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'Pegava água da lona': cisterna premiada do MTST vira 'santa' solução em SP

Marizângela Jesus usava água de lona para tomar banho; cisterna ajudou até a manter horta - Arquivo pessoal; Comunicação MTST
Marizângela Jesus usava água de lona para tomar banho; cisterna ajudou até a manter horta Imagem: Arquivo pessoal; Comunicação MTST

Rafael Souza

Colaboração para Ecoa

04/12/2022 04h00

"A gente dormia sem tomar banho, pegava água em cima da lona para tomar banho." A dona de casa Marizângela Jesus, de 44 anos, conta a história de um passado nada distante na ocupação Maria da Penha, em Guarulhos (SP). A falta de saneamento básico impedia tarefas simples, como regar a horta e cuidar da higiene pessoal.

A vida mudou depois que um projeto premiado internacionalmente resolveu apostar em uma tecnologia simples, mas bastante eficaz: a construção de cisternas na comunidade.

"Não precisamos mais fazer isso porque agora temos as 'santas' caixinhas aqui na Maria da Penha. A gente dá banho nas crianças no calorzão", diz a dona de casa, que mora em um barraco com várias crianças, incluindo uma neta de 6 meses e um de 4 anos.

As "caixinhas" a que ela se refere são caixas d'água com canos ao lado dos barracões que funcionam como cisternas para captar e filtrar a água da chuva.

Nova cisterna - Arquivo pessoal/Marizângela Jesus - Arquivo pessoal/Marizângela Jesus
Nova cisterna ajuda moradores de ocupação em atividades diárias
Imagem: Arquivo pessoal/Marizângela Jesus

A construção foi feita por meio de um projeto chamado Quebrada Agroecológica, idealizado por jovens do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST).

A ideia surgiu da constatação de que a vida em uma ocupação já não é fácil, mas, sem água, tudo fica ainda mais complicado. Em locais como a Maria da Penha, há pessoas que não conseguem pagar o aluguel e que estavam situação de rua. A construção das cisternas evita que gastem o pouco que têm comprando garrafões de água.

"A gente não tinha reservatório de água para limpeza da cozinha nem para lavar roupas. Tinha de pegar um galão de 20 litros fora do acampamento", lembra Daiane da Silva, de 35 anos, que trabalha como faxineira.

"Era difícil até para fazer comida, pois nem sempre tinha um homem para buscar e isso era muito difícil para nós, mulheres", completa. Ela chegou à ocupação em busca de moradia. Vive de bicos para sobreviver e não conseguiu o auxílio do governo. O acesso à água é um alento. "Mudou muito [a nossa vida]."

Unicef - Comunicação/MTST - Comunicação/MTST
Jovens ligados ao MTST tiveram financiamento do Unicef
Imagem: Comunicação/MTST

Prêmio na COP-27

O grupo de jovens que participou da criação das cisternas inscreveu a proposta em um edital e obteve o financiamento do Unicef, o fundo das Nações Unidas para a Infância. A proposta ultrapassou as fronteiras do Brasil e chegou até a Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP-27), realizada no Egito em novembro.

Quebrada Agroecológica - Comunicação/MTST - Comunicação/MTST
Projeto Quebrada Agroecológica levou cisternas a ocupação em Guarulhos
Imagem: Comunicação/MTST

Na COP-27, a Quebrada Agroecológica concorreu em um grupo com mais de 90 projetos.

Deu certo. Na disputa com ideias de 45 países diferentes, o projeto de Guarulhos conquistou o prêmio da ImaGen Venture, o que rendeu R$ 60 mil — o dinheiro será usado para levar mais cisternas a outras regiões do Brasil.

No caso da Marizângela Jesus, a garantia de água limpa conseguiu amenizar até a insegurança alimentar. Na ocupação, há uma horta, que agora pode ser regada com frequência.

Cisterna - Comunicação MTST - Comunicação MTST
Água limpa conseguiu amenizar até a insegurança alimentar
Imagem: Comunicação MTST

"A cisterna trouxe um benefício muito grande para mim porque tinha muita dificuldade para pegar água e trabalhar na horta. Agora não preciso mais. Todos os dias agora tenho água para regar, de manhã e à tarde, e dar vida às nossas plantinhas."