Tiago Abravanel: 'A gente precisa, mais do que nunca, lutar por igualdade'
O sorrisão e a simpatia de Tiago Abravanel deram o tom da primeira edição do Prêmio Ecoa, na manhã desta quinta (2). Direto de São Paulo, o ator, cantor e apresentador foi o mestre de cerimônia do evento, que teve como objetivo potencializar vozes, impulsionar e dar visibilidade às iniciativas que estão criando soluções para os desafios do país.
O artista reforçou a necessidade de ações como esta na luta por mudanças significativas. "Queremos impulsionar e inspirar o público. O prêmio promove uma série de trocas e encontros e a gente sabe que as coisas só podem mudar quando todo mundo muda junto. Eu estou muito feliz em fazer parte disso tudo".
Ciente de que a luta precisa ser de todos, Tiago aproveitou a ocasião para fazer um convite: "Quanta gente incrível existe no Brasil. O nosso país é tão grande e precisa que todos que estão aí lutem por igualdade, e que a gente dê voz a essas pessoas. Eu espero que vocês saiam do prêmio mais entusiasmados, honrados e emocionados. Tenho certeza de que esse é o primeiro de muitos e estou feliz em fazer parte dessa história. Eu sou só uma formiguinha, mas todo mundo pode transformar esse mundo".
O importante é lutar
Nome de grande impacto no Brasil por conta de seu trabalho com as pessoas em situação de vulnerabilidade, o Padre Júlio Lancellotti foi recebido em festa por Tiago Abravanel no palco. Ele falou sobre Irmã Dulce, vencedora por votação popular na categoria "Fizeram História".
Durante o bate-papo com o apresentador, o padre falou da importância de as pessoas usarem os ensinamentos de Jesus com o próximo. "A solidariedade não é religiosa, ela vai além. Muitas vezes, os cristãos acreditam que Deus é acima de tudo e não cuidam dos outros. Muitos usam a religião para discriminar", conta.
Desde que iniciou suas ações, Padre Lancelloti tem sido duramente criticado. Mas engana-se quem acha que palavras negativas o afetam. "As críticas sempre vão acontecer, porque cada um tem um ponto de vista. Quando estou com pessoas em situação de rua, incomoda. Tem um movimento de culpabilizar a pobreza, então não é falado sobre o sistema que causa a pobreza. A pobreza e a miséria não acontecem por acaso, e quando você está do lado do povo negro, dos indígenas, dos público LGBTQIA+, você é criticado".
"Quem coloca comida na mesa é a agricultura familiar"
Vencedora na categoria Iniciativas que Inspiram, a Associação da Rede de Mulheres Produtoras do Pajeú — instituição que busca romper com a condição de isolamento das mulheres rurais e de periferias, a partir da organização coletiva na luta por direitos sociais, econômicos e políticos — participou da premiação sendo representada por Ana Cristina Nobre e Silvia Ferreira.
Para Ana Cristina, o trabalho realizado pela rede é muito importante para o território onde se localiza, em Pernambuco, já que ele vem tirando muitas mulheres da invisibilidade e da situação de violência. Silvia vai além: "Estamos indo para o mundo e tirando mulheres que estão não apenas na violência, mas na vulnerabilidade. A gente tem momentos de muita dificuldade, e foi a rede que realmente deu embasamento às mulheres para continuarem se empoderando, se fortalecendo, buscando autonomia política e econômica. A rede tem feito esse trabalho economicamente, com o artesanato e a agricultura familiar".
Ana Cristina lembrou que o agronegócio é feito para exportação e quem coloca comida na mesa dos brasileiros é a agricultura familiar. Então, é preciso recurso para manter esta função. "Muitas mulheres ainda não entenderam a importância do trabalho delas, que é através dele que a comida vai para a mesa. Temos um público de 280 mulheres no Pajeú, que se articulam, e temos várias mulheres que estão adquirindo sua independência financeira e política através desse trabalho. É essencial que as políticas públicas vejam que de fato é necessário esse fortalecimento para dar novos passos e outros rumos, em especial com essa política nacional que tem fragilizado muito essas experiências. A gente precisa avançar".
Proteção dos oceanos
Beatriz Mattiuzzo, responsável pela Marulho, organização que atua com conservação do oceano, levou o prêmio na categoria Empresas que Mudam. Ao conversar com Tiago e com Luciano Frontelle, diretor executivo da Plant for the Planet Brasil, ativista pelo clima e curador de Ecoa, ela reforçou que não está sozinha — há uma rede de trabalhadores atuando pela causa junto com ela. "Sou oceanógrafa, tinha vontade de trabalhar com a conservação do oceano e quando fui para Ilha Grande (RJ) comecei a trabalhar com a comunidade tradicional de lá. Ela existe, não por mim, mas pelas pessoas que estão lá, que são os verdadeiros guardiões do oceano".
