Luiz Gama: advogado que libertou escravizados nomeia prêmio criado por Lula
Luiz Gama dá nome ao Prêmio Luiz Gama de Direitos Humanos, instituído pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que revogou a "Ordem de Mérito Princesa Isabel", criada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em dezembro do ano passado.
A decisão foi publicada em 31 de março no DOU (Diário Oficial da União), e determina que a homenagem seja concedida a "pessoas físicas ou jurídicas" cujos trabalhos ou ações "mereçam destaque especial nas áreas de promoção e de defesa dos direitos humanos no País".
O prêmio será entregue bienalmente em anos pares, segundo o decreto. "Não se trata de afirmar que uma pessoa branca não possa integrar a luta antirracista, mas de reafirmar o símbolo vital que envolve essa substituição: o reconhecimento de um homem negro abolicionista enquanto defensor dos direitos humanos", Rita Oliveira, secretária-executiva do MDHC
Considerado um dos maiores abolicionistas, tendo dedicado a vida não só a luta pela libertação de negros e negras, como pelo fim absoluto da escravidão, o legado deixado por Gama hoje é um farol a ser seguido.
Hoje, Ecoa separou curiosidades sobre esta figura histórica para você conhecer um pouco mais quem era Luiz Gama:
Quem foi Luiz Gama, e qual a sua história?
Há mais de 140 anos, o Brasil perdia um dos maiores defensores da liberdade que o país já conheceu. "Jamais esta capital [São Paulo], quiçá muitas outras, viu mais imponente e espontânea manifestação de dor e profunda saudade de uma população inteira para com um cidadão", escrevia o jornal A Província de São Paulo, dando dimensão do tamanho da perda.
Era Luiz Gonzaga Pinto da Gama (21/06/1830 - 24/08/1882), mais conhecido como Luiz Gama: o menino que só aprendeu a ler e escrever aos 17 anos; que nasceu livre e foi vendido como escravizado pelo próprio pai; um importante jornalista e escritor de muitos artigos, poemas e livros celebrando sua cor e denunciando o racismo que tantos sofriam por causa dela e o advogado que aprendeu sobre as leis sozinho e ajudou a libertar mais de 500 pessoas negras escravizadas.
Luiz Gama aprendeu sozinho sobre advocacia?
Luiz Gama nasceu em Salvador, no ano de 1830. Era filho de um português branco e rico e de uma ex-escravizada que àquela época já estava livre. Pela lei, filho de mãe livre, também era livre, mas aos 10 anos, seu pai o vendeu como escravizado.
Assim, Gama veio parar em São Paulo, onde permaneceu nessas condições até os 18 anos, quando conseguiu reunir provas de que era ilegal mantê-lo como escravizado. Então, fugiu.
Um ano antes da fuga, aprendeu a ler e escrever, a partir desse momento se tornou um estudioso das letras. E em 1850 decidiu se candidatar ao curso de Direito do Largo de São Francisco - sendo recusado por ser negro. Mesmo assim, estudioso que era, aprendeu sozinho a advogar.
Legalmente, libertou mais de 500 escravizados
Um de seus feitos mais marcantes e importantes para a história foi o uso da advocacia para ajudar na libertação de pessoas escravizadas. Em uma época em que a escravidão já estava abolida em outros países, o Brasil até dava sinais de que começaria a mudar com a proibição do tráfico transatlântico, mas a verdade era que, por baixo dos tapetes, milhares de negros africanos continuavam sendo sequestrados e trazidos a força para serem escravizados aqui - o que já era ilegal até para a época.
Luiz Gama, no entanto, estava atento e disposto a reverter esse cenário. Em uma das descobertas mais recentes, feita pelo historiador Bruno Rodrigues de Lima, é possível ver essa movimentação.
O ano era 1869, Luiz Gama folheava um jornal quando se deparou com a notícia da morte de um senhor de escravos em Santos (SP), que deixava explícito em seu testamento a vontade de libertar todos após sua morte. Gama logo foi atrás de descobrir se isto havia acontecido, e só parou quando todos estavam libertos de fato, após uma briga na justiça. Mas a Justiça falhou com Gama e os escravizados: as 217 pessoas foram forçadas a mais 12 anos de trabalho escravo antes de serem realmente livres.
Ao que se sabe, foram no mínimo 500 pessoas libertadas por ações de Luiz Gama. Mas a verdade é que este número pode ser ainda maior, já que o Tribunal de Justiça de São Paulo apresenta uma centena de processos com seu nome.
"Uma coisa que ele fez foi desenterrar a bendita lei de 1831 [Lei Feijó, que proibia a importação de escravos para o Brasil], colocando na cabeça dos outros. Ele era um defensor dos direitos. Dizia ?nós temos leis?. Pedia que as leis existentes fossem aplicadas. Então ele puxava as leis e pegava no pé dos juízes, lembrando que ele mesmo era filho de uma africana, que ele mesmo tinha sido escravizado. Ele sabia o que era ser africano. O que era ser escravo. Ele mexeu no vespeiro."
Ligia Fonseca Ferreira, professora e pesquisadora
Foi a primeira pessoa negra a ter estátua em SP
Mesmo com tanta luta pela liberdade, Luiz Gama não viveu para ver a escravidão ser abolida oficialmente no país, em 1888. Morreu em um 24 de agosto como hoje, em 1882.
O reconhecimento de seu legado, apesar de importantíssimo para a história do Brasil, para a abolição da escravidão e para a construção da autoestima do povo negro no país, demorou para chegar.
Só em 2017 a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco o homenageou dando seu nome a uma sala e dois anos antes, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), concedeu o título de advogado a Luiz Gama.
Ele também foi a primeira pessoa negra a ter uma estátua na cidade de São Paulo. Em 1931, foi inaugurado um busto do advogado no Largo do Arouche, centro da cidade.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.