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Dois casamentos: ele saiu da faculdade apaixonado pela esposa e... abelhas

Apiário em Nova Friburgo atrai estudantes para conhecer mundo das abelhas - Divulgação
Apiário em Nova Friburgo atrai estudantes para conhecer mundo das abelhas Imagem: Divulgação

Morena Madureira

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

26/12/2022 06h00

"Eu sempre falo que saí da universidade com dois casamentos: um com a Clarice, outro com as abelhas". A frase é de Luis Moraes, 65, criador do Apiário Amigos da Terra, uma empresa familiar que completou 25 anos em 2022.

Além de ser uma das marcas mais conhecidas de mel do Rio de Janeiro, a Apiário Amigos da Terra teve sua sede, em Nova Friburgo (RJ), transformada em ponto de visitação de escolas e universidades.

O Apiário comercializa mais de 100 toneladas de mel por ano, tanto de produção própria, quanto de fornecedores, muitos deles capacitados por Moraes. Na pandemia, a demanda subiu mais de 50%, pelo fato de a covid-19 ser uma doença respiratória. O mel é tradicionalmente usado por pessoas com doenças desse tipo. Disponível nas prateleiras da principal rede de supermercados do Rio de Janeiro, o Zona Sul, o mel Amigos da Terra ainda é fornecido para hotéis e restaurantes cariocas.

Dois casamentos

O início do "namoro" com as abelhas aconteceu por casualidade. De origem urbana, nascido em Niterói (RJ), Moraes era estudante de veterinária da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, em Itaguaí (atualmente Seropédica), quando uma colmeia apareceu na casa em que morava. "Chamei um amigo para retirar, ele fez a captura e resolveu deixar ali para eu mexer. Começou como um hobby, em paralelo às aulas, e depois passei a produzir mel e vender pequenas quantidades na própria universidade", relembra.

Ainda na faculdade, conheceu a estudante de biologia Clarice Líbano, 64, com quem se casou e criou cinco filhos. Mas demorou alguns anos até que o relacionamento com as abelhas também rendesse frutos. Isso começou em 1986, quando Moraes, que trabalhava como pesquisador da Fiocruz, resolveu deixar o Rio de Janeiro e ir viver com a família em um sítio em um distrito de Petrópolis, num momento em que a violência explodia na capital fluminense.

2 - Apiário Amigos da Terra/Divulgação - Apiário Amigos da Terra/Divulgação
"Se as abelhas desaparecerem da face da Terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência."
Imagem: Apiário Amigos da Terra/Divulgação

"Comecei a investir na apicultura de forma profissional e virou um negócio. A gente começou só com farmácias de alopatia e homeopatia", conta Moraes, ressaltando que, por muito tempo, o mel era visto como remédio, e não como alimento a ser consumido na dieta das pessoas. Em 1993, outra mudança deixou o casal mais próximo da criação do Apiário. Em busca de melhores escolas para os filhos, a família foi morar em Nova Friburgo.

Própolis para o Japão

Na cidade, resolveram dar um passo ousado: empreender com exportação de própolis, com foco no mercado japonês. Em 1997, Moraes adquiriu o terreno onde a empresa está localizada até hoje, na estrada que liga os municípios de Teresópolis e Nova Friburgo e que abriga o Circuito Turístico Terê-Fri, do qual viria a se tornar um dos principais atrativos.

Inicialmente, porém, o local funcionou somente como escritório da exportadora. Em 1998, foi aberta a loja para consumidores finais. "Como fazíamos exportação, havia muitas exigências do Ministério da Agricultura e os custos eram muito altos. Tive que refletir sobre o que fazer do meu negócio, se eu ampliava para também exportar mel, ou se fazia uma coisa totalmente diferente", conta Moraes.

Museu do Mel

Nasceu, assim, o Museu do Mel, inaugurado em 2004, atualmente o carro-chefe do espaço. Nele, são mostrados em vídeos, painéis e cenários conteúdos sobre a história da apicultura e o universo das abelhas. Aos poucos, as pessoas começaram a visitá-lo, inclusive professores, que foram trazendo as primeiras escolas.

Foi o caso do Colégio Cruzeiro, tradicional instituição de ensino alemã do Rio de Janeiro, que anualmente leva cerca de 130 alunos de 11 e 12 anos para visitar o Apiário.

"Um dos nossos professores trouxe a proposta de levar os alunos para conhecer o local. Ele percebeu a qualidade técnica do museu e dos ambientes de produção e de criação das abelhas, os quais proporcionariam diversas aprendizagens", conta Claudia Drummond, coordenadora do 8º e 9º anos do Colégio Cruzeiro.

A partir da primeira escola, outras se interessaram. Em 2019, foram mais de 100 instituições de ensino e 5.600 alunos, inclusive de universidades.

"A gente formatou as visitas de acordo com o grau de escolaridade, mas sempre dividindo em três etapas: a visita ao museu, na qual passamos o conhecimento mais teórico, a visita ao campo, na qual vemos de perto as abelhas, e o processo de produção do mel, dentro da empresa", diz o apicultor e empresário.

O sucesso do Apiário entre os visitantes, porém, não se deve unicamente ao Museu do Mel e à loja que vende inúmeros artigos derivados da produção das abelhas. O complemento que faltava está do lado de fora: um lago com aves ornamentais e uma ponte que teve como inspiração a Ponte do Arco-Íris, da China, local disputado para fotos e selfies dos visitantes.

Estrelas principais: as abelhas

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Apiário Amigos da Terra é uma empresa familiar que completou 25 anos em 2022
Imagem: Apiário Amigos da Terra/Divulgação

Mas nada disso poderia existir sem o motivo que leva os turistas ao Apiário: as abelhas.

A empresa cultiva espécies nativas e espécies africanizadas, fruto do cruzamento das europeias e africanas. Ambas são criadas sem uso de medicamentos, nem produtos químicos.

Em Nova Friburgo só é produzido o mel silvestre. Para contar com outros tipos de mel — como a de laranjeira, eucalipto e assa-peixe — colmeias foram espalhadas em regiões rurais de Minas Gerais, em um modelo no qual os proprietários locais são remunerados para ceder espaço para a produção do alimento.

As abelhas cultivadas pelo Apiário também têm grande importância ecológica. Uma frase atribuída a Albert Einstein resume o papel crucial que elas têm para a sobrevivência no planeta: "Se as abelhas desaparecerem da face da Terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência. Sem abelhas não há polinização, não há reprodução da flora, sem flora não há animais, sem animais não haverá raça humana".