População cria rede para combater efeitos da pandemia no Bom Retiro
Conhecido principalmente pelo comércio de produtos da indústria têxtil, o Bom Retiro está entre os bairros paulistanos com maior proporção de mortes por coronavírus de toda a cidade. Apesar de ser uma área rica culturalmente, onde estão localizados espaços importantes como a Sala São Paulo, a Pinacoteca, o Teatro de Contêiner, o Teatro Porto Seguro e a Casa do Povo, entre outros, esta é uma das regiões de maior vulnerabilidade ao contágio devido à presença de ocupações e cortiços.
Para combater os efeitos da pandemia na região, espaços culturais, comércios, movimentos e instituições sociais se uniram na Rede Cuide do Bom Retiro, que também compreende ações nos bairros da Luz e Campos Elíseos. "Desde o início apostamos na ideia de fazer algo para ajudar no território entendendo que se a gente não fizesse isso deixaríamos de ser relevantes inclusive do ponto de vista cultural", diz à coluna o diretor executivo da Casa do Povo, Benjamin Seroussi.
"Não vimos saída a não ser ajudar o território. Isso vale para todo mundo: centro cultural, mercado, cabeleireiro. No nosso caso, nos juntamos com quem já sabe fazer. Pensamos uma atuação em rede, fomos procurando quem estava precisando e podendo ajudar", conta o parisiense radicado em São Paulo.
É uma experiência bonita porque junta Osesp e Ocupação Mauá, passando por Instituto Criar, Museu da Língua Portuguesa, Teatro de Contêiner, Casa do Povo, uma pastora, um frei de uma congregação religiosa, junta ONG, instituições culturais, coletivos sem CNPJ, mas que atuam há muitos anos no território, e isso permite que a verba que a gente arrecada vá diretamente para quem mais precisa.
Benjamin Seroussi, diretor executivo da Casa do Povo
Enquanto outros espaços culturais fortaleceram sua presença online, a Casa do Povo decidiu "ficar offline" e desenvolver ações no bairro junto com iniciativas locais, que vão da produção de sabão com óleo doado por vizinhos e restaurantes à confecção de máscaras por uma cooperativa formada por mulheres principalmente do Peru e da Bolívia.
O Teatro de Contêiner fez um movimento semelhante, pausando suas atividades culturais presenciais e intensificando as ações sociais no bairro. "Estar aberto ao entorno é uma das nossas premissas, e como estamos na região próxima à cracolândia, temos contato com dependentes químicos e pessoas em situação de rua. Não fazia sentido fechar", diz Léo Akio, artista da Cia. Mungunzá e do Teatro de Contêiner.
Kits de higiene, refeições, cobertores e livros
Além de distribuir 500 refeições diárias e kits de higiene, o grupo fez uma parceria com o Coletivo Tem Sentimento, organizado por Carmen Lopes, que faz um trabalho de geração de renda com mulheres cis e trans por meio da costura. "Ela ocupou o palco do teatro com máquinas de costura e distribuiu máscaras para a população de rua. Estamos nesse ritmo até agora. A distribuição de refeições diárias não parou nunca. Apesar do momento ser de home office, o trabalho triplicou, porque as pessoas em situação de vulnerabilidade foram abandonadas pelo estado."
O coletivo Projeto Vida, que tem apoio da Rede Cuide do Bom Retiro, está atuando no planejamento de uma ação de inverno na região. O objetivo, segundo a psicóloga Clair Aparecida, uma das responsáveis pelo projeto, é distribuir 1000 kits de proteção contra covid-19 e frio e 1000 livros de poesia. "Para aquecer e proteger o corpo e a alma das pessoas que se encontram em situação de rua. Afinal, estão longe de serem corpos ambulantes... Trata-se de uma ação para além da sobrevivência", diz.
Iniciativas como esta podem ser copiadas de várias formas em outros bairros, lembra Seroussi. "Mais do que campanhas milionárias, precisamos nesse momento de campanhas pequenas, próximas do corpo, das pessoas, do território, para responder às necessidades de cada um, e isso se faz apoiando iniciativas que conhecem as pessoas pelo nome."
Saiba como contribuir: benfeitoria.com/bomretiro
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