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Marks: "Precisamos nos sentir abraçados", diz criador do funk motivacional

Mc Marks é criador do funk motivacional e dono do hit "Deus é por Nós"" - EstudioCUBO/Divulgação
Mc Marks é criador do funk motivacional e dono do hit "Deus é por Nós'" Imagem: EstudioCUBO/Divulgação

Giacomo Vicenzo

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

09/06/2021 06h00

"O favelado tem que ser o protagonista, não temos ajuda do governo, às vezes não temos apoio nem da família para ir em busca do que desejamos, pois os pais passaram vários anos do mesmo jeito na Terra e estão saturados, como vai dar força para o filho mudar?" O questionamento é o Mc Marks, um dos grandes novos nomes do funk de São Paulo, que traz em seu repertório o que chama de funk motivacional, com letras que empoderam a periferia e a favela.

Marks é uma das atrações do Festival Atlas das Juventudes, que entre hoje (9) e sábado traz uma série de apresentações musicais, pocket shows, debates, oficinas e mesas de conferência. O evento marca o lançamento da segunda edição da pesquisa Atlas das Juventudes, que ouviu jovens sobre os temas saúde, trabalho, renda, educação e vida pública. O estudo focado na população entre 15 a 29 anos é uma bússola que ajudará a orientar a implementação de projetos, estratégias e políticas públicas por parte de pessoas e organizações interessadas. Todas as atividades são gratuitas e estarão online em Ecoa.

Para Mc Marks, que nasceu em Americanópolis, periferia da zona sul de São Paulo, o sentimento de ser ouvido é essencial. "A voz da favela tem que ser sempre motivada, tem muita gente que está gritando e não é ouvida, posso passar a minha visão, o contexto que criei em minha vida", comenta o artista do hit "Deus é por Nós", que marca mais de 171 milhões de visualizações no Youtube.

"É muito difícil ter motivação em meio à dificuldade, é por isso que canto isso nas minhas letras. A superação não é uma vaidade, é uma necessidade", completa o MC. Além de Marks, o Festival terá shows de Emicida, Tuyo e Nayra Lays. A programação também está recheada de slams e debates que visam apresentar as pluralidades e potências dos mais diversos territórios

Leia o bate-papo com o Mc Marks, que fecha a programação do festival no sábado:

Ecoa - Você fala com a juventude e sobre a juventude principalmente das quebradas, e tem o empoderamento da periferia como tema constante em suas letras. Essa é uma tendência que está crescendo no cenário do funk consciente? O que você considera que está mudando nos últimos anos?

Mc Marks - Não me considero um cantor de funk consciente, criei algo chamado funk motivacional. Quando escrevo minhas letras, penso sempre em motivar alguém que está precisando de uma palavra de conforto. São tantas dificuldades no dia a dia que precisamos nos sentir abraçados em algum momento. A primeira música que fiz motivacional foi a 'Deus é por nós', eu estava precisando de uma motivação e conversei com Deus para escrever essa letra, que me motivou e motivou a outras pessoas. Curto muito o funk consciente, mas me considero como um cantor de funk motivacional. O ritmo está mudando muito, os moleques estão entendendo que passar uma mensagem da hora também é sucesso e os estilos conscientes e motivacionais também ajudam os MC's a crescerem.

Suas letras falam sobre Deus, sobre a importância dos conselhos de sua mãe, mas também falam sobre vitória. Quais você considera que são as principais mensagens?

As principais visões são que não é porque a gente nasceu na periferia que temos que nos enraizar. Temos que crescer, evoluir, querer o melhor para gente, não podemos nos acomodar onde nascemos. Precisamos procurar novos ares e ir em busca do nosso progresso. Para a gente, é difícil, como diria os Racionais Mc's já nascemos duas vezes atrasados. Mas nada é impossível, se levantarmos todos os dias e sonharmos a gente chega lá.

Quais momentos de sua vida estão literalmente em suas letras e servem como inspiração?

A maioria das minhas letras são de algo que vivi. Uma das que mais me identifico é a: 'Alimente a sua fé', que diz - "Saio para rua na batalha louca, eu tô de pé às 6h da matina, pego meu jaco, moletom e touca, faz frio em São Paulo, céu tá com neblina, e busão anda lotado, para variar tô atrasado, mas vou atrás do meu trocado. Eu sei que nada nessa vida é por acaso. Uma vez pedi a Deus que me desse uma atenção, ele respondeu em forma de canção". Essa é literalmente a minha vida, que era a minha rotina de estudo e trabalho, e é o dia a dia de praticamente toda população brasileira.

Por que sonhar que a favela está linda, sem preconceito e opressão policial, como você diz em sua letra da música 'Jesus Olhou pra mim', pode ser ainda mais importante neste momento de crise causada pela pandemia de covid-19?

Neste momento ainda é mais preciso sonhar de verdade. O Brasil já vinha com muitas dificuldades e quem é mais afetado com a covid-19 são os mais pobres. Se já era difícil, imagina agora? Por mais que essa doença tenha afetado o mundo todo, quem mais sofre são os pobres, triplicou as dificuldades, por isso é importante sonhar pelo menos 10 vezes mais para que isso um dia possa mudar.

Você acredita que temas como religião e família tocam seus fãs? Como você trabalha isso em suas músicas?

Eu não prego nenhuma religião nas minhas músicas, estamos num país laico, acho que isso é uma coisa muito pessoal e quero atingir todos os públicos. Falo de Deus, mas o meu Deus pode ser diferente do seu e está tudo certo. A família é minha base, meu combustível para sair para rua e voltar com a vitória.

O que é preciso para que a 'favela linda' deixe de ser um sonho e se torne uma realidade? Qual a importância da voz do 'favelado' para que isso deixe de ser um sonho?

É preciso uma nova política, precisamos reestruturar a nossa política brasileira em relação a tudo mesmo. Precisa dar um boot igual faz no computador — digo isso por que antes trabalhava com tecnologia—, precisa formatar essa política corrupta e preconceituosa. Esse é um começo para mudarmos a nossa realidade. A favela precisa gritar, porque se não for assim não escutam o que estamos falando.

Se não brigarmos e lutarmos pelo nosso direito ninguém fará nada pela gente. A voz da periferia é a voz do povo brasileiro.

Veja a grade completa de atrações do Festival Atlas das Juventudes

09 de junho (quarta-feira), 18h às 21h
· Abertura
· Apresentação Atlas das Juventudes 2021 com Mariana Resegue e Marcus Barão
· Poetry Slam - Bixarte
· Debate 1: O que pensam as juventudes?
· Apresentação musical - Emicida

10 de junho (quinta-feira), 18h às 22h
· Abertura
· Mesa 1: Talk
· Poetry Slam - Meimei Bastos
· Mesa 2: Instituto Veredas
· Mesa 3: Trabalho/Cultura
· Apresentação musical - Nayra Lays

11 de junho (sexta-feira), 18h às 22h
· Abertura
· Curta
· Mesa 4: Juventudes e a Pandemia
· Apresentação musical - Wera MC
· Debate 2 (GOYN/+Unidos): Inclusão Produtiva
· Debate 3: Juventudes Negras
· Apresentação musical - Tuyo

12 de junho (sábado), 14h às 17h
· Abertura
· Debate 4: Meio ambiente e clima
· Poetry Slam Tonyyymon
· Debate 5: Educação e evasão escolar
· Apresentação musical - MC Marks