"Rio tem potencial para ser protagonista mundial em energia solar"
Busca por propósito. Essa frase ilustra bem a trajetória de Eduardo Avila, 25 anos, recém-formado em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O finalista do prêmio Jovens Campeões da Terra, das Nações Unidas (ONU), representa o que há de mais inspirador na inquietação dos millennials. O carioca é diretor-executivo do RevoluSolar, projeto que promove a autonomia energética em lares das comunidades Morro da Babilônia e Chapéu Mangueira, no Leme, zona sul do Rio.
"Eu aprendi com a minha família a importância da questão social, da sustentabilidade e de sentir que a gente está fazendo alguma coisa de impacto positivo para o mundo. Nós precisamos de inovações que estejam conectadas com melhorias para a sociedade. Ao estudar esse assunto, a gente vê que é possível fazer diferente. Precisamos usar os avanços na tecnologia para a construção de um mundo desejável", considera.
Economista conectado a uma visão multidimensional da vida, Eduardo relembra a origem da palavra que batiza sua formação: o elemento "eco" vem do grego oîkos e significa "casa, lar, domicílio, meio ambiente" e "nomos", também de origem grega, significa "gerir, administrar". "Estamos falando da gestão dos recursos, dos cuidados com a nossa casa que, no caso da humanidade, é o planeta Terra. Então, é sobre a forma como a gente produz, distribui e aloca os recursos para gerar qualidade de vida. Nos últimos anos, destacou-se a atuação mais financeirizada do economista, mas acredito que isso seja reflexo das diversas crises", pondera.
A Organização Não Governamental (ONG) RevoluSolar entrou na vida do jovem especialmente por conta desses questionamentos. É claro que um projeto desta dimensão não é levantado por uma só alma bem-intencionada. Eduardo caminha ao lado de uma equipe diversa, além de uma série de apoiadores e entusiastas da iniciativa. Aliás, a RevoluSolar já existe, na verdade, desde antes da chegada do, à época, estudante de economia, em 2018. A organização foi criada em 2015 com a missão de realizar pesquisas, produção e gerenciamento de energias renováveis nas comunidades Babilônia e Chapéu Mangueira.
Cooperativa solar: modelo energético comunitário
Eduardo relata que, assim que bateu os olhos na premissa da RevoluSolar, concluiu: "É isso que o mundo inteiro está apontando como caminho para o futuro". O economista conta que estava estudando o assunto e suas repercussões no mundo inteiro quando conheceu o modelo de energia solar comunitária, ou seja, a distribuição baseada na autonomia da comunidade.
"No Rio, a tarifa de energia elétrica mais que dobrou na última década, teve um aumento de 105%. E os custos de energia solar ficaram 85% mais baratos. Então você tem uma energia centralizada cada vez mais cara e a solar cada vez mais barata. Eu vi na ideia proposta pela ONG uma força com potencial ainda inexplorado", relembra.
Segundo Eduardo, os altos custos das tarifas têm um peso muito maior no orçamento das pessoas mais pobres, em comparação aos integrantes das classes média e alta. "É recorrente o mito de que os moradores da favela ou fazem gato (ligação elétrica clandestina para furtar energia) ou pagam o valor da tarifa social. Em 2018, fizemos uma pesquisa para entender o contexto de energia elétrica nas comunidades e descobrimos que a maioria dessa população paga e paga caro pelo consumo. E, mesmo assim, as quedas de luz são muito mais frequentes e duram muito mais tempo do que em outras regiões da cidade. Há muita insatisfação e sensação de impotência", aponta.
Orgulhoso, Eduardo reforça que, assim que a pandemia do novo coronavírus for vencida, a RevoluSolar vai constituir a primeira cooperativa de energia solar em uma favela do Brasil. O modelo de financiamento inclui patrocinadores institucionais e um componente de aluguel: os beneficiários de energia solar pagam uma taxa mensal (parte da economia com a conta de luz).
