De comparação com cocaína aos ultraprocessados; açúcar é vilão de verdade?
Tem horas que o açúcar é o mocinho de momentos prazerosos da vida, em outras é eleito o vilão da alimentação. Parece contraditório, mas ao mesmo tempo em que este alimento que adoça nossas vidas está em uma festa infantil, tem quem acredite que ele faz tão mal quanto a cocaína.
O fato é que a relação do ser humano com o açúcar é antiga. Como relata a nutricionista Helena Dória Ribeiro de Andrade, a preferência por um sabor mais adocicado e a recusa em aceitar alimentos novos, chamada de neofobia alimentar, é um mecanismo evolutivo.
Antigamente, a forma mais eficaz de saber se um alimento estava estragado, por exemplo, era se guiar pelo sabor. Se tivesse gosto amargo, provavelmente não deveria ser consumido. Já o sabor doce no paladar era um sinal positivo.
"E, olha que interessante: o primeiro contato do ser humano com alimentação é o leite materno, né? E o carboidrato do leite tem esse sabor mais adocicado. A partir daí a gente vai desenvolvendo mesmo essa preferência por alimentos mais adocicados", explica Helena.
Para colocar os pingos nos is, o açúcar é, na verdade, um nome mais comum dado a alguns tipos de carboidratos como sacarose, glicose e frutose. Pode ser consumido de várias formas, da barra de chocolate a um pedaço de fruta. Por ser um carboidrato, apesar de não possuir nutrientes, acaba sendo uma fonte de energia para o corpo.
A fake news do açúcar e da cocaína
"De antemão, não há evidências científicas que suportem a ideia de que qualquer substância da comida, que inclui o açúcar, tem a capacidade de nos viciar como a cocaína", completa o nutricionista César Moraes. Mas vira e mexe a comparação entre as duas coisas aparece nas redes sociais. O caso mais recente foi o da influencer e ex-confeiteira Dani Noce que chegou a comparar as duas coisas ao falar o motivo de ter parado de confeitar e de consumir açúcar.
A origem dessa teoria está em um estudo divulgado, em 2016, pela Universidade de Queensland, na Austrália. O teste feito com ratos mostra que a mesma região do cérebro é conhecida como sistema de recompensa.
Só que, como já explicou o nutricionista Victor Machado, o que muitos esquecem de falar é que essa área também é ativada "quando comemos açúcar, fazemos sexo, abraçamos. O corpo é baseado no sistema de recompensa para que não fiquemos apáticos e consigamos reagir sobre a vida". Além disso, alguns outros fatores aparecem para desmentir essa informação.
"Não podemos dizer então que açúcar vicia. Essa ideia só aumenta as tensões das pessoas com a comida, o que prejudica por fim a aproximação com uma alimentação autônoma, flexível e saudável", afirma o nutricionista César Moraes, dizendo que apesar dos efeitos provocados por drogas serem muito diferentes do que os causados pelo consumo de um alimento adocicado, ainda há confusão sobre esse tema porque existem estudos científicos que ao invés de avaliar questões ligadas ao vício, na verdade, acabam focando em aspectos comportamentais de transtornos alimentares.
SIM
Fonte de energia
Açúcar é a principal fonte de energia do organismo. Quando existe um padrão de alimentação equilibrado, o consumo de açúcar pode ajudar a melhorar a disposição da pessoa.
Prazeroso
O efeito "calmante" do açúcar se deve ao estímulo do sistema recompensa, levando à liberação de dopamina e causando sensação, ainda que passageira, de bem-estar.
Social
Os docinhos das festas de criança, aquela sobremesa que a avó fazia... De certa forma, o açúcar está presente em vários momentos da nossa memória afetiva. Apesar de não possuir o fator nutritivo, é preciso considerar o lado social da alimentação.
NÃO
Indisposição
Da mesma forma que é fonte de energia, o açúcar, quando consumido em excesso, pode causar o efeito rebote, causando indisposição e sonolência.
Consumo em excesso e doenças crônicas
O excesso de qualquer substância pode ser prejudicial. O açúcar é glicose que, por sua vez, é fonte de carboidratos. O excesso desse grupo alimentar pode acarretar diabetes, aumento de triglicérides e obesidade, por exemplo.
Humor instável
Picos de consumo de açúcar ou quedas de glicose causam variações no humor. O ideal é saber equilibrar para que o organismo não sinta as mudanças tão bruscamente.
Equilíbrio é essencial
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) a quantidade adequada para um indivíduo consumir de açúcar por dia é de 25 gramas, o que pode variar de acordo com o peso, gênero e condição física de uma pessoa. Mas, no Brasil, a organização contabilizava que as pessoas ingeriram 50% a mais do que o recomendado em 2015. E isso gera preocupação porque o consumo excessivo pode causar problemas de saúde graves, como diabetes.
Para as especialistas, é fundamental não eleger apenas um tipo de alimento ou substância como a principal ameaça porque acabamos por concentrar a atenção apenas em um lado e esquecemos outros problemas. O certo seria olhar para diversas áreas e outros elementos, como o consumo excessivo de sódio, a frequência que uma pessoa faz atividades físicas, questões emocionais, sociais e até mesmo ambientais.
"Hoje mesmo eu atendi uma uma criança que, na primeira consulta, já me perguntou se ia poder comer doce, justamente por conta dessa ideia que as pessoas têm que o açúcar é o vilão", diz Helena, afirmando que o problema maior está em um conjunto de fatores associados ao estilo de vida das pessoas: a falta de exercício físico, o excesso alimentar não só do açúcar, mas também de gordura e de sal, por exemplo. "O ideal não é crucificar o açúcar, mas também não é para liberar geral. É preciso ter controle e equilíbrio", diz Helena.
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