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Projeto dá cursos de tecnologia e conecta jovens da periferia com empresas

Formatura de alunos do Prototipando a Quebrada (PAQ) - Ângela Reck
Formatura de alunos do Prototipando a Quebrada (PAQ) Imagem: Ângela Reck

Aline Takashima

Colaboração para Ecoa, de Florianópolis (SC)

22/03/2022 06h00

Ter um diploma universitário e trabalhar com tecnologia nunca passou pela cabeça de Jefferson Lima, 38 anos. Mas foi o que ele conquistou. Ele cresceu na comunidade da Cachoeira, zona norte de São Paulo, e foi o primeiro da família a ser aprovado em uma universidade. "A educação é a ferramenta que me permite olhar para um universo muito diferente das paredes sem reboco na quebrada onde cresci."

A sua vida mudou por meio da educação. Hoje, Jefferson faz questão de transformar os jovens das periferias que têm histórias parecidas com a sua. Em 2018, criou o Prototipando a Quebrada (PAQ), um projeto de educação tecnológica para os adolescentes das comunidades da Grande Florianópolis, onde mora hoje.

O programa existe há 3 anos, mas a relação do educador com o universo da tecnologia começou bem antes. É que, antes de concluir uma graduação e mestrado em História, ele fez um curso técnico em Informática aos 15 anos. Após terminar o mestrado, deu aulas de robótica em uma escola na comunidade do Monte Serrat, em Florianópolis. "As oficinas encantavam os alunos."

Foi então que decidiu compartilhar o conhecimento. Em 2018, ganhou um kit de robótica e criou uma oficina de tecnologia nas comunidades de Florianópolis — o PAQ. Com um computador velho, ensinou 40 estudantes. "Apesar da experiência ser legal, eu descobri que, na verdade, os alunos estavam brincando de aprender. O kit para 5 pessoas estava sendo compartilhado com 40."

Jefferson deu uma pausa nas oficinas e reestruturou o programa. Deu certo: por meio de editais de empresas de tecnologia e parcerias com instituições, o PAQ atendeu mais de 150 estudantes em 2021.

Jovens da periferia na Ilha do Silício

O projeto que começou com aulas de robótica se transformou em cursos para aproximar os jovens da periferia do mercado de tecnologia. "Nós percebemos que os adolescentes aprendiam programação, mas não iam trabalhar na área", lamenta Jefferson. "O mercado de trabalho absorvia o aprendiz para trabalhar em um comércio. Quem perdia era o setor de tecnologia."

Jefferson Lima faz questão de transformar os jovens das periferias que têm histórias parecidas com a sua - Ângela Reck - Ângela Reck
Jefferson Lima faz questão de transformar os jovens das periferias que têm histórias parecidas com a sua
Imagem: Ângela Reck

Mas não há motivo para os jovens qualificados não trabalharem na área — o que sobra em Florianópolis são vagas no setor de tecnologia. A capital de Santa Catarina ficou conhecida nos últimos anos como "Ilha do Silício brasileira". A Grande Florianópolis reúne quase 4 mil empresas de tecnologia que possuem um faturamento de R$ 10 bilhões por ano, segundo dados da Acate (Associação Catarinense de Tecnologia).

É por isso que, desde o ano passado, o Prototipando a Quebrada conecta os adolescentes das comunidades com as empresas de tecnologia. Três jovens do PAQ já foram contratados e mais cinco vagas serão preenchidas em uma empresa de programação em Florianópolis.

Primeiro emprego com carteira assinada

O sonho de Bruno Capistrano, 17 anos, era trabalhar em uma startup. "Eu pensava em trabalhar em uma empresa onde pudesse crescer e aprender rápido. Mas nunca achei que eles contratariam um aprendiz."

Há alguns meses, Bruno conquistou o primeiro emprego com carteira assinada. É auxiliar administrativo em uma startup de inteligência artificial. Nas horas vagas, estuda programação.

Morador do município de Palhoça, na Grande Florianópolis, ele participou da primeira turma de Imersão do PAQ, no ano passado. O programa gratuito de 8 semanas dá uma base sobre o universo da tecnologia e o mercado de trabalho para estudantes de 14 a 18 anos. Além de apresentar o setor de inovação, ensina ferramentas de organização e desenvolve habilidades interpessoais.

Em março, Bruno começou um segundo curso do PAQ, de Aceleração. É um programa de 1 ano e meio para quem realizou o curso de Imersão e deseja aprender programação e design.

As oficinas acontecem em meio a paredes de vidros e pufes coloridos, em um "ambiente Google", conta Jefferson. "Tem uma jovem que mora com 8 pessoas em dois cômodos. Como ela vai estudar? A gente garante um espaço de qualidade para os alunos se desenvolverem", ressalta.

"Borogodó da Quebrada"

A aluna Kailany do Carmo - Ângela Reck - Ângela Reck
A aluna Kailany do Carmo
Imagem: Ângela Reck

Qual o diferencial de um jovem da periferia quando entra no mercado de trabalho? Jefferson argumenta que os alunos das comunidades têm o tal do "borogodó da quebrada", como define. "Temos que ser muito criativos e desenvoltos desde muito cedo."

É o caso da estudante Kailany Vitória do Carmo, 17 anos. Ela participou do curso de Imersão no ano passado. E, atualmente, desenvolve identidade visual para pequenos comerciantes na comunidade onde mora, na Palhoça. "É um treino para criar coisas maiores no futuro", diz.

Em março, ela iniciou o curso de Aceleração para aprofundar o seu conhecimento em design. Mas afirma que já aprendeu mais do que esperava. "O PAQ não é somente um projeto de tecnologia. Aqui a gente convive com uma diversidade de pessoas e de personalidades. Aprendi a ter empatia e a respeitar as opiniões de cada um."