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Costureiro usa sobras de tecido de Carnaval para produzir máscaras caseiras

Aroldo Tavares mostra as máscaras que costurou com sobras de tecido de fantasias de Carnaval - Renato Cipriano/Divulgação
Aroldo Tavares mostra as máscaras que costurou com sobras de tecido de fantasias de Carnaval Imagem: Renato Cipriano/Divulgação

Diana Carvalho

De Ecoa, em São Paulo

15/04/2020 04h00

Em um barracão fechado na zona norte de São Paulo, fantasias de um Carnaval passado estão cuidadosamente empilhadas, separadas por cores e alegorias. O lugar, que meses antes era marcado pela batucada de uma bateria, agora tem o "silêncio da quarentena" quebrado por outro ritmo: o motor de uma só máquina de costura.

É pelas mãos de Aroldo Tavares, 58, que trabalha há 10 para a Acadêmicos do Tucuruvi, que sobras de tecidos e TNT estão se transformando em máscaras de proteção, que serão doadas para integrantes da escola e para pessoas da comunidade.

No começo de abril, o Ministério da Saúde ampliou o uso de máscaras para diminuir a propagação de novos casos de Covid-19. A recomendação é para que a população em geral faça uso de máscaras alternativas, como as produzidas em casa, deixando as cirúrgicas e N95 para profissionais de saúde, que já enfrentam a falta de EPIs (Equipamento de Proteção Individual) em hospitais.

"Como você descobriu que estou fazendo essas máscaras?", perguntou ele à reportagem de Ecoa. "Não está vindo quase ninguém aqui. Tudo está fechado. Essa coisa de não poder sair já está enchendo o saco, né? Mas é preciso... Pelo menos fazendo essas máscaras eu me distraio. É bom se sentir útil nesse momento", diz o costureiro, que mora sozinho nos fundos do barracão da escola.

De São Gonçalo, Aroldo veio para a capital paulista a convite de um amigo para trabalhar como aderecista, em 2009. A identificação com a Acadêmicos do Tucuruvi aconteceu naturalmente, quando teve oportunidade de aprender técnicas de corte e costura. Hoje, ele coordena uma equipe de costureiros e é responsável por toda confecção de fantasia da escola. "Saí do Rio por falta de oportunidade. Você vai ficando mais velho, e as portas vão se fechando. Em São Paulo, foi diferente. Comecei colando um babado aqui, outro ali. E aqui estou até hoje", conta.

A ideia de produzir máscaras de proteção surgiu durante uma reunião na quadra da escola. Aroldo abraçou a causa e decidiu oferecer tempo e talento de maneira voluntária. Por dia, ele chega a produzir de 40 a 60 máscaras. "Vi um vídeo na internet e aprendi. A primeira é mais trabalhosa, mas depois que você pega o jeito é fácil".

O costureiro vê o trabalho voluntário como uma maneira de retribuir o que a escola e a comunidade fizeram por ele. "Uma vez ouvi que família é aquela que a gente constrói. E a minha é a escola de samba. Perdi minha mãe aos dois anos de idade. Eu e minha irmã, que hoje mora em Fortaleza, fomos criados pelos 'outros'. Não tínhamos essa coisa de afeto, de carinho, de família. O samba que me trouxe isso, essa sensação de se sentir acolhido e de sentir que faço parte de uma comunidade."

Aroldo Tavares organiza fantasias dentro do barracão da Acadêmicos do Tucuruvi, onde mora - Renato Cipriano/Divulgação - Renato Cipriano/Divulgação
O costureiro Aroldo Tavares organiza fantasias dentro do barracão da Acadêmicos do Tucuruvi, onde mora
Imagem: Renato Cipriano/Divulgação

Para a diretoria da Acadêmicos do Tucuruvi, Daniella Marques, a generosidade de Aroldo ao produzir as máscaras só mostra que o trabalho de uma escola de samba vai muito além de desfiles de Carnaval: é de dentro para fora.

"Muita gente acha que escolas de samba só funcionam perto do Carnaval. Pelo contrário. Ao mesmo tempo que emprega milhares de pessoas, gerando renda para músicos, costureiras, marceneiros, pintores, faxineiros, as agremiações também se preocupam com a comunidade, com quem vive ao redor", afirma.

