Você analisa o impacto ambiental na hora fazer compra? Já tem gente que sim
Quando você vai ao mercado, o que leva em conta para escolher o que vai comprar? Além do preço, marca e indicadores nutricionais, pesquisadores apontam uma nova tendência: a avaliação do impacto que o produto, seu meio de produção e sua embalagem trarão para o meio ambiente.
O assunto foi tema de ensaio clínico de 2022, publicado na revista biomédica norte-americana Jama Network Open, sob cuidados da Associação Médica dos EUA. O resultado mostra que 61% dos entrevistados preferiram comprar alimentos cujas embalagens tinham informações sobre reciclagem e impacto ambiental.
Para a nutricionista e membro da diretoria da SBAN (Sociedade Brasileira de Nutrição) Márcia Terra, o estudo pode ser considerado válido também para o Brasil, pois habitualmente acompanhamos as tendências norte-americanas de nutrição.
Márcia analisa que, se cruzarmos os resultados da Jama Networking com uma recente pesquisa do IFIC (International Food InformationCouncil), vemos que a Geração Z é a maior responsável por essa mudança de comportamento pois, com idades entre 18 e 30 anos, esses jovens fazem compras para a casa, pedem delivery e saem para comer.
Por terem crescido, em sua maioria, com amplo acesso à internet, eles possuem mais informações sobre estes impactos e acabam optando pelo consumo consciente. Isso ocorre também porque essa geração tem já uma visão de urgência sobre a proteção do meio ambiente. Ela pontua que a pandemia de covid-19 também acelerou essa percepção para pessoas de outras idades, uma vez que a paralisação das atividades afetou toda a cadeia de produção e logística, evidenciando esses temas.
Preocupação nutricional e ambiental
A urbanista Tatiana Antonelli, 42 anos, moradora da cidade de São Paulo, considera ler os rótulos antes de escolher um produto no mercado, e informa que se o produto trouxer o impacto ambiental, ela irá analisar também. Por ser alérgica a vários alimentos, a preocupação nutricional sempre existiu, mas a ambiental aumentou quando ela passou a estudar academicamente sobre mudanças climáticas.
"Não compro nada que tenha corantes e acidulantes, prefiro os orgânicos e os que tragam bastante informação nas embalagens, como, por exemplo, a quantidade de açúcar. Quando a embalagem traz isso eu fico bem mais confiante em fazer a minha escolha".
Ela diz que pesquisa e observa também os impactos do produto na cadeia produtiva. Ao comprar roupas, por exemplo, privilegia as que são feitas com matéria prima reciclável, algodão, ou outro material sustentável, certificado por algum selo de verificação. "Quanto mais informações, mais fácil para que eu faça a minha escolha", informa.
Todos ganham
O rótulo ambiental de um produto traz benefícios a consumidores e à indústria. Ao consumidor final, ele traz informações sobre o processo de produção até o produto chegar ao mercado, e orienta sobre o descarte correto da embalagem.
Para a indústria, ele certifica que as informações contidas na embalagem são verdadeiras e que aquela empresa cumpre determinações para a reciclagem das embalagens ou redução na emissão de carbono, por exemplo.
Mas é importante lembrar que uma empresa sustentável não será, necessariamente, responsável por um produto mais saudável. Uma coisa não influencia obrigatoriamente na outra.
Márcia Terra, nutricionista da diretoria da Sociedade Brasileira de Nutrição
Um exemplo disso são os ovos de galinhas não confinadas, encontrados com facilidade nos mercados. A engenheira florestal, mestre em recursos naturais pela UFMS, Ana Laura Biella, diz que a escolha por eles parece ser a melhor opção quando o valor é semelhante aos ovos de granja, mas não são necessariamente mais nutritivos ou saborosos que os outros ovos.
Já os ovos 'comuns', ou seja, de galinhas de granja, têm em sua cadeia de produção o confinamento, o estresse animal, maior demanda de insumos externos (ração, remédios, etc.), e menor salubridade em relação à outra criação. "Mas o consumidor precisa conhecer estas informações para levar em conta na hora da compra", pondera.
Rótulo nasceu na Alemanha
De acordo com Ministério do Meio Ambiente, a rotulagem ambiental teve início com a criação do primeiro rótulo (Der Blaue Engel, ou Anjo Azul), na Alemanha, em 1977. Foi a partir dessa certificação que a prática se espalhou para outras regiões do mundo.
No Brasil, hoje a medida ainda não é obrigatória para os alimentos. O que temos são rotulagens baseadas em padrões de qualidade, seguindo as normas internacionais ISO (Organização Internacional de Normalização).
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) segue estas normas técnicas para rotulagem nutricional; para controle de materiais permitidos nas embalagens; para componentes alergênicos; teor de gordura; lactose; enriquecimento de farinhas e suplementação alimentar; entre outros.
Existe um esforço em andamento para mostrar aos consumidores, governos e empresas os benefícios do uso da Rotulagem Ambiental. Em 2020 a ABNT promoveu em Brasília, junto ao Global Ecolabelling Network (GEN), um treinamento para países da América Latina interessados em desenvolver seus programas nacionais de Rotulagem Ambiental Tipo I.
Os tipos de rótulos ambientais vigentes por aqui são os seguintes:
- Os de Tipo I, regulamentados pela norma ISO 14024, é o "Selo Verde"/ Ecológico, que atesta que a empresa é reconhecida por produzir com o menor impacto ambiental possível. São certificados por entidades como FSC (Forest Stewardship Council), a Bonsucro (cana-de-açúcar sustentável) ou a ABNT.
- Os de tipo II, seguindo as normas da ISO 14021 é concedido quando a empresa autodeclara o tipo de compensação que faz, seja reciclando papel, aço ou alumínio, por exemplo. Geralmente traz uma porcentagem indicando a quantidade de material que pode ser reutilizado daquela embalagem. Este tipo não requer uma validação de entidade certificadora.
- Já os de tipo III seguem a norma ISO 14025, detalham a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) e indicam o potencial impacto ambiental de cada elemento da embalagem, como se fossem os índices de um rótulo nutricional.
O consumidor que escolher seus produtos com base nestas informações deve ler a embalagem com atenção. Embalagens recicladas geralmente são representadas por um triângulo formado por setas. A de "descarte correto" traz o desenho de um cesto de lixo e um boneco jogando a embalagem na lixeira correspondente. Outros dados como produção, origem e processos virão acompanhados do ícone de uma certificação independente.
As mais conhecidas hoje no Brasil são o Selo Verde da ABNT (concedido às empresas que diminuem o impacto ambiental durante todo o ciclo de vida do produto); o 'Eu reciclo' (voltado para a reciclagem de embalagens) e o Produto Orgânico Brasileiro, credenciado pelo Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), que faz a checagem sobre o uso de agrotóxicos na produção do alimento.
A nutricionista Márcia Terra sugere que o consumidor pesquise ainda pelas ações de sustentabilidade das empresas e dos mercados onde os produtos são vendidos para basear suas escolhas.
Ao que tudo indica, se as empresas alimentícias passarem a valorizar essas informações em suas embalagens, existe um público disposto a apreciar. "Eu privilegiaria estes produtos, mas a grande questão é o preço que isso pode nos custar", pondera a urbanista Tatiana Antonelli.
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