Vacina e menstruação: Pesquisadoras investigam efeitos ignorados em testes
Duas pesquisadoras norte-americanas que haviam notado alterações em seus ciclos menstruais após serem vacinadas para a covid-19 foram para as redes sociais em fevereiro tentar descobrir se outras pessoas também tinham tido essa experiência. A resposta veio rapidamente: sim, muita gente estava na mesma situação.
A partir dos relatos recebidos, Kathryn Clancy, professora de antropologia da Universidade de Illinois, e Katherine Lee, pesquisadora de pós-doutorado em saúde pública na Universidade de Washington, passaram a coletar as informações por meio de um questionário online.
Esse possível efeito colateral imprevisto das vacinas para a covid-19 indica que efeitos sentidos especificamente por mulheres e outras minorias de gênero ainda tendem a ser invisibilizados nas pesquisas para o desenvolvimento de vacinas.
"Nós tendemos a produzir tecnologias médicas que enfocam um tipo específico de corpo ou uma compreensão específica do que é o corpo padrão, e tratamos todo o resto como desvio, o que é problemático", disse Katherine Lee.
Mais do que isso, Lee destacou a importância da escuta atenta e da validação das experiências relatadas, seja no consultório ou no desenvolvimento de medicamentos e vacinas. Segundo ela, isso muitas vezes não faz parte do procedimento médico e faz com que apenas efeitos sobre os quais se perguntou diretamente sejam registrados.
Mulheres estiveram historicamente sub-representadas em testes clínicos de medicamentos e pesquisas de saúde de modo geral. A predominância de homens brancos nesses estudos foi muitas vezes prejudicial à saúde para elas.
Do início de abril até meados de junho, mais de 120.000 pessoas haviam respondido à pesquisa conduzida por Clancy e Lee, que ainda está aberta para participantes que menstruam e tenham sido vacinados com pelo menos uma dose de vacina contra covid-19 em diferentes países. Os dados coletados estão começando a ser analisados.
"Acreditamos que as vacinas são seguras"
As pesquisadoras ainda não conseguem responder se as mudanças na menstruação têm relação com tipos determinados de vacina. As da Moderna e da Pfizer foram as mais aplicadas no estágio inicial da vacinação nos EUA, mas outras vacinas estão sendo incorporadas à amostra da pesquisa à medida que o número de participantes e países de origem aumenta.
A Ecoa, Clancy afirmou que as alterações no ciclo menstrual parecem estar atingindo uma minoria de pessoas vacinadas que possuem útero. "Assim como acontece com o braço dolorido, fadiga e todos os outros efeitos colaterais, nem todo mundo tem [mudanças no ciclo]", disse.
Pessoas que apresentam esse efeito normalmente têm um sangramento mais intenso ou inesperado (no caso de mulheres na menopausa ou de pessoas trans em terapia hormonal, por exemplo), que é temporário, com duração entre um e dois ciclos.
"Não prevemos efeitos de longo prazo [sobre a menstruação] em nossa pesquisa", afirmou Clancy. Caso o sangramento persista, as pesquisadoras recomendam procurar atendimento médico. Também há casos menos numerosos de pessoas que apresentaram um fluxo mais leve ou ausente após a vacina.
Isso acontece porque a resposta imune desencadeada pela vacina se reflete no processo de hemostasia, que regula o fluxo sanguíneo. Além de respostas imunológicas, uma série de fatores podem alterar o ciclo menstrual, como atividade física, dieta, sono e estresse.
Segundo Clancy, as únicas informações relativas à menstruação coletadas nos testes de vacina nos EUA são a data do último ciclo, se a participante está grávida ou pretende engravidar. Para a pesquisadora, isso demonstra que só existe preocupação com a saúde das mulheres por parte dessas pesquisas quando há uma gestação.
Ainda que considerem que algumas perguntas específicas direcionadas para mulheres e pessoas transgênero com útero deveriam ter sido incluídas nos testes das vacinas para a covid-19, a fim de detectar esse tipo de efeito, Clancy e Lee consideram as vacinas para a covid-19 seguras. Mas afirmam que faltou compreender um efeito colateral que pode atingir um grande número de pessoas.
"A preocupação das pessoas vem quando sua experiência é diferente do esperado, e muitas delas foram ignoradas quando levaram essa questão para médicos, amigos ou familiares", afirmou Lee. "Para aquelas que parecem estar tendo uma diferença em seu ciclo menstrual, seria bom saber se isso é esperado, especialmente no caso daquelas que estão relatando coisas como sangramentos repentinos, depois de ficar anos sem menstruar".
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