Medo de aranha ou cobra? Ela ensina método para lidar com bichos nada fofos
Aranhas, insetos e cobras estão na agenda da bióloga Thaynara Siqueira Baumgartner. É com ajuda destes bichos que a moradora de Gonçalves, em Minas Gerais, ensina como identificar e preservar a nossa fauna, especialmente as espécies peçonhentas. Na lista há serpentes como jararacas, corais, cascavéis, aracnídeos como a aranha-marrom, viúva negra e insetos como vespas e abelhas.
O objetivo é evitar um passado recente. Thaynara é socorrista e também dava aulas em uma escola da região. Por isso, recebia fotografias com espécies encontradas por vizinhos que queriam identificá-las. Mas na maioria das vezes, as cobras, aranhas e insetos já haviam sido mortos por medo ou ojeriza.
"A gente precisa fazer algo", disse para o marido e técnico ambiental Henrique Miranda Baumgartner. Os dois desenvolveram cartilhas sobre a função ecológica de cada bicho, inclusive a de tipos menos simpáticos, como a aranha armadeira.
Fofofauna
Aranhas comem e controlam a população de mosquitos, que podem transmitir doenças e crescer descontroladamente. O mesmo vale para cobras, que se alimentam de roedores.
As relações mantêm a natureza equilibrada e o ser humano também sai ganhando. "Nós somos frágeis e precisamos pensar na natureza", diz Thaynara. "O meio ambiente sozinho sobrevive. Nós, não".
Mas segundo a bióloga, as espécies apresentadas no curso também têm medo, dor, não atacam sem motivo e precisam de respeito. "As pessoas pensam só nos bichos da 'fofofauna'", diz. "O restante é estigmatizado por credos, tradições, filmes de Hollywood e são mortos".
O conhecimento transforma
A jornalista Solange Hette morava em São Paulo até se mudar para Gonçalves. Ela tem pavor de aranhas e só tinha visto animais peçonhentos no Instituto Butantã, na capital paulista. No seu novo quintal, se deparou com uma armadeira e entrou em pânico. Depois, se matriculou no curso de Thaynara e hoje convive com aracnídeos (mais ou menos) numa boa, com cada uma em seu canto, e sabe como identificá-las. Além disso, a vida ofereceu desafios maiores.
Certa noite, ela notou algo de diferente no latido dos cachorros. "Eu respirei fundo e fui ver o que era", recorda-se. Uma cobra vagava pelo quintal. Com um cabo usado para baixar o toldo da varanda, prendeu os cachorros, manuseou a cobra e a despejou dentro de um tambor. No dia seguinte, a cobra foi libertada na natureza. "Antes, eu achava que todas as cobras eram venenosas", diz. "Dizem que o conhecimento transforma e, realmente, foi uma transformação para mim".
A Sociedade Brasileira de Herpetologia estima a existência de 442 espécies de serpentes, ou cobras, no Brasil. O número de aranhas em nosso país ultrapassa 3.200, segundo o ICmbio. Estudos descrevem a existência de 60 tipos de cobras peçonhentas no país, onde há cerca de 30 mil acidentes com cobras anualmente no país — o que não significa ataques peçonhentos.
As aulas são divididas entre curso teórico e prático, feito em um zoológico da região com participação do biólogo especialista Simon Borges. Atualmente, a parte teórica é feita de forma online; a prática deve ser retomada em novembro, devido à pandemia do novo coronavírus.
Ah, mas é claro, quem tem fobia sobre alguns insetos pode vê-los com calma, à distância, e não manuseá-los durante as atividades presenciais.
Sair do ego e pensar no eco
Thaynara costuma ensinar o método de usar um pote com um pedaço de papel para a captura de aranhas, como a marrom. O papel vai para baixo do pote e vira uma espécie de chão para aranha e tampa para o recipiente.
Segundo ela, a captura de cobras é mais complexa, mas elas podem ser manuseadas com galhos ou cabos e depositadas em urnas de plástico ou madeira. Nos dois casos, podem ser lançadas no ambiente depois, mas o mais importante é respeitá-las e identificá-las. "Os acidentes com aranha marrom, por exemplo, costumam acontecer por pisar nelas sem querer. Elas não vão para cima", diz.
A diferença entre um venenoso e um peçonhento é a capacidade de liberar o veneno, se acuado. Por exemplo: há sapos que são venenosos se forem mordidos, mas que não têm capacidade de liberar veneno em uma presa ou quando se sentem acuados. Após o curso, segundo a bióloga, os alunos saem com outra percepção dos bichos. "Um deles me disse que não tem mais medo das cobras morderem seus cachorros, mas dos seus cachorros morderem as cobras".
"Soa batido, mas a frase é verdade: a nossa única salvação é a educação", diz Thaynara. "Temos que sair do ego e pensar no eco: não somos donos desse lugar onde vivemos, e precisamos respeitar todas as espécies", conclui.
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