Conta de luz em escola rural no PI cai de R$ 1800 a R$ 160 com placa solar
Quando os pesquisadores da Universidade Federal do Piauí (UFPI) visitaram a Escola Municipal do Contentamento, localizada na zona rural de Oeiras, a primeira capital do Piauí, encontraram um estabelecimento de ensino amigo do meio ambiente.
No espaço existe, por exemplo, um sistema que capta água dos bebedouros para ser reutilizada na limpeza ou na rega da horta, que produz alimentos para a merenda escolar. Há também cestos de coleta seletiva de lixo — tanto dentro quanto fora da escola, para servir a comunidade — e "dispensers" de álcool em gel feitos de bambu, importantes no enfrentamento da covid-19.
Tudo isso, acredita a pedagoga Constância de Oliveira, gestora da escola desde 2019, somado às condições técnicas favoráveis, contribuiu para que a UFPI batesse o martelo e escolhesse a Contentamento como a primeira escola rural do Piauí a ter placas de energia solar, por meio do projeto Escolas Solares.
Constância lembra de cor todas as datas que fizeram parte da implementação do projeto: a referida visita, a primeira vistoria dos engenheiros da empresa que instalou o sistema, o primeiro dia de funcionamento das placas, em janeiro de 2021, e do dia seguinte, quando os técnicos fizeram uma capacitação para docentes, gestores da Secretaria de Educação e representantes da UFPI sobre como o sistema trabalha para transformar a luz do sol em energia.
Pudera. Em uma localidade onde grande parte dos habitantes dependem do solo para tirar seu sustento —, na lavoura da zona rural de Oeiras, planta-se milho, arroz, mandioca, feijão, fava e hortaliças —, todos sabem o quanto é importante preservar o meio ambiente.
"Em casa, a família precisa trabalhar a questão da sustentabilidade. Mas, na escola, nós também precisamos estar atentos a essa questão. Se o aluno tem boas práticas, ele leva essa sementinha para outras pessoas. Ele aprende e multiplica", afirma Constância, habilitada para dar aulas de matemática e ciências da natureza.
E os professores da Contentamento aproveitaram ao máximo a instalação do sistema de energia solar, cujos benefícios ultrapassaram a questão meramente financeira — no primeiro mês, a conta de energia caiu de R$ 1.800 para R$ 160, diferença que entra na conta da Secretaria Municipal de Educação, não da escola em si.
A presença das 22 placas, que passaram a fazer parte da paisagem da escola, inspiraram os docentes a implementar propostas pedagógicas sobre o tema. O medidor, instalado no pátio, aos olhos de todos, ajudou no sentimento de que aquele era um projeto coletivo.
Inspirado pela instalação do sistema, o Projeto de Educação Ambiental e Saúde, que ocorre anualmente nas escolas de Oeiras, ganhou o tema de Sol e Luz no Sertão. De maneira remota, em função da pandemia, em aulas pela internet, material impresso ou rádio, todos os 300 alunos dos ensinos infantil e fundamental prepararam trabalhos para o 5º Seminário de Educação Ambiental e Saúde, em junho de 2021.
Cordéis, textos, telejornais, paródias, desenhos e dramatizações foram apresentados — até para escolas da zona urbana. Um professor demonstrou aos alunos, por meio de um experimento, por que as placas de captação precisam ser de cor escura. A UFPI produziu um gibi chamado "Amigo Solar". "Agora, temos, dentro da escola, um laboratório de estudo para que o aluno veja na prática o que é ensinado na sala de aula. Somos testemunha que a sustentabilidade é possível. Vivenciamos isso. Os alunos mostraram satisfação com o sistema em seus trabalhos", afirma a professora Constância.
O responsável pela implementação do projeto Escola Solares é o professor e pesquisador da Universidade Federal do Piauí Marcos Lira, 42. Nascido em Miguel Alves, no interior do Piauí, e criado em Teresina, Lira começou suas pesquisas com energia solar em 2012, quando percebeu que seu estado, apesar de ter o maior índice de radiação solar no Brasil, pouco tratava da questão.
