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Plataforma movimenta R$ 90 mi por ano com produtos que iriam para o lixo

Imagem ilustrativa da bolacha (ou biscoito) da marca "Oreo", um dos produtos vendidos via o XPrajá - Deb Lindsey For The Washington Post via Getty Image
Imagem ilustrativa da bolacha (ou biscoito) da marca "Oreo", um dos produtos vendidos via o XPrajá Imagem: Deb Lindsey For The Washington Post via Getty Image

Claudia Varella

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

08/07/2020 04h00

Você já ficou curioso para saber o que as indústrias fazem com os produtos encalhados, com defeitos ou que estão com suas datas de validade bem próximas do vencimento? Foi pensando nisso que uma empresa de São Paulo viu uma forma de recolocar esses produtos no mercado e com preços bem mais em conta —os descontos chegam a 80%.

Criada em 2017, a greentech XPrajá desenvolveu uma plataforma que coloca indústrias que possuam produtos para vender e varejistas em contato com distribuidores que querem comprá-los, recolocando no mercado itens que iriam para o lixo.

A empresa já evitou o descarte de milhares de toneladas de produtos e movimentou, só no ano passado, R$ 90 milhões com o negócio.

Vinícius Alves Abrahão, fundador e CEO da XPrajá - Divulgação - Divulgação
Vinícius Alves Abrahão, fundador e CEO da XPrajá
Imagem: Divulgação

"Esses produtos entram na plataforma já com os preços mais baixos e as condições para o varejo comprar. Às vezes, a indústria coloca um produto com uma ótima condição na plataforma. Contudo, para o varejo obtê-lo precisa comprar uma quantidade mínima ou então levar outro tipo de produto junto com o pedido, como se fosse um combo. Os descontos na plataforma podem chegar a até 80% dependendo da urgência, por exemplo, da indústria em precisar recolocar", explicou Vinícius Alves Abrahão, fundador e CEO da XPrajá.

Segundo ele, todos os itens estão em perfeitas condições de uso e consumo.

Geralmente, os produtos comercializados são:

  • Com data crítica (perto do vencimento): produtos com no mínimo 30 dias e no máximo de seis meses para vencer. Nessa categoria estão chocolate, biscoito, bolo, panetone, xampu, condicionador e absorvente, entre outros. Abrahão diz que a XPrajá não atua com produtos vencidos.
  • Descontinuados: produtos que não serão mais fabricados (como detergente, xampu, condicionador e absorvente), os que tiveram troca de gramatura (bolacha que passou de 200g para 150g, por exemplo) e até os parados no estoque (foram lançados pela indústria, mas o mercado não aceitou).
  • Remanufaturados: produtos com pequenos defeitos, como os que estão com peso diferente do mostrado na embalagem (bolo, panetone e congelados). Segundo Abrahão, cerca de 8% a 10% dos produtos são identificados dessa forma e eram descartados pela indústria. "Agora, com a XPrajá, a indústria coloca o produto em outra embalagem para vender, em vez de jogar fora. Isso acontece bastante com alimentos congelados", disse.

Outro exemplo de produtos remanufaturados vendidos por meio da XPrajá são os que tiveram a caixa danificada no transporte. "Por exemplo, se a caixa com embalagens de xampu é rasgada no transporte, normalmente a indústria não comercializaria mais, e todos os vidros iriam para o lixo. Com a recolocação, a indústria embala esses produtos em outras caixas, as chamadas caixas brancas, e passam para a XPrajá recolocar no mercado", contou Abrahão.

Esses produtos são oferecidos ao consumidor final em supermercados e varejistas cadastrados, principalmente fora dos grandes centros urbanos.

"São aqueles produtos que vemos com uma superpromoção. Podem estar em embalagens diferentes das usuais também, mas o conteúdo é o mesmo. Geralmente aqueles perto do vencimento são colocados em gôndolas separadas justamente para chamar a atenção do consumidor e com a informação de que está próximo do vencimento", declarou Abrahão.

Abrahão diz que a XPrajá já recolocou mais de 47 mil toneladas de produtos de 2017 até hoje. Só neste ano foram mais de 16 mil toneladas de produtos recolocadas no mercado.

Na plataforma, indústria e varejo dão "match"

A plataforma funciona assim: após fazer o cadastro, a indústria pode oferecer os produtos que quer comercializar, com opções de filtrar para quais regiões, quantidade, desconto oferecido e para que tipo de varejo (supermercados, lojas de conveniência, mercadinhos de bairro etc.) quer vender. Na outra ponta, o varejista cadastrado (normalmente de grande e médio porte) analisa as ofertas e dá "match". A partir daí, todo o processo de compra e entrega é feito diretamente entre indústria e varejo, mas o acompanhamento, a intermediação e o agendamento da entrega são de responsabilidade da greentech.

