R$ 5,4 bi sem desmatar: Brasil pode fazer economia crescer de forma verde?
Desmatamento, mineração, monocultura: para muitos, é este tipo de atividade que gera riqueza e desenvolvimento para o Brasil. Mas, segundo especialistas, na realidade, este modelo econômico consome a natureza e coloca em risco a própria capacidade de a humanidade atingir suas aspirações.
"É uma visão equivocada pelo menos desde os anos 1960, quando surgem as primeiras evidências de que as atividades transformadoras dos recursos naturais provocam efeitos colaterais para a qualidade de vida das pessoas. Um modelo de desenvolvimento que esgota seus recursos ambientais e deixa de fora um contingente imenso não só é desumano e injusto, mas é um onde o conflito, a incerteza e a escassez são permanentes", avalia Carolina Derivi, gestora de projetos do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (FGVces).
Entendendo que isso gerava desigualdades sociais e desequilíbrio do clima e da biodiversidade, o mundo propôs um modelo de desenvolvimento que fosse sustentável e benéfico para o meio ambiente e as populações. Mas você sabe o que isso significa e quais os caminhos para atingír este tipo de desenvolvimento? Ecoa te explica:
O que é desenvolvimento sustentável?
A definição mais consagrada é a da Organização das Nações Unidas, que diz que este é um modelo que procura "satisfazer as necessidades presentes sem comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades". Ela aparece no relatório "Nosso Futuro Comum", de 1987.
No entanto, a ideia de desenvolvimento sustentável foi transformada desde então para incluir "as pautas [de] direitos humanos [e] vulnerabilidades sociais", comenta Carolina. "É um campo dinâmico, que está sempre se atualizando e absorvendo novas tendências", diz.
Como esse termo surgiu no debate público?
Quem primeiro trouxe a ideia de um desenvolvimento aliado à sustentabilidade foi o Clube de Roma, um grupo de intelectuais que, no começo dos anos 1970, mostrou como a falta de manejo e proteção adequada dos recursos naturais colocava em xeque a perspectiva de uma prosperidade econômica infinita.
Daí em diante, a comunidade internacional passou a discutir a ligação entre as dimensões econômica, ecológica e social e como distribuir as responsabilidades e soluções entre os mais pobres e os mais ricos de maneira justa.
O Brasil dialoga com essas questões desde o começo, dizendo já na Constituição Federal de 1988 que o meio ambiente sadio e equilibrado é um direito de todos. "Também coloca [o meio ambiente] como um componente fundamental da ordem econômica e, pela primeira vez, a responsabilidade do Estado em proteger a qualidade ambiental", aponta Carolina.
O que são os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável?
São 17 pontos que precisam ser atingidos para que o mundo seja mais justo e sustentável. Parte da Agenda 2030 da ONU, um plano global para garantir paz e prosperidade para todos, eles incluem não só a proteção dos ecossistemas, mas também objetivos relacionados ao bem-estar humano, como a erradicação da pobreza, a fome zero e a igualdade de gênero.
Economia da sociobiodiversidade como caminho
No Brasil, não se pode falar de desenvolvimento sustentável sem considerar seu patrimônio ambiental, rica biodiversidade e suas populações e comunidades tradicionais. É aí que entra a economia da sociobiodiversidade.
Na contramão de um modelo que consome a floresta e expulsa comunidades locais, essa economia gera bens e serviços a partir da biodiversidade brasileira, ao mesmo tempo em que assegura os direitos sociais, econômicos, culturais e territoriais de povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas e extrativistas.
Este guarda-chuva contempla atividades como o turismo sustentável, a coleta e venda de sementes florestais para restauração de áreas degradadas e o extrativismo de produtos florestais não-madeireiros, como o pequi, o coco-babaçu e o açaí.
"É uma economia da vida, da atenção para as pessoas e para a natureza, e também para a geração de renda e segurança alimentar", avalia Guilherme Eidt, assessor de políticas públicas do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).
Um levantamento do Instituto Socioambiental apontou que a comercialização de produtos in natura não-madeireiros movimentaram mais de R$1,6 bilhão em 2018. Outro estudo da The Nature Conservancy Brasil sobre as cadeias de 30 produtos no Pará mostrou que estas geraram uma renda total de R$ 5,4 bilhões e cerca de 224 mil empregos em 2019.
Ainda assim, segundo Guilherme, essas cadeias produtivas podem e devem ser mais incentivadas. Isto passa por políticas públicas que levem os produtos da floresta aos mercados institucionais, como as merendas escolares, e capacitem os extrativistas a acessarem diferentes mercados e instalarem empreendimentos de beneficiamento nas suas comunidades.
"[Estima-se] que cerca de 60 mil reais por família podem ser acessados através dos mercados institucionais. Recursos que ficam nos próprios municípios, dinamizando a economia local", ele comenta.
Ele cita, por exemplo, o Projeto de Lei 1.970/2019, que institui a política nacional para o manejo, extração e comercialização de produtos nativos do Cerrado, e o Projeto de Lei 6.079/2019, que cria uma política de incentivo ao agroextrativismo familiar na Amazônia. E reforça a necessidade de a sociedade civil fazer o acompanhamento dessas políticas e dialogar sobre a importância de uma economia pautada nas pessoas e na biodiversidade.
"O meio ambiente só é conservado porque as comunidades tradicionais e os agricultores familiares usufruem dos recursos naturais de forma sustentável", diz Guilherme. "[É o que] permite que serviços ecossistêmicos continuem provendo a vida e a oportunidade de geração de renda não só para esses territórios, mas também para o agronegócio, que precisa da chuva e de uma regulação climática".
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