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"Temos de dar carreiras, não empregos", diz chefe de diversidade do Google

Melonie Parker (dir.), Theo Van Der Loo e Susana Ayarza durante painel do Google Leadership Talks - Reprodução
Melonie Parker (dir.), Theo Van Der Loo e Susana Ayarza durante painel do Google Leadership Talks Imagem: Reprodução

Fernanda Schimidt

De Ecoa, em São Paulo

03/02/2021 04h00

A busca por diversidade no mundo corporativo começa com a contratação de profissionais plurais, sejam eles negros, indígenas, LGBTQIA+, mulheres, periféricos ou PCDs. Mas este é só o começo. "A retenção é importante, e dentro disso a progressão. Não estamos apenas dando empregos para as pessoas, mas carreiras. Temos de oferecer oportunidade de desenvolvimento para que elas cresçam", disse Melonie Parker, chefe global de diversidade no Google, em painel transmitido ontem (2) ao vivo.

Com mais de 20 anos de experiência, Parker foi destaque da programação do Google Leadership Talks, evento fechado para CEOs de grandes empresas no Brasil que discute perspectivas de futuro para o mundo corporativo em áreas como diversidade, tecnologia, comportamento, negócios e privacidade. O debate, acompanhado por Ecoa, teve também a presença de Theo Van Der Loo, ex-CEO da Bayer no Brasil e um dos principais fomentadores da diversidade na empresa farmacêutica. A mediação foi de Susana Ayarza, diretora de marketing do Google Brasil.

Van Der Loo concorda com a necessidade de desenvolver os talentos plurais. "Promover pessoas do grupo de diversidade é mais importante do que contratar novas. Você quer ver esses 'role models' (exemplos) subindo. Costumam dizer que essas pessoas não estão prontas. Mas se você vai se arriscar contratando alguém que não conhece, melhor arriscar com alguém que já conhece", afirmou o executivo. "Temos de investir dinheiro em inclusão e diversidade como fazemos com investimento em compliance. Temos de mudar nosso mindset. Não é um gasto, um investimento para o futuro."

E como isso pode ser feito no cenário brasileiro? "Cada empresa precisa assumir um compromisso de encontrar talentos nas comunidades, trazê-los para dentro da empresa e continuar a treiná-los e educá-los. Comumente existe uma falta de acesso ou oportunidade, seja uma barreira de idioma ou de habilidades. A não ser que a gente ofereça [treinamento de] habilidades e competências, não vamos ter um caminho sustentável para que pessoas negras cheguem e tenham uma carreira", explicou a chefe de diversidade.

Parker compartilhou que seu trabalho promove uma intersecção entre paixão e propósito. Filha de ativistas que marcharam ao lado de Martin Luther King e criada em um bairro predominantemente negro na Carolina do Norte, ela contou que compreendeu desde pequena que não poderia agir da mesma maneira dentro sua comunidade e fora dela. "Meus pais me ensinaram que teria de ser melhor, mais esperta e mais rápida para competir no mesmo nível [das pessoas brancas]", afirmou.

Agora, ela cria estratégias para garantir que a jornada profissional de pessoas negras e de outras minorias não precise ser assim. "Não se trata apenas de se encaixar na cultura da empresa, mas de ver o que essas pessoas acrescentam [ao negócio]. Manter e fortalecer a cultura é muito importante. Não apenas ter uma cultura de inclusão, mas de pertencimento. Estamos trabalhando muito nisso", disse. Entre as ações adotadas pelo Google estão pesquisas anuais sobre inclusão e pertencimento que avaliam como cada profissional e área estão num ponto de vista social, de equipe e individual. Os dados são, então, analisados para balizar novas estratégias.

Para Van Der Loo, esse movimento precisa ser comprado pelos executivos da companhia. "É algo que precisa acontecer de cima para baixo. O CEO precisa estar envolvido neste tipo de assunto. É um exercício diário. Tem de inspirar as pessoas para que a mudança aconteça".

"Erros são bons, você vai aprender com eles. Quando as empresas estão genuinamente interessadas em inclusão e diversidade, está tudo bem se cometer um erro. Não pode deixar que aconteça de novo", afirmou ele. Apesar de ter começado a questionar internamente a falta de diversidade ainda em 1988, o executivo disse que gostaria de ter assumido uma postura pública sobre o assunto mais cedo.

"Eu teria começado mais cedo para ter mais CEOs engajados com a questão. Teria ouvido mais pessoas de fora da empresa. Teria lido mais, principalmente sobre escravidão e como as pessoas foram escravizadas para gerar riqueza para o país e para a Europa. Todos os brasileiros deveriam ler sobre isso. Engajar a alta gerência nisso mais cedo também é algo que gostaria de feito, e levá-los para ouvir histórias. Quando você começa a conversar com pessoas diferentes, vê que existe um outro mundo. Eu vivia numa bolha, com pessoas brancas, em que tudo estava bem", disse ele.