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Cooperativa fundada por mulheres valoriza ingredientes do semiárido na BA

Fruto do sertão baiano, o umbu é usado para fazer doces, entre outros alimentos - Divulgação/ Coopercuc
Fruto do sertão baiano, o umbu é usado para fazer doces, entre outros alimentos Imagem: Divulgação/ Coopercuc

Lígia Nogueira

Colaboração para Ecoa, em São Paulo (SP)

27/01/2022 06h00

Filha de agricultores familiares, Denise Cardoso, 32 anos, nasceu na comunidade tradicional de Fundo de Pasto de Caladinho, no município de Curaçá (BA), e desde muito pequena acompanhou as ações comunitárias na região. Ela teve a oportunidade de observar de perto a criação, em 2004, da Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc), sediada no sertão da Bahia, que nasceu da união de algumas mulheres que desejavam organizar a produção e a comercialização dos alimentos que cultivavam.

No início, a produção do grupo era levada para feiras nos municípios vizinhos. Hoje, a organização se sustenta com a produção de doces e geleias que estão à venda em mercados do Brasil e de países europeus, como França e Alemanha, graças a iniciativas de desenvolvimento sustentável para o beneficiamento de frutas nativas da caatinga — como umbu e maracujá do mato — e outras espécies cultivadas na área, como goiaba, manga, acerola, banana e maracujá amarelo.

Naquela época, conta Denise, era comum todos se envolveram no trabalho e ela, aos 14 anos, já ajudava os pais nas atividades. Aos 18, se tornou cooperada da Coopercuc e presidente da associação da comunidade. "Diferentemente dos meus pais, tive a oportunidade de estudar, fiz graduação em administração e tive algumas experiências de trabalho em outros espaços", conta. "Tudo interligado com a valorização das famílias do semiárido e o fortalecimento das comunidades tradicionais."

Em 2016 ela foi convidada para fazer parte da direção e assumir a presidência da Coopercuc. "Um desafio grande, mas que me fez uma mulher mais forte e corajosa", analisa.

Acredito que o nosso semiárido é viável e que a força e o trabalho das mulheres caatingueiras nos fazem chegar mais perto de um mundo mais justo.

Denise Cardoso, presidenta da Coopercuc

Atualmente a Coopercuc atua junto a 270 cooperados nos municípios de Canudos, Uauá e Curaçá diretamente na produção, beneficiamento e comercialização de frutas nativas da caatinga como atividade principal. "Compreendendo que somos uma cooperativa de agricultores familiares, facilitamos aos cooperados o acesso a outros mercados e a diversas políticas públicas necessárias para o desenvolvimento das comunidades do semiárido", explica.

Além disso, conta Denise, a organização atua para potencializar e valorizar a participação das mulheres na liderança das instituições e também para reforçar a geração de renda necessária para o empoderamento feminino.

Frutas nativas da caatinga

"Hoje temos alguns projetos importantes para o desenvolvimento das nossas comunidades, mas o que de fato é considerado o nosso projeto principal é o beneficiamento de frutas nativas da caatinga, como o umbu e o maracujá da caatinga — antes totalmente desvalorizadas e que foram transformadas em produtos de excelência gastronômica com a participação e força das mulheres do semiárido."

Um dos projetos criados pela organização para as famílias cooperadas é o AgroCaatinga, que consiste na implementação de sistemas agroflorestais nas propriedades dos cooperados e que possibilita a recomposição do solo, da vegetação e, como resultado, o incremento da renda, uma vez que nestas áreas são produzidas algumas das frutas que são processadas na agroindústria da Coopercuc.

Reconhecimento

No final do ano passado, a Coopercuc participou da oitava rodada de empréstimo coletivo da SITAWI e concluiu a captação de R$ 100 mil em poucos dias. "Este empréstimo coletivo vai ajudar a cooperativa a desenvolver melhor as atividades com os cooperados, pois além de este recurso garantir a compra da matéria-prima e insumos para a produção, teremos o benefício social de agregação de renda às famílias da nossa região, e, com isso, será possível gerar mais desenvolvimento", diz Denise.

"Quando selecionamos um negócio para captar recursos em nossas rodadas de empréstimo coletivo, o primeiro aspecto que analisamos é a dimensão do impacto", diz Aline Decarli, coordenadora de investimento de impacto da SITAWI, organização sem fins lucrativos que mobiliza capital para impacto socioambiental positivo.

"A Coopercuc é uma cooperativa fundada por mulheres e que historicamente trabalha o empoderamento feminino. Além disso, está baseada em um bioma exclusivamente brasileiro, a caatinga. Acreditamos que mobilizar capital para uma iniciativa como esta apoia a preservação do território, a geração de emprego e renda e o protagonismo feminino."

Maria Laura Florido, analista de investimento de impacto da SITAWI, acrescenta: "Um dos grandes desafios de regiões que trabalham com safras é a atuação de atravessadores, que aproveitam a oportunidade para pagar à vista por grandes quantidades das frutas a preços abaixo do mercado. Neste contexto, entendemos que o capital de giro concedido para a Coopercuc através da nossa plataforma, com taxas mais baixas e condições mais flexíveis, traz competitividade na aquisição das frutas para a fabricação dos produtos por um preço justo. Isso gera sustentabilidade financeira para a cooperativa e renda para a população local."