Desenvolvimento atípico: qual significado de termo para PCDs e autismo?
"Atípico e típico" são termos cada vez mais populares entre pais, médicos, professores e educadores para definir características que diferenciam o aprendizado de crianças e adolescentes com deficiência, autismo e outras características atípicas. Afinal, qual a origem das duas palavras? O que elas significam? Ela é mais respeitosa e acessível? Por que ela foi popularizada?
O que é desenvolvimento típico e atípico?
Típicos e atípicos são termos usados para definir o desenvolvimento de uma criança ou adolescente. Por exemplo: um aluno com deficiência intelectual ou física pode ter um desenvolvimento atípico do esperado para determinada idade. Logo, ele irá crescer e aprender de uma maneira diferente do típico para aquela etapa da vida em relação às pessoas sem deficiência.
Para entender essas questões neste Dia Nacional da Pessoa com Deficiência, comemorado hoje (21), Ecoa convidou Enicéia Gonçalves Mendes, professora de psicologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), da pós-graduação em educação especial, e coordenadora do Observatório Nacional de Educação Especial. Ela também é pesquisadora da Fapesp.
Por que o termo atípico se tornou cada vez mais usado?
De acordo com Google Trends, as buscas pelo termo "atípico" cresceram ao longo dos últimos cinco anos.
Um dos possíveis motivos foi a série da Netflix Atypical (ou Atípico, em português), encerrada em 2021. A história narra a vida de Sam Gardner, um jovem com autismo. O termo é comum há anos entre médicos e aliados das pessoas com autismo, mas foi ampliado por pais nas redes sociais, educadores e médicos em redes de apoio a crianças com outros desenvolvimentos atípicos, como deficiências físicas e intelectuais, que vão da microcefalia a problemas motores, paralisia cerebral, entre outros. É comum serem chamados de "pais e mães atípicos".
"Atípico" é um termo melhor do que "especial" ou "deficientes"?
Como você deve ter notado, as palavras usadas para classificar o desenvolvimento atípico mudam. Não é de hoje. A medicina, as escolas e a sociedade criam termos para distinguir pessoas com deficiência há séculos, e as mudanças costumam refletir a percepção da sociedade sobre a população atípica.
Um exemplo? É ainda comum ouvir o termo "portadores de deficiência" ou "deficientes" por aí. No entanto, as pessoas com deficiência definiram que "pessoas com deficiência" (PCDs) é uma maneira mais respeitosa e exata para definir quem tem alguma deficiência.
O mesmo vale para os surdos, que aboliram o "pessoas com deficiência auditiva" para se apresentar como surdos diante da sociedade. Assim, é possível se estabelecer como um grupo, conseguir mais visibilidade, respeito e acesso a direitos.
O desenvolvimento atípico, por outro lado, se refere não a um grupo em particular, mas a uma característica em relação às etapas de aprendizado e desenvolvimento esperados para determinada idade.
Ainda é comum o uso do termo "especial" ou "escolas especiais", criados para diferenciá-las de uma escola supostamente despreparada para a recepção de alunos atípicos. Portanto, desenvolvimento atípico se refere a uma característica do aprendizado e crescimento, mas cada grupo possui as próprias denominações.
Por que os termos mudam?
Segundo a professora Enicéia, as descrições para pessoas com deficiência, autistas etc. costumam ser criadas por médicos e depois popularizadas entre a sociedade. Muitas foram transformadas em ofensas. "Os termos 'retardado', 'desenvolvimento retardado' e 'idiota', por exemplo, foram criados como descrições técnicas da medicina", explica.
Nos últimos 40 anos, a medicina e o movimento de pessoas com deficiência, autistas e com outros desenvolvimentos atípicos estabeleceram palavras mais respeitosas e precisas — que diminuem a carga pejorativa e evitam os eufemismos. "Há dois propósitos na mudança de termos: ele demonstra que a medicina fez estudos mais precisos que geraram mudanças conceituais nas palavras. O segundo é tirar o estigma de concepções negativas relacionadas à deficiência, para melhorar o acolhimento e a compreensão", diz.
Atípicos devem ir para escolas separadas?
Em Brasília, pais de atípicos protestaram contra falas capacitistas do ministro da Educação, Milton Ribeiro. Nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Ribeiro afirmou que crianças com deficiência atrapalham o desenvolvimento em sala de aula. Um decreto presidencial foi assinado para estimular a segregação de alunos com deficiência. A tese do ministro é desmentida por pesquisadores, pais e pessoas com deficiência.
Há mais de 30 anos, pesquisas no Brasil, Europa e Estados Unidos concluem: alunos com desenvolvimento atípico têm notas, desenvolvimento de habilidades sociais e intelectuais maiores quando estão integrados academicamente do que aqueles segregados.
No Brasil, as políticas de escolas inclusivas aceleraram as matrículas e geraram frutos. Segundo o Dieese, cerca de 36 mil novas vagas para pessoas com deficiência foram abertas somente entre 2018 e 2019, com níveis semelhantes de escolaridade em cursos superiores a dos trabalhadores formais sem deficiência (17,4% contra 22,9% do mercado de trabalho geral). Apesar disso, relatório aponta que a lei que institui cotas em empresas não é respeitada.
Recentemente, medalhistas Paralímpicos em Tóquio, como as gêmeas Débora e Beatriz Carneiro, Gabriel Araújo, e Yeltsin Jacques do atletismo são alguns nomes vindos das políticas de inclusão em escolas regulares. O Censo Escolar 2019 do Inep demonstra que 1,2 milhão de estudantes com deficiência estão matriculados na educação básica no país, e 87% estão em escolas regulares. Somente 13% estão matriculadas em escolas ou salas especiais.
Para Enicéia, há ainda um agravante: nem todos os municípios brasileiros têm escolas especiais, o que diminui a chance de educar pessoas com desenvolvimento atípico. Segundo o Censo Escolar, 70% dos municípios não têm estrutura especializada, como classes ou escolas especiais, e as existentes estão no Sul e no Sudeste.
O censo aponta que existem no Brasil 179.533 escolas de educação básica, com 48,4% das matrículas em escolas municipais. A rede estadual, responsável por 32,1% das matrículas em 2020, é a segunda maior. A rede privada obtém 18,6% e a federal tem uma participação inferior a 1% do total de matrículas. "A matrícula em escola regular mostra que a escola é um direito, um dever do Estado, não um ato de caridade para uma pessoa com desenvolvimento atípico", conclui a especialista.
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