Se bicho azul não existe, qual a cor do pavão e da arara-azul?
Você já reparou que a cor azul é rara na natureza? Alguns seres vivos apresentam aos nossos olhos uma coloração rica em tons, mas, ao examinarmos com mais atenção, percebemos que esses seres são capazes de emular cores por sistemas óticos microscópicos ocultos em seus corpos, como é o caso do pavão e da arara-azul, cujas tons azulados não são o que parecem.
Mestre em Ecologia pela UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e doutorando em Ecologia pela Unicamp, o pesquisador João Vítor de Alcântara Viana explicou a Ecoa que os principais atributos da cor são matiz, saturação e brilho. Modificações em uma ou mais desses alterarão a percepção das cores.
"Diferentes organismos percebem o mundo de formas totalmente distintas, já que cada espécie possui um sistema visual característico, desde a própria forma (morfologia) do olho a fotorreceptores especializados (células especializadas sensíveis à luz) em comprimentos de onda específicos", explica o especialista, pesquisador em ecologia visual, sensorial e comportamento.
Por exemplo, ao olharmos uma determinada flor, não somos capazes de perceber a cor ultravioleta refletida por ela, pois não temos fotorreceptores para esse tipo de comprimento de onda, que oscila entre 300 a 400 nanômetros. Já as abelhas, por exemplo, conseguem ver a cor ultravioleta, que é invisível aos nossos olhos. João Vítor de Alcântara Viana
Segundo o pesquisador, as flores refletem essa cor para atrair as abelhas e facilitar a polinização. Por outro lado, as abelhas não conseguem ver o vermelho, que para elas parece apenas cinza, enquanto os beija-flores podem enxergar uma ampla gama de cores, incluindo ultravioleta, azul, verde e vermelha.
Na natureza, há várias espécies de animais e plantas que apresentam cores que o ser humano não pode ver, como aranhas que refletem ultravioleta e aves que refletem infravermelho. Esses recursos ajudam os animais a se adaptarem aos seus ambientes, seja para se protegerem de predadores, se comunicarem com outros indivíduos da mesma espécie ou encontrar alimento.
Cor pigmentar e cor estrutural
A cor é como enxergamos os diferentes tipos de luz. Quando a luz é refletida ou transmitida pelos objetos e chega aos nossos olhos, nós vemos cores. A maioria delas é resultado da presença de pigmentos, moléculas que dão cor aos objetos, incluindo nossas roupas e nossa pele.
Mas há outra forma de se obter cor, usada por plantas, animais e insetos. A chamada cor estrutural. Esses organismos possuem estruturas microscópicas em suas superfícies que interferem na reflexão da luz, criando cores que mudam dependendo do ângulo em que as observamos.
É o caso do pavão, que, na realidade, possui coloração marrom, mas, segundo o pesquisador, a estrutura microscópica de suas penas as faz parecer azul, turquesa e verde mediante mecanismos de coloração estrutural que as tornam iridescentes. Por conta do mesmo mecanismo refrator da luz oculto nas penas, a arara-azul, com sua coloração inconfundível, na verdade, é preta.
Azul é raro
Muitos organismos não conseguem produzir pigmentos, especialmente o azul, considerado raro na natureza. Por isso, alguns animais obtêm a cor por meio da alimentação, como é o caso dos flamingos, que ficam alaranjados devido ao que comem ter carotenoides.
Já a cor azul é obtida por mecanismos especializados de estruturas de escamas ou penas que orientam a luz, absorvendo ou redirecionando parte dela e refletindo outra. Isso faz com que o azul seja raro em animais, já que as plantas não produzem pigmentos azuis verdadeiros.
Camuflagem e seleção sexual
O mecanismo de reflexão da luz que produz cores iridescentes pode ser encontrado em diversos grupos animais, como besouros, répteis, beija-flores e peixes. Essas cores podem variar conforme a posição em que olhamos e a incidência da luz. A funcionalidade dessa coloração pode ser diferente em cada espécie, dependendo de sua história evolutiva, podendo servir para camuflagem ou seleção sexual, por exemplo.
As asas das aves azuis possuem estruturas especializadas em suas penas, em arranjos de proteínas (queratina) que são capazes de orientar a luz, de modo que o azul iridescente seja refletido e percebido por nós. Ao mudar a posição da incidência de luz a coloração também muda, por isso que de determinados ângulos, em especial na parte ventral, que recebe menos iluminação, se torna preta. Viana
"É um tipo de coloração estrutural, em que a coloração que vemos é devido à morfologia em microescala da pena da ave e não da síntese de um pigmento, também algo comum e muito dinâmico nas penas de beija-flores; nas asas de borboletas, como as do gênero Morpho; em répteis, como a jiboia arco-íris; peixes, como o tetra neon; e até em besouros, como os da espécie Entimus imperialis (besouro-diamante)", esclarece o pesquisador.
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