloul, 35, desceu do carro debaixo de garoa, acompanhado de três amigos que o ajudavam naquela noite: primeiro tiraram o galão de suco e as garrafinhas de água, deram copos e talheres para todos, e rapidamente entregaram cada uma das 70 marmitas preparadas pelo próprio pai de Rodrigo.
Tem sido esse o ritmo da vida do líder religioso — primeiro brasileiro nato a se tornar clérigo xiita —, que, apesar de encontrar vários sinônimos para se descrever como "rebelde" durante a entrevista, segue à risca o ensinamento que considera fundamental no islamismo. "O próprio Alcorão [livro sagrado do Islã] conta a respeito da caridade, do cuidado com o órfão, do cuidado com as pessoas mais pobres, com as mais debilitadas", afirma ele, que se converteu aos 18 anos.
A quem vê Rodrigo na fila de doação, o turbante branco é o único fator que o entrega como um sábio religioso. Rodrigo é quieto, não costuma falar sobre sua fé — evita misturar as coisas, conta. Mas diz que, vez ou outra, aparece alguém pedindo uma bênção.
"Não estou ajudando para poder converter alguém. É tudo questão de humanidade. Infelizmente, o islamismo ainda não tem uma cultura de caridade. Quero tentar mudar isso, não só pregando o que o Alcorão diz sobre ajudar o próximo, mas praticando isso para incentivar outras pessoas a fazerem também", explica.