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Como um grupo de aracnólogas está combatendo o machismo na ciência

Pesquisadoras que integram o SWA - Support Women in Arachnology - Divulgação
Pesquisadoras que integram o SWA - Support Women in Arachnology Imagem: Divulgação

Juliana Domingos de Lima

De Ecoa, em São Paulo

13/09/2021 06h00

Muito já se falou sobre a sobrecarga das mulheres durante a pandemia de covid-19. Entre pesquisadoras, já há evidências de que o isolamento social fez sua produção científica despencar, enquanto teve menor impacto em cientistas homens.

Além de ter agravado a desigualdade de condições para produzir, a pandemia pode ter acentuado outros vieses que prejudicam mulheres acadêmicas. A professora da UERJ Amanda Cruz Mendes, especialista em biodiversidade e evolução de aracnídeos, diz que desde o ano passado praticamente só pesquisadores homens eram convidados a participar de eventos on-line da área.

Em resposta a essa e outras situações de discriminação de gênero, pesquisadoras brasileiras da aracnologia criaram o SWA - Support Women in Arachnology, organização com mais de 20 mulheres que tem dado visibilidade aos problemas enfrentados por elas no meio acadêmico pelo fato de serem mulheres.

Além de diagnosticar e expor o problema, o grupo tem sido importante por criar uma rede — ou "teia", como elas preferem dizer — para fortalecer a atuação das aracnólogas na academia e colocar em prática ações de combate ao machismo nesse campo de estudo.

Da percepção à ação

A aracnologia é a área da biologia que se dedica ao estudo dos aracnídeos, animais como aranhas, escorpiões, carrapatos e opiliões. É um ramo de pesquisa forte na América Latina e Caribe e que tem grupos de pesquisa muito atuantes e produtivos no Brasil.

Ao perceber que estavam sendo preteridas de eventos online, as aracnólogas começaram a relembrar que isso já acontecia mesmo antes da pandemia, em eventos, palestras e encontros da área. Quando pensavam em grandes nomes da aracnologia, pouquíssimas mulheres vinham à mente, menos do que em áreas próximas, como a entomologia, que estuda os insetos.

"Nossa impressão geral era que pouquíssimas mulheres chegavam ao que é considerado topo de carreira e que nós parecíamos invisíveis. Por muito tempo, eu ficava pensando se não era realmente uma área masculina. Mas hoje em dia eu vejo que não é isso. É uma área em que o preconceito de gênero é bem acentuado"
Amanda Cruz Mendes, professora da UERJ

Como cientistas, elas decidiram estudar o fenômeno e verificar se as impressões compartilhadas por pesquisadoras da área estavam respaldadas em dados. Quando o primeiro levantamento feito pelo SWA confirmou essas percepções, resolveram formular estratégias de ação para lidar com o problema.

O que elas estão fazendo

Depois do levantamento preliminar, a primeira ação do SWA foi organizar um simpósio para tratar do viés de gênero na aracnologia em um importante congresso da área, o Congresso Latino Americano de Aracnologia de 2020, realizado online em dezembro. O grupo também lançou um edital para custear as inscrições de cerca de 50 pesquisadoras de 11 países.

Segundo as pesquisadoras que integram o SWA, essa pequena ação já teve um impacto positivo para a sensação de pertencimento e melhora da autoestima das pesquisadoras contempladas — muitas relataram nunca ter sido selecionadas para nada parecido.

O grupo organiza atualmente um levantamento mais aprofundado sobre a desigualdade de gênero na área e defende uma série de diretrizes para lidar com ela, como anonimato na avaliação de artigos e transparência nos critérios de seleção de participantes em comitês, corpos editoriais e conferências.

Mas o enfrentamento da questão necessita do envolvimento de todos. "Não é nossa prerrogativa resolver sozinhas um problema dessa magnitude. Precisamos que a ideia seja abraçada por toda a comunidade acadêmica", diz Amanda Cruz Mendes.

Integrante do SWA e curadora de Ecoa, a professora da UFMT Ana Lúcia Tourinho destacou a adesão e o suporte que a organização recebeu das associações internacionais da área e de como também fez pesquisadoras jovens se sentirem representadas.

"O desafio que nós temos pela frente é muito grande. Esse trabalho que fazemos é desgastante e depressivo, porque a gente tem que estar constantemente vendo uma face muito injusta, violenta, opressiva da estrutura da academia. Mas, ao mesmo tempo, nos fortalecemos por estarmos juntas", diz Tourinho. "Estamos no caminho certo e coletivos como o SWA precisam começar a acontecer em todas as áreas da ciência".