É possível produzir alimento para o mundo de forma sustentável?
Quem vê um alimento preparado e posto à mesa pode esquecer todo o ciclo necessário para que ele chegue até os nossos pratos. Além de todo o trabalho logístico e braçal, há o protagonismo do solo, que recebe as sementes que darão lugar aos frutos e uma série de insumos que alimentam a grande e diversificada cadeia de alimentação humana. Mas será que é possível fazer todo esse trabalho recorrendo a sistemas alimentares regenerativos e que agridam menos a natureza?
No Brasil, o agronegócio representa uma significativa parcela do PIB, mas a atividade também é acusada de contribuir com o desmatamento de florestas e poluição de rios. Em contrapartida, especialistas acreditam que o aquecimento global e as mudanças climáticas poderão encolher a produção agrícola, sobretudo a de soja na América do Sul, e trarão consequências negativas para a segurança alimentar e nutricional de milhões de pessoas. As constatações são do último informe do IPCC sobre a produção de soja e agrícola na região.
Desse modo, um sistema que produz comida, mas que poupe ecossistemas e afete menos a natureza parece ser um caminho praticamente obrigatório para a humanidade.
Pensando nisso, Ecoa explica a seguir o que são e como funcionam sistemas alimentares regenerativos. Acompanhe a seguir.
O que são sistemas alimentares regenerativos?
"Um sistema regenerativo é aquele em que a saída [de recursos] do sistema é maior do que a entrada. Ou seja, ele provê mais do que se coloca nele. Sejam em serviços ecossistêmicos, em água, em fixação de carbono, em vida no solo ou em biomassa. Desse modo, sempre se regenera a área em que ele começou", explica Valter Ziantoni, engenheiro florestal pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) e mestre em Agrofloresta pela Bangor University (Inglaterra).
Ziantoni, que também é fundador do PRETATERRA, um hub de inteligência que cria estratégias para implementação de agroflorestas e sistemas alimentares regenerativos, explica que nos sistemas convencionais há uma degradação que exaure as áreas de produção.
"Se produz muito bem por alguns anos, mas com o tempo vai acontecendo um declínio até que não é possível produzir mais por exaustão dá água, nutrientes, carbono e de uma possível salinização do solo", aponta.
Por outro lado, nos sistemas alimentares regenerativos há uma lógica que caminha em conjunto com a natureza. "É uma 'agricultura da abundância', pois, em vez de tratar a natureza como inimiga e lutar contra, se usa a força da natureza a seu favor. É como utilizar a paisagem como um Feng Shui, onde tudo está harmônico. Assim, a natureza te ajuda à medida que você a ajuda", explica o engenheiro florestal para Ecoa.
Mas como funciona um sistema alimentar regenerativo na prática?
Na natureza, os alimentos nascem, crescem e dão frutos de maneira natural e respeitando ciclos. É dessa forma que um sistema alimentar regenerativo funciona na prática - e ainda respeitando a biodiversidade local, sejam de plantas, animais ou de outras características da região.
"Esses sistemas funcionam mimetizando a lógica das florestas, que têm milhões de anos de evolução. A produção segue uma sucessão natural em que uma espécie cresce e cria espaço, sombra e condições para que outra de um ciclo mais tardio venha", explica Ziantoni. "Dessa forma, se proporciona regeneração do solo e de vegetais dessas áreas."
Sistemas alimentares regenerativos ajudam contra o aquecimento global?
Para Ziantoni, romper com os sistemas de agricultura que temos hoje é essencial para o futuro. "Sistemas regenerativos são o futuro, pois a maior tecnologia para tirar carbono da atmosfera são as próprias árvores. E uma das melhores formas de colocar uma árvore na natureza são nesses sistemas agroflorestais", explica.
"Não haverá futuro se persistirmos fazendo agricultura como fazemos hoje - uma agricultura que enxerga o solo como um insumo e o trata como substrato, desconsiderando que é um organismo vivo. Desse modo, ela acaba o matando, desertificando o planeta e criando alimentos de forma não sustentável", completa.
O engenheiro acrescenta que não é preciso separar terra agrícola de florestas. "Temos condições de fazer isso em harmonia, com corredores de fauna. De outro modo, grandes cidades perderão a capacidade de produzir alimentos e caminharemos para uma catástrofe ambiental. Vamos ficar à mercê do clima, que já está cobrando o seu preço", alerta.
Viver perto de uma agrofloresta também pode significar estar protegido de alguns eventos climáticos extremos, de acordo com o especialista. "Se um sistema imita a floresta, ele será resiliente a todos esses eventos. Pois atuam no que chamamos de microclima, melhorando a nutrição e umidade do solo, fazendo com que sejam um ambiente mais protegido e que não irá se desertificar", explica.
Ziantoni defende ainda que a aplicação de sistemas regenerativos pode ser feita em qualquer local do planeta: "Basta conseguir criar biomassa e colocar as primeiras plantas que suportem as condições. É possível criar em casas, parques e canteiros. Inclusive, a arborização das cidades pode ser com árvores de frutos comestíveis. É preciso que seja uma construção de forma coletiva", finaliza.
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