Por exemplo: a indústria informa que tem dez toneladas de chocolate que precisa ser retirado em São Paulo e quer vender em Minas Gerais. A XPrajá coloca as condições na plataforma, permitindo que apenas os varejistas daquela localidade vejam. Eles avaliam e depois negociam com a própria indústria.

Segundo Abrahão, a empresa recebe uma porcentagem sobre o valor da nota paga pelo varejo à indústria. "Essa porcentagem varia de acordo com o benefício do cliente. Se o desconto está muito agressivo, nosso ganho aumenta", afirmou ele. A média percentual de ganho da XPrajá é de 3%.

Distribuidor e varejista repassam os descontos

Dono de três distribuidoras, Luís Cardin compra pela plataforma produtos com descontos que chegam a 80%.

"Nós repassamos o desconto que a indústria nos concede ao varejista, onde o produto chega ao consumidor final com até 50% de desconto do valor original", afirmou.

Em geral, Cardin compra chocolates, balas, produtos de higiene pessoal e perfumaria por meio da XPrajá. Ele é cliente da empresa desde 2017.

Alberto Miranda Pedroso, dono do supermercado Vertentes, em Perdões (MG), virou cliente da XPrajá há três meses e já comprou via plataforma iogurtes e salaminhos, ambos com os prazos de validade próximos ao vencimento.

"Anuncio que os produtos estão em promoção, por causa da validade próxima. E tenho vendido tudo muito rápido. O desconto para o consumidor final é de 50%", afirmou Pedroso.

O salaminho, por exemplo, tem sido vendido no Vertentes por R$ 19,99 (500 gramas). Esse produto no mercado é em média a R$ 45 (500 gramas). "E eu comprei por R$ 11,62", disse.

Preço final é definido pelo varejista

Comprar mais barato por meio da XPrajá não leva, necessariamente, o varejista a repassar o desconto total no preço do produto.

O preço final do produto é definido pelo estabelecimento que o compra, e isso varia de acordo com a negociação feita com a indústria.

"Na prática, não existe uma garantia com relação ao valor do produto, mas os varejistas costumam colocar no máximo o valor praticado no mercado, não costumam colocar além e, conforme vai aproximando da data de vencimento, eles vão abaixando. Mas cada um segue sua própria estratégia, varia de acordo com as condições que cada um comprou o produto", disse Abrahão.

Entre as indústrias que utilizam a plataforma da XPrajá, está a Mondelez Brasil, cliente desde outubro de 2019. A Mondelez Brasil comercializa pela plataforma toda a linha de chocolates Lacta, produtos das marcas Oreo, Club Social, Tang, Trident e Halls, entre outros. Os produtos são vendidos com um desconto mínimo de 20%. O desconto máximo não é revelado pela empresa.

"O foco dessa iniciativa é muito mais a questão sustentável do que a comercial. Desta forma contribuímos para uma cadeia mais sustentável, à medida que também damos um destino mais favorável aos nossos produtos, em uma relação em que todos os envolvidos saem ganhando", declarou Fernanda Sales, gerente de projetos da Mondelez Brasil.

Segundo ela, se não houvesse alternativas sustentáveis para esses produtos, eles seriam destruídos.

Toneladas de salsicha foram o "start" da empresa

A ideia de desenvolver a plataforma do XPrajá surgiu após o relato de um amigo, dono de um aterro em São Paulo, sobre algumas toneladas de salsichas que seriam enviadas para o descarte por conta da proximidade do seu vencimento.

"Tive um sentimento de inquietação ao descobrir que todo esse montante de alimentos seria desperdiçado, ainda mais sabendo que no final de semana teria uma grande festa no Nordeste. Foi aí que tive o estalo inicial, já que também conhecia o fornecedor dos produtos alimentícios da comemoração. Conectei a empresa que ia descartar as salsichas e o responsável por fornecer os alimentos para a festa. Ali começou a XPrajá", contou Abrahão.

O investimento inicial foi de R$ 1 milhão em tecnologia. No ano passado, a empresa faturou R$ 1,8 milhão. A previsão é que este ano o faturamento chegue a R$ 5 milhões. O lucro não foi divulgado.

Em 2019, a plataforma movimentou R$ 90 milhões em negócios. A expectativa para este ano é que o volume de negócios atinja mais de R$ 150 milhões.

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