Voluntário em Manaus perdeu avô para Covid-19: "exausto"; saiba como ajudar
Do dia para a noite, um grupo de voluntários sem experiência médica se viu arrastado para as portas de hospitais em Manaus (AM). Por meio da internet, eles se organizaram e receberam quase R$ 8 milhões em doações para a compra de cilindros com oxigênio, itens hospitalares, EPIs e alimentação.
"A gente não tinha dimensão do que iria acontecer", explica Gustavo Melo, do SOS AM.
A SOS AM une organizações que não tinham relação com a ajuda médica, mas que há anos doavam alimentos, promoviam alfabetização e acesso a outros serviços para as populações vulneráveis em Manaus. Hoje são cerca de 100 colaboradores voluntários, que em muitos casos perderam familiares e amigos para a covid-19 nos últimos meses, como Gustavo.
O grupo SOS AM foi criado em 2020 para doar água e auxiliar no transporte por lanchas de medicamentos e alimentos. Entre eles havia a suspeita de que a pandemia poderia abater novamente o estado do Amazonas, mas ninguém previu que o impacto seria tão intenso.
No início de janeiro, o noticiário em todo país alertou que as UTIs em Manaus estavam sem oxigênio e a capital enfrentaria um colapso rápido e letal do sistema público de saúde.
O governo federal sabia, mas a população e voluntários foram pegos de surpresa. Pacientes sufocavam. Especialistas apontam que a falta de isolamento e uma nova variante do coronavírus agravaram a debacle amazonense.
Por todo país, milhares de pessoas queriam alguma forma de ajudar as famílias e os internados na UTI da capital. Mas como?
Dias antes, o SOS AM havia publicado uma imagem com números de telefone e contas bancárias para receber doações e ajudar os mais vulneráveis a enfrentarem a pandemia. Quando o sistema entrou em colapso, a publicação viralizou nas redes sociais e foi compartilhada por artistas, como Anitta. O telefone não parava de vibrar. Em cerca de dois dias, a campanha tinha alcançado mais de R $300 mil.
Morte de parentes
Gustavo, da SOS AM, perdeu o avô para a covid-19. Segundo ele, não existiam leitos no nas UTIs do estado, sejam privadas ou públicas. Gustavo trabalha como representante de uma montadora em Manaus e, logo no início da pandemia, perdeu um amigo para a doença. Atualmente, um tio também está intubado.
"Eu tento me blindar disso", explica. "Já chorei em live". E acrescenta: "ninguém de fora tem noção do que o Amazonas está passando. Eu abro meu Instagram e tem muita gente que parece que está em um universo paralelo".
"Não consigo imaginar o que um profissional da saúde passa, há um ano na linha de frente. Eu em 15 dias já estou exausto"
A cidade de Manaus foi uma espécie de laboratório político e científico no país. Foi uma das primeiras capitais devastadas pelo novo vírus, onde dezenas de valas eram abertas simultaneamente em cemitérios. Ao longo do ano, a queda de casos indicava uma possível "imunidade de rebanho", conceito que se tornou polêmico entre cientistas.
Com o aumento dos casos, os governos locais recuaram de um lockdown após protestos de comerciantes contra o fechamento de lojas. Dias depois, turistas japoneses que estavam em Manaus tiveram uma nova variante do novo coronavírus identificada.
De acordo com Gustavo, a gestão do estado está "despreparada" e "perdida". "Tentamos organizar uma logística com eles. Eles nos enviaram coordenadas de hospitais que precisavam de ajuda, mas eram hospitais em que tínhamos acabado de ajudar. Então decidimos seguir por conta própria", diz. (Leia o outro lado abaixo)
O grupo comprou cilindros com oxigênio e os transportou vindos de regiões distantes do Brasil, principalmente do sudeste. A logística foi organizada com a ajuda de policiais de folga, voluntários das áreas de armazenamento, como a Pronto Cargo, e com voos oferecidos por empresas como Latam e Azul.
"A gente teve um grande desafio de logística, e agora desenvolvemos um know how para continuar com o trabalho", explica Ítalo Malveira, da SOS AM.
Um grupo de contadores voluntários se propôs a ajudar a organizar e a prestar conta sobre as doações. Os gastos detalhados são publicados na página do SOS AM, onde é possível conferir e pedir as notas fiscais.
A situação ainda é dramática. Desde o fim do oxigênio, mais de 100% dos leitos clínicos — ou seja, fora das UTIs — estão acima da capacidade. No dia 16, chegou a 126% dos leitos, e 107% das UTIs, de acordo com o boletim epidemiológico da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas.
A imagem de familiares em prantos, abraçados com um cilindro de oxigênio, exigiu que a rede de solidariedade se propague para o restante do Amazonas. O SOS AM já levou a expertise do caos em Manaus para organizar e doar itens e equipamentos hospitalares para 17 cidades do interior do Amazonas. Há também quem já os procure em Rondônia, onde o mesmo cenário poderá se repetir devido à lotação das UTIS.
O grupo SOS AM também vai instalar quatro usinas de oxigênio em hospitais da cidade, para servir como uma espécie de legado da campanha.
Até lá, Ítalo indica a melhor ajuda possível: ficar em casa e, se precisar sair, usar máscara. "Sou o único da família a sair de casa, e estou vivendo separado deles. Estão blindados", diz
Outro lado
Em nota, o governo do estado do Amazonas afirma que todas as UTIs de Manaus estão com oxigênio e que, até dia 20 de janeiro, recebeu oficialmente a doação de 2.992 cilindros, no total de 119.980 metros cúbicos para atender a uma demanda média diária de 75 mil metros cúbicos.
Segundo o governo, as "doações são muito bem vindas" e quem queira doar também pode telefonar para (92) 99394-7616 e, caso não tenha condições para o envio, pode receber apoio da Força Aérea Brasileira. Até o dia 20, o governo afirma ter recebido 136 cilindros do SOS AM. O número é menor do que o apresentado pela instituição, que só no dia 19 havia comprado 150 cilindros somente pela Somar, uma das instituições que integram a iniciativa.
Segundo Ítalo, o grupo reserva um número de cilindros para serem usados em casos de emergência. De acordo com ele, a reserva seria uma maneira de evitar a logística estadual de distribuição e também para levá-los a pacientes que precisam de oxigenação, mas não só nas UTIs. As notas fiscais podem ser vistas no site.
Saiba como ajudar
SOS AM
PIX
01285730000815
Moradia e Cidadania
Acesse: Vooa.me/oxigenio-manaus
PAG SEGURO
Agência: 001
Conta: 25936648-2
CNPJ: 37516480001-00
GAV - Grupo de Apoio Voluntário
CAIXA
Agência: 1457
Conta poupança: 57691-3
CNPJ: 01285730000815
Moradia e Cidadania
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