Para ela, a onda de solidariedade que se formou pelo país devido a pandemia do coronavírus fortaleceu o trabalho que é feito antes e depois da folia, desde doação de roupas e alimentos, a eventos culturais com ensaios e oficinas de música.

"O samba sempre teve essa função. De ser um lugar que acolhe, ajuda. Que se preocupa com o outro, por isso a maioria das escolas de samba estão inseridas em comunidades. Então, é natural que essa troca e união aconteça", diz.

Bota mais água no feijão

Mancha Verde e Gaviões da Fiel uniram forças para cozinhar e entregar marmitas para pessoas em situação de rua no centro de São Paulo - Divulgação - Divulgação
Integrantes da Mancha Verde colocaram a mão na massa e preparam marmitas para pessoas em situação de rua no centro de SP
Imagem: Divulgação

Em "Batucada dos Nossos Tantãs", Fundo de Quintal já dizia: você não samba, mas tem que aplaudir. O esforço das escolas em amenizar os efeitos da quarentena e do isolamento social gerou uma força-tarefa entre seus integrantes, que passaram a entregar alimentos e itens de higiene para comunidades de baixa renda.

Rivais dentro das quadras, a Mancha Verde e a Gaviões da Fiel distribuíram no último sábado marmitas para moradores em situação de rua que vivem no centro de São Paulo. As duas escolas convocaram suas "alegorias", que passaram a tarde cozinhando e preparando as refeições. Somando, as duas escolas ofereceram alimentação para mais de 500 moradores.

Produção em massa

No Rio de Janeiro, agremiações do grupo especial também estão se organizando na luta contra a Covid-19. A Unidos do Viradouro lançou a campanha: "A fantasia agora é outra". A atual campeã carioca encomendou a produção de cinco mil máscaras, que tiveram as primeiras unidades distribuídas para a velha guarda, baianas e compositores da escola.

Em Duque de Caxias, a vice-campeã Grande Rio também segue na produção. A escola ocupou a quadra com máquinas de costura e também está realizando a doação de alimentos para moradores de Mangueirinha, Centenário, Corte Oito e Sapo.

 O ateliê da Unidos de Padre Miguel segue na produção de máscaras e capotes cirúrgicos que serão doados para os hospitais - Reprodução/Unidos de Padre Miguel - Reprodução/Unidos de Padre Miguel
No ateliê da Unidos de Padre Miguel a produção agora é de máscaras e capotes cirúrgicos
Imagem: Reprodução/Unidos de Padre Miguel

Em uma parceria com a prefeitura, Unidos de Padre Miguel e Vila Isabel estão produzindo aventais e máscaras para profissionais de saúde da rede municipal. A primeira leva da produção será destinada ao Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, na zona norte do Rio.

Para ajudar

Algumas escolas de samba do grupo especial de São Paulo e do Rio de Janeiro estão abrindo suas quadras para arrecadação de alimentos e itens de higiene que serão doados nas comunidades. Veja abaixo os endereços e horários para fazer sua doação:

São Paulo

Acadêmicos do Tucuruvi
Informações para a entrega de alimentos e itens de higiene: 11 94709-6082

Gaviões da fiel
Rua Cristina Tomás, 183 - Bom Retiro. Horário: das 10h às 15h

Mocidade Alegre
Rua Samarita, 1020 - Limão. Horário: das 10 às 20h

Unidos de Vila Maria
Rua Cabo João Monteiro da Rocha, 448 - Jd Japão. Horário: Segunda à sexta-feira das 12h às 17h

Vai-Vai
Rua São Vicente, 276 - Bela Vista. Horário: das 11h às 18h - Para a retirada de doações em grande quantidade, entre em contato pelo número: 11 96488-0442

Rio de Janeiro

Beija-Flor de Nilópolis
Rua pracinha Wallace Paes Leme, 1025 - Centro de Nilópolis. Horário de segunda à sexta-feira das 9h às 18h

Grande Rio
Rua Alm. Barroso, 5 - Centro, Duque de Caxias. Horário: de segunda à sexta-feira, das 10 às 17h

Mocidade Independente de Padre Miguel
Rua Coronel Tamarindo, 38 - Padre Miguel. Horário: de segunda, quarta e sexta das 14h às 18h.

Paraíso do Tuiuti
Campo de São Cristovão, 33 - Horário: de segunda à sexta-feira, a partir das 9h

Salgueiro
Rua Silva Teles, 104 - Horário: das 13h às 17h