Elizabeth Gilbert: “Confiem nos instintos, somos adaptáveis e resilientes”
"A pessoa mais difícil do mundo para ficar sozinha com você é... você mesmo", acredita a escritora Elizabeth Gilbert, conhecida pelo sucesso de "Comer Rezar Amar" (2006) e hoje uma guru da autoajuda após lançar "Big Magic" (2015), livro que reúne dicas sobre como levar uma vida criativa.
Gilbert estava em sua casa de campo em New Jersey (EUA), há 17 dias sem ver ninguém de perto, quando participou de uma conferência online do TED, na semana passada. Mas ela está acostumada a ficar longos períodos sozinha, como nos retiros de meditação que faz na Índia.
"Sempre ouvi das pessoas, 'ah, como eu gostaria de fazer um retiro!' Bem, chegou a sua hora!", disse, meio brincando, meio séria. "Não tenha pressa de fugir de uma experiência que pode realmente transformar a sua vida. Às vezes, as experiências que podem nos transformar mais intimamente são aquelas das quais queremos mais fugir."
Para lidar com a tremenda carga de ansiedade dos tempos atuais, a escritora americana sugeriu pensar em dois conceitos do ser humano. O primeiro é que somos a espécie mais ansiosa da face da Terra porque temos a capacidade ("ou maldição", diz) de imaginar o futuro graças à nossa rica imaginação para ver os cenários mais aterrorizantes possíveis.
"E o paradoxo é que também somos a espécie mais capaz e resistente que já viveu na Terra", disse. "Quando a humanidade passa por alguma mudança, seja no nível global, como agora, ou no nível pessoal, nós somos realmente bons nisso, de se adaptar. Resiliência é nossa herança genética e psicológica compartilhada, não importa o quão ansioso você seja."
"Podemos nos lembrar disso para atenuar nossos medos", falou. "Só um psicopata ou um ser totalmente iluminado para não estar ansioso num momento como esse."
Gilbert também defendeu seguir nossas intuições para navegar períodos sombrios. Ela contou a história de Amanda Eller, que em 2019 ficou perdida numa floresta do Havaí enfrentando dificuldades diversas, incluindo uma perna quebrada, até ser encontrada 17 dias depois.
Ao conhecê-la pessoalmente, Eller contou que, no segundo dia na floresta, quando percebeu que corria risco de vida e foi tomada pelo pânico, ela parou para respirar fundo, fechou os olhos e pediu para se livrar do medo e não deixá-lo voltar.
"E o medo foi substituído pela intuição, e ela começou a ser guiada por um senso intuitivo profundo, para onde ir, o que comer, o que fazer", disse. "Acredito que a intuição é um pouco o oposto do medo, porque o medo é o terror que você sente quando pensa num futuro imaginário assustador. E a intuição só pode acontecer quando você está no momento."
Para quem medita, Gilbert disse que o resultado de tanta prática é exatamente essa: saber entrar em sintonia com sua intuição para os momentos de dificuldade.
Como ser criativo
Gilbert contou que costuma meditar assim que acorda todos os dias. Depois, separa 40 minutos de leitura do jornal "The New York Times". "E é isto. Se eu ficar lendo mais, entro num estado de trauma. Não fico disponível para seguir minha intuição", disse.
Estamos numa maratona e não num sprint. Isso aqui é só o primeiro quilômetro. Temos que nos resguardar.
Sobre a criatividade em momentos de tensão ou isolamento, a autora sugeriu ir devagar com a pressão pessoal e não se deixar levar por distrações como consumo excessivo de notícias e alta frequência nos encontros e festinhas virtuais. "Você está trazendo o desastre para dentro de casa, para sua alma. É o oposto de ambiente criativo", disse.
Ela comentou que passa seus dias de quarentena desenhando e até mostrou uma pintura que fez de duas corujas numa árvore.
"Estou entre livros agora. Não tenho nenhuma ideia para meu próximo", disse. "No passado, isso me deixaria muito angustiada, mas hoje eu tiro sonecas, vou dar caminhadas e faço esses projetos artísticos esquisitos."
Como lidar com o luto
Durante a entrevista com o organizador do TED, Chris Anderson, Gilbert falou também sobre luto e sobre a morte de sua parceira, a escritora Rayya Elias, de câncer de pâncreas e fígado, em janeiro de 2018.
Em 2016, ela escreveu em suas redes sociais sobre sua separação do brasileiro José Nunes, que havia conhecido em Bali e escrito sobre no best-seller "Comer Rezar Amar". E anunciou seu relacionamento com Elias, sua melhor amiga, recém-diagnosticada com câncer terminal.
"Muitos de vocês sabem que perdi o amor da minha vida dois anos atrás. Estava com ela quando ela morreu e tenho caminhado pelo meu próprio luto. Sei o que é perder a pessoa mais importante do mundo para você. O que é, claro, o maior medo de todos nós."
Seu conselho para o luto é não tentar gerenciá-lo. "O luto é maior do que nós", disse. "Se você quer se ajudar e ajudar seus familiares com compaixão, você precisa permitir que esse sofrimento não seja contido."
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