Topo

Mudanças climáticas podem gerar mais chuvas como as do litoral norte de SP?

Socorristas participam de resgate de pessoas em Boiçucanga (São Sebastião) - Arquivo pessoal
Socorristas participam de resgate de pessoas em Boiçucanga (São Sebastião) Imagem: Arquivo pessoal

Giacomo Vicenzo e Paula Rodrigues*

De Ecoa, Em São Paulo (SP)

23/02/2023 06h00

A chuva que caiu no município de Bertioga (SP) foi a maior já registrada no Brasil. Foram 683 milímetros em um espaço de nove horas. Já em São Sebastião, onde os estragos foram maiores, foram 627 mm de chuva. Até o momento 48 pessoas morreram e outras 57 ainda estão desaparecidas no litoral norte.

As fortes chuvas e outros eventos como esses são chamados de eventos climáticos extremos. Embora sempre tenham existido, as mudanças climáticas ocasionadas pelos seres humanos podem fazer com que aconteçam com maior frequência.

O que é um evento extremo como o do litoral norte de São Paulo?

Apesar de a literatura científica não definir de apenas uma forma os eventos climáticos extremos, como explica a divulgadora científica e doutoranda em Climatologia pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Karina Lima, esses eventos podem ser descritos como algo que foge do que é considerado mais provável de acontecer.

"Temos observações de longo prazo e sabemos, por exemplo, que o que é esperado para uma região, assim como o intervalo de variação que é comum em torno de uma média. Um evento fora desse intervalo, ou seja, mais raro e mais severo, pode ser considerado extremo", diz, relembrando que esses eventos passam a ser considerados também por causa do grande potencial destrutivo que possuem e de seus impactos negativos no dia a dia da população.

A chuva no litoral norte de São Paulo tem relação com as mudanças climáticas?

São Sebastião registrou alagamentos e deslizamentos  - Divulgação/Prefeitura de São Sebastião - Divulgação/Prefeitura de São Sebastião
São Sebastião registrou alagamentos e deslizamentos
Imagem: Divulgação/Prefeitura de São Sebastião

Apesar de ainda não ser possível cravar, cientistas opinam que possivelmente o aquecimento global tem, sim, relação com as fortes chuvas no litoral norte de São Paulo nos últimos dias.

Carlos Nobre, climatologista brasileiro referência em estudos sobre as mudanças climáticas e pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisa Espacial) afirma que com ajuda de estudos, em poucas semanas saberemos ao certo a causa do temporal.

No entanto, ele diz:

"Pela minha experiência, eu acho que um evento que bate o recorde de chuva em 24 horas deve ter muito a ver com o aquecimento global. Muito desse volume imenso de chuva que aconteceu no litoral paulista tem a ver com o fato de que a temperatura superficial do oceano estava mais alta, a cerca de 27°C. Isso faz o oceano evaporar uma quantidade imensa de água. O sistema meteorológico que ficou sobre o oceano, perto da costa, uma baixa de pressão, jogou essa imensa quantidade de vapor que evaporou do oceano para dentro da costa. O vapor subiu a Serra do Mar, condensou e choveu muito.

Como as mudanças climáticas podem afetar a quantidade de chuva?

Um relatório do IPCC (o Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU), principal estudo sobre o clima, pela primeira vez associou o aumento desses eventos extremos com as mudanças climáticas.

"Quanto mais aquecermos o planeta, maiores as probabilidades de ocorrência de eventos extremos vão se tornando cada vez piores. Eventos extremos, junto a vulnerabilidades locais, são a receita para desastres", diz a cientista e climatologista da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Karina Lima.

Ou seja, um planeta mais quente, como o nosso está ficando, acaba sofrendo com mudanças bruscas no clima, não seguindo mais o padrão que estávamos acostumados.

Como explica Alexandre Araújo Costa, cientista, climatologo e professor da UECE (UECE (Universidade Estadual do Ceará), isso acontece porque a atmosfera aquecida vai se transformando em um reservatório maior de vapor d'água -- o que de um lado pode agravar secas e favorecer ondas de calor (como as vividas pela Europa em 2022), e do outro pode causar tempestades mais severas, furações mais intensos e chuvas mais concentradas.

Com informações do: Deutsche Welle/Nádia Pontes