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Curso prepara LGBTs para o vestibular e foca em 'aliança' pela educação

Cursinho TRANSformação - Reprodução/Facebook
Cursinho TRANSformação Imagem: Reprodução/Facebook

Jr. Bellé

Colaboração para Ecoa, em São Paulo (SP)

08/10/2022 06h00

No centro da cidade de São Paulo, região bastante povoada por pessoas trans, existe um cursinho popular que, desde 2015, oferece ensino, apoio e acolhimento para essa população que está às margens do sistema educacional do país.

O Cursinho Popular TRANSformação foi criado após um evento sobre Educação Popular na PUC-SP, pelo professor de história e filosofia Marcel Cabral Couto.

"Nesse encontro, constatou-se que a população LGBTQIA+ tem uma grande dificuldade de acesso à educação, e notadamente ainda mais as pessoas trans. Fez-se então um chamamento para quem quisesse dar forma a esse cursinho. Eu fui um dos que atendeu ao chamado e estou até hoje. Porque se você pega os dados de acesso dessa população à educação, percebe que é muito baixo", conta o professor.

Marcel tem razão. Em 2016, a Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) estimou que 82% das pessoas trans e travestis tinham abandonado os estudos ainda na Educação Básica. No ano seguinte, a Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil complementou o dado: 82% das pessoas trans deixam o Ensino Médio entre os 14 e os 18 anos.

Além disso, segundo a quinta Pesquisa Nacional do Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação das Instituições Federais, organizada pela Andifes, apenas 0,3% dos estudantes matriculados em universidades federais são pessoas transsexuais.

Aliança entre trans e cisgêneros pela educação

Marcel explica que a proposta do cursinho é ser um pacto, "uma aliança entre pessoas trans e cisgêneras em prol de uma educação popular para a população trans e não-binária".

No começo, a maior parte das alunas eram travestis com pouco ou nenhum histórico escolar, portanto o foco era a alfabetização com vistas ao Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e ao Encceja (O Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos), que garantiam diploma de ensino médio.

"Depois percebemos que o cursinho era muito mais do que isso, era um espaço de sociabilidade, segurança e afeto", explica.

Hoje o perfil de alunos mudou, há muitas pessoas não-binárias, com ensino médio completo ou em andamento, que possuem alguma militância e acesso a conquistas históricas.

Para 2022, foram 30 alunos inscritos, 15 manifestaram interesse e entre 6 e 10 comparecem regularmente às aulas.

O professor João Batista de Macedo Júnior, responsável pelo núcleo de trabalhos do corpo, pontua que as turmas contam com alunos de diferentes níveis de instrução: há quem tenha dificuldade para ler e quem já esteja mirando o vestibular.

Transformação - Divulgação - Divulgação
Além de preparar para o Enem e vestibulares, o cursinho é um espaço de sociabilidade, segurança e afeto
Imagem: Divulgação

No entanto, ele percebe que o cursinho cumpre três funções essenciais: permitir que as pessoas convivam e achem seus pares; descubram o que estudar e onde estudar; e também fazer uma revisão forte nos conteúdos básicos.

Essa mesma percepção tem Cristal Perroni Brandão, 19 anos, aluna trans do cursinho desde maio de 2022. "Procurei porque sabia que era um lugar onde eu me sentiria acolhida e respeitada", relata.

Ela conta que frequenta as aulas para se preparar para o Enem e outros vestibulares, que pretende cursar Publicidade e Propaganda e futuramente Sociologia.

Espaço de segurança

Para Cristal, o cursinho é um espaço de segurança e empatia, voltado para uma população excluída e marginalizada pela sociedade, com poucas oportunidades. "Estar num lugar tão acolhedor, onde podemos ser quem somos, é gratificante. É um cursinho que nos prepara para além de vestibulares, nos prepara para a vida. O cursinho me influenciou a acreditar em mim mesma, acreditar que posso entrar numa universidade, me formar e ter uma carreira de sucesso", conta.

Atualmente o TRANSformação conta com 10 professores e mais dois colaboradores, e se mantém pro meio de editais, doações, parcerias e o suor dos voluntários. Outro apoio importante é o da associação Ação Educativa, como explica Marcel:

"Eles nos oferecem um espaço privilegiado. A gente tem que arcar com a alimentação e o transporte dos alunos. Como é um cursinho popular, com voluntários, a gente tenta viabilizar isso de várias formas".

Para conhecer mais, acesse o perfil do cursinho no Instagram.