Beatriz acredita que, para incentivar as pessoas a consumirem produtos de empresas como a Marulho, é necessário ter um espírito questionador. "É um trabalho de questionar e é algo que tento fazer. De onde os produtos [que consumimos] vêm? Por quem estão sendo feitos? Também é preciso se aliar a políticas públicas. Nossas ações são importantes sim, mas precisamos coletivizar, porque juntos vamos sempre ter mais força".
"A gente quebra o preconceito com conhecimento"
Um dos momentos mais emocionantes da premiação ficou por conta de Carmen Silva. Premiada na categoria Causadores, a Coordenadora do MSTC e de várias ocupações modelo no Centro de São Paulo falou sobre a popularização da causa da moradia.
O colunista do Ecoa Eduardo Carvalho questionou se o fato de o movimento dos Sem-Teto terem uma programação cultural para o público transformou a iniciativa em algo pop. Para Carmen, o movimento abriu suas portas para obter mais troca, para receber e acolher. "Vimos que o movimento não tem que ser sectário, tem que ser capaz de alcançar todo mundo. Acredito que a cultura transforma, por isso que a gente tem essa grande conexão com a arte. E temos também uma grande questão com a alimentação. Criamos uma ação que é para o resgate principalmente da saúde alimentar", afirma.
Carmen também falou sobre o olhar de preconceito que seu trabalho sempre recebeu ao longo dos anos. Segundo ela, isso ainda não mudou. "A gente tenta quebrar isso com o conhecimento. O desconhecido nos causa medo, então quando a gente troca, a gente passa a conhecer, e o preconceito muda. Ainda há uma grande satanização dos movimentos sociais, em especial os que envolvem moradia, porque a gente tem uma denúncia da propriedade abandonada. Quando ocupamos prédios vazios, abandonados, nós ocupamos porque estamos cansados de ver a hipocrisia da falta de políticas públicas. A moradia é um direito básico, ela deve ser um direito assim como a educação, a alimentação, a acessibilidade", afirma.
Ela explica ainda que a pandemia tornou esse problema ainda mais evidente. "Durante a pandemia, o que a gente mais escutou foi 'fica em casa'. E quem não tem casa, fica onde? Estamos em uma capital que tem 190 mil imóveis desocupados, entre prédios, casas, terrenos, galpões, e uma população de quase 400 mil pessoas sem ter onde morar".
Proteção da Amazônia
Christiane Torloni foi a vencedora na categoria Vozes que Ecoam, da primeira edição do Prêmio Ecoa. Ativista há mais de 10 anos, ela levanta a bandeira da preservação do meio ambiente, em especial da Amazônia. Para a atriz, muitas pessoas se recusam a se calar e pedem soluções urgentemente. "Eu creio que todas as pessoas que de alguma maneira se envolveram com essa preocupação também se tornam guardiãs dessas políticas que estão sendo promovidas e as que não estão sendo promovidas. Então, o que que eu entendo? O Brasil, através das suas redes sociais, neste momento, tem uma ferramenta de fiscalização enorme".
Pronta para lutar, a artista se descreve como uma convocadora. Por isso, ela aproveita o momento para fazer um convite: "Eu convido a vocês, para que nós continuemos juntos nesta luta. Ailton, Marina, Lázaro, Bruno, que todos, mesmo que não tenham sido indicados, continuem na luta, não desistam. Porque, às vezes, como dizia Lucélia Santos no nosso filme, a gente fica muito cansado, mas tem que continuar lutando. Nós somos ferramentas, somos importantes. A cada dia a gente levanta e diz: 'hoje eu vou fazer'. Então, vamos fazer juntos. Sigamos juntos", finaliza.
"Eu sou o que meus ancestrais fizeram"
Embalando o prêmio, Bia Ferreira foi a atração musical. Durante o evento, ela apresentou alguns de seus sucessos como "Cota não é Esmola", música que representa cada passo firme da cantora e compositora na sua luta contra o racismo e a opressão.
"A Dona Conceição Evaristo [escritora] diz que falar estilhaça a máscara do silêncio e eu acho que toda vez que eu tenho o microfone e eu posso compartilhar as coisas que eu escrevo, por memória ancestral ou por estudo, é o que constrói a minha forma de ver. Acho que a música nos conecta, ela leva coisas que não chegariam, mas a minha voz chega. Honrar meus ancestrais é cantar. Eu sou o que meus ancestrais fizeram".
O Prêmio chegou ao fim com Bia Ferreira declamando o poema "Muito Obrigada, Preta", ao lado da ativista por moradia e multiartista Preta Ferreira, que fez uma participação especial em seu show.
Conheça os vencedores
Categoria Fizeram História
Vencedora: Irmã Dulce
Categoria Iniciativas que Inspiram
Vencedora: Associação da Rede de Mulheres Produtoras do Pajeú
Categoria Empresas que mudam:
Vencedor: Marulho
Categoria Causadores:
Vencedora: Carmen da Silva Ferreira
Categoria Vozes que Ecoam:
Vencedora: Christiane Torloni
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