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Maioria no transporte público, mulheres criam redes de apoio e denúncia

Elizabeth Paik/Futura Press/Folhapress
Imagem: Elizabeth Paik/Futura Press/Folhapress

Bárbara Forte*

De Ecoa, em São Paulo

08/03/2020 04h00

São as mulheres que mais utilizam o transporte público em São Paulo. Seja para estudar, levar os filhos à escola, ir ao mercado, acompanhar alguém da família ao médico ou trabalhar. Ainda assim, estar na rua e se deslocar não é tarefa tranquila.

Segundo pesquisa da Rede Nossa São Paulo divulgada nesta semana, 43% das entrevistadas relatam ter sofrido assédio dentro do ônibus, trem ou metrô. O resultado é o mais alto desde que o levantamento começou a ser feito, em 2018 (25%). Já 82% têm a percepção de aumento nos casos de assédio sexual e violência no último ano.

A fim de melhorar esse panorama, redes de apoio e de denúncia vêm sendo formadas, e pesquisadores afirmam a importância de campanhas do Estado e de empresas envolvidas.

"Um lugar cheio de pessoas circulando, com monitoramento e guardas a cada estação deveria ser sinônimo de segurança, mas o ambiente se torna favorável à violência pois propicia o anonimato do agressor", avalia Kelly Fernandes, analista em mobilidade urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC).

Há, ainda, o medo da exposição por parte das vítimas, diz ela, além do temor de sofrer outras violências psicológicas, como questionamentos machistas. "Podem ouvir um sonoro 'mas a roupa está curta'."

Campanhas, leis, apps: o que tem sido feito

De acordo com levantamento da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano divulgado nesta quinta-feira (5), 43% dos deslocamentos das mulheres são feitos por ônibus, metrô ou trem. Outros 32,5% são realizados a pé.

Em São Paulo, uma lei autoriza motoristas a parar fora dos pontos de ônibus para que mulheres e idosos desembarquem em locais mais seguros e acessíveis entre 22h e 5h. O motorista que desrespeitar a lei pode ser penalizado com multa de R$ 360. Em caso de reincidência, a multa dobra.

Segundo a urbanista e pesquisadora em mobilidade Marina Harkot, a capital paulista é um dos lugares mais avançados em relação à políticas na área. Mas ainda há muito o que melhorar.

Para Kelly Fernandes, a única instituição de transporte que tem uma política de combate ao assédio em São Paulo é o Metrô. "Apesar de campanhas frustradas no passado, em que os funcionários homens apareciam como únicos capazes de auxiliar vítimas, a organização conseguiu estruturar boas ações", avalia. Uma das recomendações é que a mulher faça a denúncia ainda no vagão, por meio do WhatsApp, para que uma pessoa a auxilie na estação seguinte ao acontecimento. Há, ainda, outras possibilidades: Ecoa já fez um guia com o passo a passo de como denunciar casos de assédio no transporte coletivo.

As lacunas do Estado motivaram, em âmbito nacional, o desenvolvimento de iniciativas da sociedade civil. O Mapa do Acolhimento, por exemplo, é um site que conecta mulheres vítimas de violência a profissionais do direito e da psicologia. "A gente vê que elas precisam de um lugar de escuta e ter garantido o acesso à Justiça", diz Larissa Schmillevitch, coordenadora do projeto. Fundada em 2016, a plataforma já atendeu cinco mil solicitações.

Recorrer à tecnologia torna-se cada mais viável. Segundo mesma pesquisa da Rede Nossa São Paulo, três em cada 10 paulistanas dizem que se sentiriam mais à vontade para reportar casos assim por meio de aplicativos de celular — um número 14% maior do que um ano atrás. De palco recorrente de agressões, a internet passou a ser também um espaço de apoio por meio de iniciativas como o Mapa, avaliam especialistas.

Criado em 2015, o Vamos Juntas? é um movimento que estimula mulheres a acompanharem umas às outras no espaço público. A iniciativa mobilizou redes em cada região do país, onde além de combinar caronas, também são trocadas experiências.

Renata Albertim é cofundadora do aplicativo Mete a Colher. A plataforma também oferece orientação jurídica e psicológica a mulheres vítimas de assédio. Renata percebe que o aspecto facilitador da denúncia online é que ela reduz o temor das vítimas. "Porque há o medo de ir ao centro de referência, à delegacia, de falar com alguém sobre o assunto", diz. Pelo app, 15 mil mulheres já relataram casos e trocaram informação ao longo de três anos.

*Colaborou Nathália Duarte