"Eu acredito que através da educação e da capacitação que a RevoluSolar oferece aos jovens é possível termos uma Babilônia e Chapéu Mangueira 100% solar, o que é um sonho. Após a minha capacitação como instalador solar, minha vida mudou para melhor e sempre tenho feito alguns trabalhos de manutenção particular", contou Adalberto Almeida, morador da Babilônia há 16 anos.
Energia solar é coisa de rico?
Com todas as vantagens que potencializam a transformação social apresentadas até aqui, por que ainda é possível dizer que, no Brasil, energia solar é vista como "coisa de rico" por tanta gente? Para Eduardo, a resposta para esse questionamento está na organização do mercado e no modelo de financiamento. Ele acredita que o ponto de virada para esta situação terá início ainda este ano.
"A geração de energia solar fotovoltaica distribuída em comunidades é, entre as energias renováveis, a que mais gera empregos. E são empregos locais e de qualidade, que pagam mais do que a média na economia. Mas, atualmente no Brasil, o modelo corrente é o de compra à vista. As pessoas precisam investir entre R$ 10 mil e R$ 20 mil para recuperar esse investimento futuramente. As placas solares duram entre 30 e 40 anos e você recupera o dinheiro ao deixar de pagar a distribuidora mensalmente, mas esse ainda é um modelo complicado", diz.
O jovem especialista crê que a solução é adaptar o modelo de pagamentos mensais vivenciado pelo estado da Califórnia, nos Estados Unidos, que estudou quando escrevia seu trabalho de conclusão de curso. Neste formato, a empresa instala as placas sem os pesados custos imediatos, mantém a propriedade destas e cobra do morador um valor significativamente inferior ao pago para as distribuidoras de energia. O residente tem retorno financeiro imediato e a empresa garante ganho recorrente por até 30 anos.
"Acredito que uma adaptação desse modelo é o caminho para a democratização da energia solar no Brasil. A ideia é reunir um grupo de pessoas para usufruir da energia produzida em um lugar só, no caso, o telhado da associação de moradores da Babilônia. Com essas placas, será gerada energia para 30 famílias. Cada uma dessas famílias vai pagar um valor reduzido pelo consumo e outra parte para um fundo comunitário, que é gerido pelos próprios moradores. Esse recurso será usado para remunerar os trabalhadores locais que fazem instalação e manutenção das placas, além da instalação de mais placas", esclarece.
Singular porque plural
Eduardo nasceu e sempre morou na zona sul do Rio de Janeiro, nos bairros Lagoa e Jardim Botânico. Declara-se apaixonado pela capital carioca, é torcedor do Flamengo e cita de Milton Santos (geógrafo brasileiro conhecido internacionalmente por expandir as fronteiras da sua formação em direção à análise sociológica) ao lema do seu local de formação, o Instituto de Economia da UFRJ: singular porque plural (que, por sua vez, remete a um texto do jornalista Zuenir Ventura).
"Eu acredito muito no potencial do Rio de Janeiro. A região metropolitana do Rio é a mais vantajosa do Brasil para fazer a instalação de energia solar, por exemplo. Pelos altos custos da distribuição tradicional de energia elétrica e pelos altos níveis de insolação. O Rio poderia estar em outro patamar, tem potencial para assumir o protagonismo no mundo nessa discussão de mudanças climáticas e da agenda de desenvolvimento sustentável."
A visão da cidade [do Rio] como protagonista global tem sido negligenciada nos últimos anos. Podemos ser destaque em energia solar e sustentabilidade, temos todos os recursos naturais, humanos e intelectuais para isso. As oportunidades vêm do território
Eduardo Ávila, economista
Vale concluir esse texto expandindo a citação do lema ostentado pela faculdade que formou Eduardo Avila. Como dito anteriormente, a frase remete a um texto de Zuenir Ventura, célebre jornalista mineiro que também estudou na UFRJ e virou questão de vestibular: "Toda noite dá vontade de dizer: 'esse é o verdadeiro Brasil'. Mas talvez seja mesmo ocioso procurar o país numa só pessoa e num só lugar. Ele é esse e aquele, não esse ou aquele. O que tem de melhor é a variedade. Ele é especial por ser diverso, é singular porque plural."
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