Dar esmola divide opiniões: ajuda quem precisa ou perpetua a pobreza?
Caçar uma moedinha, escondida no fundo da bolsa, para entregar a alguém que pede na rua de uma grande ou pequena cidade. Muita gente faz questão de ter esse ato de caridade com o próximo, enquanto outros tantos afirmam que dar esmola é uma forma de perpetuar a pobreza. Afinal, dar esmola ajuda quem precisa?
Muitas são as discussões que envolvem este tema e as opiniões se dividem. Para um grupo, a esmola pode ser a única forma de determinadas pessoas fazerem suas refeições. Às vezes, uma única refeição ao dia. Para outro, a esmola pode até aliviar situações de extrema necessidade, mas não contribui para transformar a condição social de uma parcela extremamente empobrecida da população.
Quando o assunto envolve crianças, a polêmica fica ainda maior. Para entender o que está por trás desse debate complexo, Ecoa conversou com alguns especialistas.
SIM
Combate à fome e à morte
Ao falar sobre o tema, o professor e filósofo australiano Peter Singer (1946) levanta a questão da ética. Para ele, se uma ação tem um custo tão baixo, então ela deve ser realizada. Peter ainda argumenta que nem toda pessoa em situação de rua está em um ponto de vida ou morte, mas é altamente provável que pelo menos alguns deles estejam, e você não pode arriscar uma infração ética tão óbvia quanto permitir que alguém passe fome, podendo ajudar.
Pode evitar violência
Em coro com o filósofo, alguns profissionais, principalmente os que trabalham com ONGs e instituições de caridade, defendem que ajudar pessoas em situação de vulnerabilidade com a doação de esmolas não só promove amparo aos que precisam, como também representa uma forma de evitar novos casos de violência, já que uma pessoa que está passando extrema necessidade escolheu pedir ajuda na rua e não roubar.
Amparo num momento pontual
Ouvimos histórias de famílias que foram ajudadas por esse tipo de ação. Mas isso não fez com que mãe e filha virassem as costas para o trabalho, os estudos ou qualquer ação que pudesse proporcionar a elas uma vida melhor. Muito pelo contrário. As doações ajudaram muito e fizeram com que ambas continuassem trabalhando para, no futuro, dar ao próximo aquilo que receberam quando tanto precisavam.
Muitos combatem a ideia de que quem recebe esmolas ou qualquer outro tipo de ajuda acaba se acomodando. Você já tentou imaginar como é passar o dia sob sol e chuva em troca de algumas moedas? Qual deve ser o grau de necessidade e desamparo para que esta seja a melhor opção para sua sobrevivência?
NÃO
A questão não deveria ser resolvida na esfera particular
Muitas pessoas acreditam que não dar esmola é mudar toda uma cultura. Estudiosos defendem que o hábito de dar dinheiro vem da tradição católica, mas acabou ganhando força no país por meio da política. Não houve investimento na educação. No lugar disso, o Brasil seguiu com ações paliativas e programas assistenciais para enfrentar suas mazelas. Mesmo sendo eles pouco ou nada eficazes.
O filósofo Immanuel Kant, falecido em 1808, era categórico quando o assunto era dar esmola. Segundo ele, ao dar dinheiro ao próximo você transfere a resolução de um problema público para a esfera particular.
Diz mais sobre quem dá do que quem recebe
Além disso, o pedido serve como fonte de vaidade para alguém que quer se sentir bom e magnânimo ao fazer a doação. Ao darem esmola, ganham o senso de ter praticado uma boa ação sem se submeter a uma obrigação de longo prazo ao outro.
Com o tempo, é possível perceber que esta ação não faz uma diferença efetiva na vida de quem a recebe. O fato de vivermos em sociedade já nos aponta a importância de ajudarmos uns aos outros. E como a nossa sociedade está estruturada deveria, pelo menos teoricamente, ajudar a todos a ter uma vida digna. Temos na nossa constituição federal a descrição do funcionamento da nossa Seguridade Social que garantiria formas de todos contribuírem de forma equânime e de todos serem beneficiados em caso de necessidades diversas.
Risco maior para as crianças
Especialistas acreditam que dar trocados alimenta a vida de crianças nas calçadas e contribui para a degradação da infância. Segundo eles, ao receberem o dinheiro, essas crianças tendem a se prender mais às ruas, onde estão expostas a riscos como drogas e violência.
Outro argumento usado é que a esmola atrapalha o trabalho de quem tenta tirar as crianças das calçadas, porque acabam ganhando mais dinheiro com as esmolas dadas nas ruas do que com a ajuda do governo, por exemplo.
Mudança vem com políticas públicas eficientes
Alguns profissionais acreditam que ter seus direitos assegurados em lei é muito diferente de receber esmola. Segundo eles, há um conceito chamado 'cidadania invertida' que consiste em se colocar exigências para receber benefícios sociais em que a pessoa precisa provar que está numa condição de 'não cidadão' para receber um benefício ou caridade. Para eles, dar esmola não é a melhor saída, e sim que o Estado seja o provedor das condições para que a pessoa tenha um mínimo social em casos de vulnerabilidade para se reerguer.
Para finalizar, aqueles que são contra dar esmola acreditam que melhor do que distribuir dinheiro na rua é discutir políticas públicas eficazes para a comunidade. Se é para fazer a diferença, pesquise em quem você votar, discuta política, mobilize-se. Estar em constante movimento ainda é a melhor maneira de ajudarmos uns aos outros.
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