Topo

Venezuela cria 1ª escola de reciclagem e tira 130 toneladas de lixo da rua

Catadores da Escola de Reciclagem recolhem os lixos das ruas - Divulgação
Catadores da Escola de Reciclagem recolhem os lixos das ruas Imagem: Divulgação

Munah Malek

Colaboração para Ecoa, da Colômbia

25/10/2022 06h00

San Cristóbal, capital do estado de Táchira, fica a pouco mais de uma hora de distância da fronteira com o país vizinho, a Colômbia. São 241 km² localizados no início da Cordilheira dos Andes venezuelana circundada pelos parques nacionais de General Juan Pablo Peraloga e El Tamá.

A região, que é a oitava mais populosa da Venezuela (com cerca de 300 mil habitantes), é também a segunda área metropolitana com a menor taxa de pobreza no ranking nacional.

Reconhecida pela cordialidade de seu povo e sua qualidade em educação universitária, a cidade transfronteiriça viu nascer, mesmo em meio a uma crise sanitária mundial, a primeira Escola de Reciclagem da Venezuela.

Criada em maio de 2019, o projeto é da empresa privada Andes Plast Recicla e foi impulsionado por um grupo de três engenheiros e uma arquiteta. Em novembro de 2021 iniciaram um plano piloto em uma das principais avenidas da cidade, a Avenida Carabobo, e desde então têm estendido sua atuação por outros bairros e localidades.

Apesar de trazer nome "escola", essa não é uma escola tradicional. São oferecidos cursos de duração aproximada de três semanas para interessados em aprender sobre reciclagem. Prestam também consultoria na área de reciclagem para outras cidades dentro e fora da Venezuela, desenvolvendo modelos de manejo e reaproveitamento dos recursos sólidos.

O objetivo principal é ensinar aos munícipes como separar o lixo que pode ser reciclado e/ou reutilizado, e assim gerar um impacto positivo para o meio ambiente e, consequentemente, beneficiar a cidade. O modelo proposto integra todos os setores de San Cristóbal em torno dos pressupostos da economia circular: privado, público (governo regional e municipal), universidades e comunidades.

"Quase todos os membros da diretoria são além de engenheiros, professores universitários, ou seja, é um grupo que acredita que pela educação podemos transformar as cidades em um grande ecossistema sustentável, começando pela nossa. Nosso principal horizonte é nunca subestimar a capacidade das pessoas de aprender, de mudar. E, por isso, somos, desde o nome, uma escola", explica o engenheiro ambiental e diretor geral da Escola de Reciclagem Ronny Chacón, em entrevista a Ecoa.

Escola de Reciclagem na Venezuela - Divulgação - Divulgação
Escola de Reciclagem na Venezuela
Imagem: Divulgação

O primeiro passo que deram em direção a criar a Escola de Reciclagem foi analisar o comportamento das pessoas em relação ao manejo dos resíduos sólidos em San Cristóbal. Foram 14 meses estudando o comportamento local.

"Não adiantava seguir importando modelos do exterior sem entender o nosso próprio perfil. O que constatamos é que as pessoas não sabiam nem empacotar corretamente seu lixo e nem separá-lo", conta.

Com a análise conseguiram identificar que a coleta de lixo da prefeitura costumava demorar muito em cada localidade para conseguir fazer o recolhimento completo do lixo.

Assim, a escola desenhou e desenvolveu suas próprias lixeiras - hoje são 90 contentores de lixo, 45 deles de reciclagem, espalhados pela cidade - e apostou em uma série de informativos bastante visuais sobre como empacotar o lixo de forma adequada.

Mais tarde, o convênio com a prefeitura local selou a parceria em prol de tornar San Cristóbal uma cidade inovadora, limpa e sustentável.

A prefeitura confiou nas ideias e dados apresentados pela Escola de Reciclagem e reformulou as rotas de coleta, reduzindo as viagens do caminhão de lixo de 18 para 4 por semana, sem que a cidade perdesse com isso.

"Acreditamos na reciclagem integral como uma política pública e, portanto, que deveria ser abraçada pela prefeitura. Felizmente a parceria deu certo e se ampliou também para as Universidades. Apostamos em fomentar uma política de bem-estar individual e coletiva que começa na cabeça das pessoas e chega em toda a comunidade", diz Ronny.

Na usina de reciclagem da Escola, todo o processo de tratamento de plásticos é garantido - material no qual eles focam agora - para que garrafas e sacolas sejam coletadas, processadas e, assim, conseguem gerar matéria-prima para outros novos produtos.

A Escola recebe outros tipos de materiais, como papel, papelão, vidro e alumínio na rede de lixeiras que têm na cidade, mas apenas processam o plástico. Os outros materiais são encaminhados para outras empresas de reciclagem.

Para se ter ideia do tamanho das ações, só este ano, desde março, 131 toneladas de lixo foram coletadas e recicladas pela empresa.

Escola de Reciclagem - Divulgação - Divulgação
Escola de Reciclagem
Imagem: Divulgação

Ronny garante que terem apostado no sucesso da economia circular, ou seja, na produção e no consumo responsáveis, foi a melhor escolha para toda a cidade, uma vez que não apenas tornou o lugar mais limpo, como otimizou o uso dos recursos financeiros que eram desperdiçados com as muitas viagens dos caminhões de coleta e lixo.

"Hoje, aqui na cidade não usamos mais materiais virgens para as sacolas plásticas que circulam, todo nosso ciclo de sacolas na cidade é renovável. Além disso, a moda ecológica fez tanto sucesso e a prefeitura teve uma economia tão boa que estamos agora na fase de pensar e executar projetos de agricultura urbana e a criação de bosques para captação de CO2. Queremos ser completamente ecológicos e sustentáveis", diz ele.

Após a criação do projeto, o município até mudou seu slogan de "Cidade de Gente Gentil" para "San Cristóbal, Cidade Ecológica", e ultrapassou a meta nacional de reciclagem da Venezuela.

A Escola de Reciclagem faz tanto sucesso que foi até mesmo procurada pelo órgão nacional para que o ajudasse a desenvolver os sistemas sustentáveis de reciclagem em outras cidades do país.

A iniciativa, que no primeiro mês de operação contava com oito pessoas na área de produção, atualmente gera emprego para 45 trabalhadores, conta com serviço de lavagem das lixeiras que é feito à moto, serviços de reparação e manutenção das mesmas e pretende ampliar em até cinco vezes mais os locais de depósito de lixo (chegando à 500 lixeiras), além de gerar mais integração entre os sistemas de coleta e melhorar o monitoramento e geração de dados com uso de tecnologia.

"Foi preciso para nós - e ainda é - criar credibilidade e confiança na coleta de recicláveis, não subestimar a capacidade das pessoas em aprender e ter sempre como horizonte que vendemos um produto, mas também nos beneficiamos dele, o benefício final é nossa cidade, a cidade na qual vivemos", finaliza Ronny.