O ano é o mesmo em que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) publicou uma resolução normativa com regras para a autogeração de energia elétrica no país.
O sistema na escola custou R$ 40 mil. "Ele tem uma vida útil de 25 anos. Se a redução na conta de energia foi de R$ 1 mil por mês, em 3 anos e meio, você já recuperou o investimento e depois pode usufruir dele por mais de 20 anos", explica o professor, para demonstrar que projetos assim são viáveis. A UFPI oferece a manutenção do equipamento.
Antes do Escolas Solares, Lira participou da implementação de bombas para retirar água de poços do tipo cacimbão (escavado em pequena profundidade) no semiárido piauiense. "Aqui, temos um bom lençol freático e essa possibilidade de energia gerada pelo sol. Por que não unir os dois para atender as comunidades?", diz Lira, sobre como o projeto nasceu.
Ao todo, dez comunidades, em dez diferentes municípios, ganharam bombas movidas a energia solar. A iniciativa privilegia famílias que usam a água para a agricultura familiar. Os moradores foram capacitados para mexer no sistema, que tem capacidade para drenar 5 mil litros de água por dia.
"Houve um ganho econômico, já que, produzindo mais, eles podem comercializar os alimentos. Do ponto de vista ambiental, é uma energia limpa. Pela questão social, o projeto ofereceu um certo conforto a essas pessoas, liberando-as do trabalho braçal, já que a água cai direto na caixa d'água. O sol que castiga é o mesmo que possibilita a geração de energia."
Em 2019, esse projeto foi premiado pela ONU como uma das experiências mais exitosas do Piauí. A premiação, no valor de R$ 100 mil, foi destinada a instalação de outros 10 novos sistemas. Atualmente, há 20 sistemas funcionando que beneficiam 90 famílias.
Entre os novos projetos de Lira está um, recém-aprovado em um edital, em parceria com a Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco), para a instalação de um sistema de energia solar flutuante na Usina de Boa Esperança, que fica 400 km distante de Teresina.
As placas — 4.500 ao todo — serão implementadas no reservatório, uma espécie de espelho d'água. O objetivo é gerar energia paralela à produzida pela hidrelétrica para beneficiar a população ribeirinha que trabalha com pesca e agricultura familiar.
"Será um marco importante na história da energia do Piauí e para pesquisa acadêmica. Além disso, o projeto tem um aspecto turístico, já que estará aberto à visitação, como ocorre em Itaipu e Sobradinho", afirma Lira, que assumiu há pouco o cargo de diretor do Centro de Tecnologia da UFPI.
Lira acredita que durante muito tempo faltaram políticas públicas para que o Brasil embarcasse de vez na energia solar. Apesar dos avanços, continua sendo uma tecnologia cara.
De acordo com o pesquisador, para se instalar um sistema residencial, o custo é, no mínimo, de R$ 25 mil — os equipamentos são importados, e a carga tributária é alta. Com isso, o acesso é restrito, sobretudo para famílias de baixa renda.
"A tendência da energia elétrica é só aumentar. Enquanto tem gente preocupada em expandir a energia solar, do outro lado, tem gente interessada em retrair. As concessionárias de energia não têm interesse em perder receita. Quem coloca energia solar em casa, está deixando de comprar delas", afirma.
Pelo lado ambiental, o pesquisador diz que a energia limpa e renovável é a "agenda do dia". Lira lembra que a Agenda 2030, um plano de ação global que reúne 17 objetivos de desenvolvimento sustentável, que traz entre eles a necessidade de assegurar o acesso à energia renovável a um preço acessível.
"Quando eu invisto em energia sustentável, seja ela solar ou eólica, eu estou adiando a construção de uma nova hidro e termoelétrica. A crise hídrica do ano passado aqui no Brasil ocorreu por falta de planejamento. Parece de propósito, só para ter que acionar uma termoelétrica e alguém ganhar com isso."
Esta reportagem foi desenvolvida em parceria com a Republica.org, organização social apartidária e não corporativa que se dedica a contribuir para a melhoria do serviço público no Brasil, em todas as esferas de governo.
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