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O que significa machismo? Entenda o conceito e evite replicá-lo

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Imagem: iStock

Giacomo Vicenzo

Colaboração para Ecoa, em São Paulo (SP)

06/04/2021 06h00Atualizada em 21/07/2021 19h31

No Brasil em 2020, houve 12 denúncias de violência contra a mulher a cada hora e, pior, uma mulher foi morta a cada dois dias por feminicídio.

Sobre o trabalho, os cenários também são desiguais, as mulheres ocupam a minoria dos cargos de liderança na área da ciência e recentemente uma pesquisa da consultoria Robert Half revelou que mais de 60% das empresas não possuem políticas para aumentar a presença de mulheres em cargos de chefia.

Mas o que esses números têm a ver com machismo? Ecoa conversou com especialistas para esclarecer o que significa machismo, formas de identificar esse comportamento e como ele afeta mulheres e homens de forma negativa.

O que significa machismo?

Para começar, vamos apelar ao dicionário. Do Michaelis:

Machismo é:
1. Qualidade, comportamento ou modos de macho (homem); macheza, machidão. 2. Orgulho masculino em excesso; virilidade agressiva.
3. Ideologia da supremacia do macho que nega a igualdade de direitos para homens e mulheres.

Além das definições linguísticas da palavra, Bruna Cristina Jaquetto Pereira, especialista em gênero e raça e doutora em sociologia pela UnB (Universidade de Brasília) explica que o machismo é a ideia de que existem diferenças entre homens e mulheres, que fazem deles grupos de pessoas totalmente distintas, sendo os homens superiores.

"Dentro dessa ideia, homens seriam racionais, inteligentes, fortes, objetivos, sempre prontos ao ato sexual e as mulheres, fracas ou delicadas, emotivas, incapazes de racionalidade, subjetivas e não interessadas em sexo", aponta a socióloga.

A ideia machista também cria distinções nas funções sociais entre homens e mulheres. "O machismo considera que, por suas diferenças, homens e mulheres desempenham papéis diferentes na sociedade. Às mulheres cabem os cuidados com a casa e às pessoas dependentes; aos homens, a gestão da vida pública, como a política, ciência e o trabalho remunerado", lembra a especialista.

Machismo é estrutural?

Machismo - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

"Podemos analisar o machismo em níveis interpessoais ou estruturais. Pessoas podem ser machistas com outras pessoas. No nível estrutural olhamos para o resultado como um todo de crenças e de ações machistas", explica Pereira. Isso quer dizer que não apenas fulano ou sicrano são machistas, mas a sociedade e a forma como atuam e se organizam suas instituições, crenças e valores.

Os dados sobre o cenário político brasileiro também vão ao encontro dos apontamentos da socióloga, que afirma que as estatísticas do país refletem uma estrutura machista.

Apesar de serem a maioria entre o eleitorado [52,5%], as mulheres foram apenas 33,3% do total de candidaturas em 2020 para os cargos de prefeita, vice-prefeita e vereadora.

Essa estrutura se reflete em pequenos detalhes, como na hora de dividir as tarefas de casa, fazendo com que as mulheres trabalhem mais. Elas dedicam quase o dobro de tempo em comparação aos homens nas atividades domésticas e cuidado de pessoas, de acordo com dados da pesquisa Outras Formas de Trabalho, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Estrutura machista se reproduz ciclicamente?

O machismo também cria e constrói uma masculinidade hegemônica, em que é necessário seguir regras, conceitos e ideologias, evitando tudo que fuja da heteronormatividade. Crianças que crescem dentro dessa estrutura são ensinadas dessa forma e tendem a repetir comportamentos.

"Esse machismo constitui o modo que os meninos se tornam homens, que se criam a partir dessa norma e aprendem o que é ser um verdadeiro homem. Negando a possibilidade de ser criança, de ser gay e de ser mulher", explica Helen Barbosa dos Santos, Doutora em psicologia social e institucional pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), que pesquisa masculinidades há nove anos.

"Esse machismo também está entre as mulheres e elas não entendem o porquê, pois está na construção da vida delas. Inclusive constitui escolhas, como padrões de ser uma mulher amorosa, boa mãe, uma mulher que está disponível para o homem. Mulheres podem viver outras coisas e escolherem não casar e não serem mães", completa Santos.

Viver dentro desses ciclos irrigados por uma legitimação da desigualdade de gênero, também pode ajudar a explicar indicadores de maior violência entre os próprios homens. As taxas de homicídios de pessoas do sexo masculino em todos os estados do país é quase o dobro em comparação com as estatísticas gerais, de acordo com o estudo Atlas da Violência 2020, publicado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

"Brigas por honra e em conflitos armados por tráfico, são os principais motivos dos homens entre matar e morrer, mas muito desses homens vivenciam processos de desigualdades sociais e envolvimento com o crime, fazendo que estejam em uma espécie de masculinidade criminalizada, em que só é possível sobreviver por meio da violência", explica a Doutora em psicologia social.

Como evitar o machismo e rever atitudes e posicionamentos?

Para Helen Barbosa dos Santos, Doutora em psicologia social, a resposta é direta, mas passa longe de ser simples. Para deixar o machismo de lado, é preciso repensar a postura de ser ?machão?:

Não ser macho requer muita coragem em atitudes triviais, como por exemplo, apontar que um colega está sendo machista em um grupo de Whatsapp, Helen Barbosa dos Santos.

Helen explica que a maioria dos homens não se dá conta que é machista. "Muitos negam quando são acusados e associam o machismo apenas às situações extremas de violência e emoção ou à traição da companheira, mas o machismo pode estar em situações do dia a dia, como não lavar a louça", exemplifica.

Ecoa pediu que Bruna Cristina Jaquetto Pereira, especialista em gênero e raça, listasse algumas dicas práticas para identificar e evitar atitudes e situações machistas no dia a dia. Confira:

  1. Reveja crenças sobre diferenças entre homens e mulheres, em especial as que dizem que mulheres não são racionais, são muito emotivas e mais fofoqueiras;
  2. Como homem, responsabilize-se por pelo menos metade do trabalho doméstico e de cuidados dedicados aos dependentes;
  3. Contrate ou estimule a contratação de mulheres para vagas de trabalho, principalmente as consideradas "masculinas", com pagamento igual ao dos homens que desempenham o mesmo cargo e que têm a mesma formação;
  4. Não faça comentários sobre a aparência de mulheres. Como homem, reveja a ideia de que mulheres devem estar disponíveis para satisfazer interesses sexuais dos homens;
  5. Não aceite qualquer tipo de violência contra mulheres. Apoie e escute as vítimas de violência, sem lhe atribuir culpa e denuncie às autoridades sempre que ela solicitar ou corra risco de vida.