Brasileiras criam sistema para prevenir incêndios com chuva artificial
As florestas brasileiras em chamas tornaram-se uma imagem comum no noticiário do ano passado. Só na região do Pantanal, o território devastado pelo fogo foi dez vezes maior em 2020 do que ao longo de 18 anos. Mas e se uma tecnologia pudesse prever esses desastres? E se, além disso, ainda os impedisse de tomar proporções tão trágicas?
Pode soar impossível, mas essa foi a premissa para quatro brasileiras desenvolverem um projeto finalista do NASA Space Apps Challenge, duelo internacional de programação da agência norte-americana. Durante um fim de semana, no fim do ano passado, elas se debruçaram sobre o problema, que tem comprometido a vegetação nativa no mundo todo, e desenvolveram o The Walking Cloud, que se propõe a prevenir incêndios por meio de chuvas artificiais.
Como funciona?
Com base em dados de umidade e temperatura fornecidos pela NASA, o projeto mapeia regiões e cenários favoráveis ao surgimento do fogo, partindo de um recorte local e histórico. Um alerta é acionado cada vez que são notados parâmetros críticos - aqueles que podem resultar em eventos similares aos historicamente registrados.
Diante desse sinal, um drone da NASA movido a energia solar é programado via satélite com as coordenadas do foco identificado. Durante a noite e no início da manhã, período em que a umidade do ar atinge seus maiores índices, o veículo percorre a região carregando uma malha de bioplástico que capta o vapor da água presente no ar e o transforma em gotículas de orvalho.
Essas gotas vão se precipitar sobre o solo em períodos mais secos do dia. Assim, a chuva artificial dificulta a combustão da matéria orgânica seca, que, em contato com qualquer fonte de ignição, pode iniciar incêndios.
Prevenção é o foco
A ideia foi desenvolvida pelas engenheiras de petróleo Larissa Nery, 25, e Isabella Moresco, 24, pela designer Gabriela Raquel Pereira, 23, e pela arquiteta e urbanista Natália Cunha, 24. Para a representante da NASA, Leka Hattori, entre os pontos da proposta que mais chamaram a atenção do júri foi o caráter preventivo da iniciativa. Isso é especialmente importante em se tratando de queimadas: depois que o fogo se alastra, é mais difícil lidar com a questão.
Além disso, o projeto une tecnologias relativamente acessíveis e já comuns em outros cenários, a exemplo dos drones, dos sistemas de monitoramento e da própria malha de bioplástico, muito usada para levar água potável a locais secos ou poluídos. "O grupo pensou numa solução sem criar nada mirabolante", argumenta.
Segundo a diretora de resiliência da Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência da cidade de Salvador, Adriana Campelo, que é jurada da competição pela segunda vez, o que também levou as meninas à final foi o fato de se tratar de um projeto replicável em larga escala em qualquer lugar do planeta e sem um custo alto. Isso pode não apenas atrair investidores, como também impulsionar a criação de medidas similares. "Além disso, é uma proposta extremamente conectada com os gaps que temos hoje no Brasil e no mundo", explica.
O também jurado Miguel Diniz Barreto vislumbra na proposta possíveis parcerias comerciais com o poder público e privado, sobretudo na indústria agrotech. Para o gerente geral de marketing e vendas na Aviva, empresa que apoia o evento, o grupo literalmente pensou em como "fazer chover" em prol de uma ação preventiva para um problema bem atual, o que é especialmente promissor.
Mulheres em destaque
Em sua quarta edição, o NASA Space Apps Challenge teve mais mulheres inscritas do que homens. Um panorama incomum no mercado de tecnologia. Na visão de Leka, isso aconteceu devido a um fomento massivo de lideranças femininas pela organização. Além de intensificar a comunicação dirigida a garotas nas mídias sociais, tem-se buscado também aumentar o número de mentoras que possam inspirar jovens.
As criadoras do The Walking Cloud se conheceram por meio de amigas em comum. Larissa é de Salvador e as outras três são de Pato Branco, no interior do Paraná. Para se inscrever na competição o grupo precisava ter um nome. A ideia veio de um jogo que todas conhecem: o HER, também uma sigla para High Efficiency Resolution, ou resoluções de alta eficiência.
O time precisou montar um vídeo de três minutos apresentando a ideia. A proposta ficou em primeiro lugar na Bahia, o que levou as quatro mulheres à fase internacional.
Um detalhe bacana é que o segundo lugar também é de um grupo feminino, o Hypatia, que se propôs a desenvolver batatas transgênicas de fácil cultivo, contendo o gene da vitamina B-12. Para Adriana, o avanço não pode parar. "Muitas vezes ficamos nos bastidores, nossos méritos nem sempre aparecem. É uma grande alegria ver mulheres ocupando seu espaço e liderando transformações pelo planeta", argumenta.
Na expectativa de que o The Walking Cloud seja colocado em prática, as meninas aguardam pela última fase da competição e esperam poder inspirar também pelo exemplo. "Queremos que outras mulheres tenham coragem de apostar nas próprias ideias e acreditem no que são capazes. Por que assim é que mudaremos o mundo", conclui Larissa.
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