Moradores defendem ONG acusada de incêndio na Amazônia: "Salvou crianças"
O Projeto Saúde e Alegria (PSA), organização fundada em 1985 e que, desde 1987, atua na Amazônia para melhorar a qualidade de vida de comunidades ribeirinhas, ganhou o noticiário esta semana após uma ação da Polícia Civil do Pará apreender documentos da ONG e prender voluntários da Brigada de Incêndio de Alter do Chão. O PSA é apontado como parte de um esquema que provocaria incêndios na floresta para obter recursos financeiros.
Os responsáveis pela ONG contestam a ação, dizendo ter sido arbitrária e que as acusações são infundadas. Organizações ambientalistas falam em perseguição, e o Ministério Público Federal pediu explicações à Polícia Civil sobre o caso, pois a investigação da Polícia Federal apontava para ação de grileiros e especulação imobiliária como a responsável pelos incêndios criminosos.
À reportagem de Ecoa, moradores que já foram atendidos pelo Projeto relataram o impacto que a atuação da ONG, criada pelo médico Eugenio Scannavino Netto e pela educadora Márcia Silveira Gama, teve em suas vidas. Atualmente, o Projeto Saúde e Alegria diz atender mais de 30 mil pessoas em 150 comunidades.
Com uma equipe técnica interdisciplinar que visita de barco as localidades, o PSA trabalha com programas de desenvolvimento comunitário integrado e sustentável em várias frentes, treinando multiplicadores para replicar ensinamentos que vão desde a higiene e cuidados com a saúde até a relação de respeito com o meio ambiente.
Djalma Moreira Lima, 56 anos
"Moro em uma comunidade chamada Suruacá, na margem do Rio Tapajós, município de Santarém (PA).
Conheci o projeto Saúde e Alegria no final de 1986, quando Eugenio visitou minha comunidade. Acompanhei o início do trabalho da ONG, em 1987, com vários trabalhos de saúde, agricultura, arte, grupo de mulheres.
Eu comecei a atuar na organização como monitor de saúde, ajudando a minha comunidade. Fui voluntário por 12 anos, aprendi a fazer o trabalho de prevenção de doenças. Fazíamos oficinas para aprender e, depois, levávamos as informações para o resto da população.
Com isso, ajudamos a melhorar a alimentação, reduzimos os índices de pneumonia, conjuntivite e outras doenças que tínhamos por aqui naquela época.
Eu abracei as oportunidades que o projeto me trouxe, consegui virar agente comunitário de saúde e mudei minha vida e a de muitas pessoas da minha região. A ONG salvou as nossas crianças. Nós acabamos com as mortes das crianças depois que ela entrou em nossas vidas."
Sara Ester Santos Ribeiro, 21 anos
"Moro na comunidade de Prainha 1, na Floresta Nacional do Tapajós, uma comunidade pertencente ao município de Belterra (PA). Conheci o projeto ainda criança. Os funcionários chegavam até nossas comunidades e ofertavam atendimentos na área da saúde para nós, nos alertavam a respeito de doenças, nos ensinavam como cuidar da água para consumirmos.
Lembro que eles chegavam no barco e levavam exatamente saúde e alegria para nós, ribeirinhos. Aos oito anos de idade eu comecei a participar de programações voltadas a falar da nossa vida, no intuito de melhorar nossas condições - principalmente de saúde. Daí me apaixonei pelo trabalho dessas pessoas, assim como todos os moradores da minha comunidade. Havia um índice muito grande de mortes por conta da água não tratada dentro da Floresta Nacional do Tapajós e, com a chegada do PSA às comunidades, esse índice caiu quase que totalmente.
As ações das quais participei foram oficinas comunitárias para aprender sobre higiene bucal, saneamento, além dos projetos Teia Cabocla (festival que reúne iniciativas juvenis econômicas e educativa) e Beiradão de Oportunidades (uma das ações do Saúde e Alegria que visa formar jovens em empreendedorismo para gerar renda na própria comunidade), em que eu pude me encontrar enquanto jovem.
O Projeto Saúde e Alegria é importante pra mim pelo fato de que foi por meio dele que eu pude obter conhecimento sobre o que é preciso fazer para mantermos nossa população saudável, e também porque, com o PSA, eu pude mostrar para as pessoas que eu tenho potencial de ser jovem e ao mesmo tempo ter responsabilidade dentro e fora da minha comunidade, me expressando de maneira adequada."
Ana Raquel Alves de Sousa, 25 anos
"Sou comunicadora popular e moro na Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns. Eu já nasci com o projeto atuando na comunidade e cresci vendo o trabalho que ele faz.
Desde criança, eu sempre participei dos eventos que o projeto fazia, desde o circo até as oficinas e cursos. Hoje eu estou finalizando um projeto que idealizei junto com mais três jovens moradores da Reserva Extrativista, que é a implantação de um meliponário (uma coleção de colmeias de abelhas sem ferrão) na comunidade de Suruacá. Nosso projeto se chama "Amazon Mel" e foi criado após ficarmos seis meses em formação com o Beiradão de Oportunidades.
Já participei de muitos encontros, como Teia Cabocla, oficinas no Cefa (Centro Experimental Floresta Ativa), manejo de abelha sem ferrão, entre outros.
O projeto é muito importante para mim, pois, com ele, eu tive oportunidades que, como moradora de uma reserva, eu não teria. Hoje eu tenho um projeto sustentável maravilhoso, bebo água potável que sai da torneira por causa deles. Antes, minha mãe tinha que carregar água do rio até em casa.
Tudo isso porque, agora, a gente sabe tratar a nossa água, tudo por um sistema que usa energia solar para funcionar. Todo mês um barco hospital passa pela comunidade - antes, as pessoas morriam por falta de atendimento. Eles nos trazem vacinas, remédios.
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