'Pai do ESG' revolucionou futuro das empresas, mas acha pouco: 'Escárnio'
A sigla ESG (environmental, social & governance, em inglês) se espalhou pelas conversas do mundo corporativo como um vírus, influenciando estratégias de negócio, campanhas de marca e a criação de departamentos voltados para sustentabilidade. Mas John Elkington, considerado o "pai" da sigla, esperava um avanço mais rápido da agenda social, ambiental e de governança no mundo dos negócios.
Na década de 1990, o consultor britânico criou o Triple Bottom Line (TBL), também conhecido como tripé da sustentabilidade, que propõe o foco em "pessoas, planeta e lucro" para guiar os negócios. Nascia ali o embrião da sigla ESG.
Desde o livro "Cannibals with Forks: The Triple Bottom Line of 21st Century Business" (algo como "Canibais com garfos: o tripé de resultados para os negócios do século 21", em tradução livre para o português), lançado em 1997, John tem abordado o TBL em diferentes obras e, agora, trabalha para lançar um novo livro, com suas expectativas para o mundo da sustentabilidade na próxima década, à luz de uma retrospectiva dos seus 50 anos de trabalho na área.
Em entrevista a Ecoa, o fundador da agência de consultoria e estratégia Volans, baseada em Londres, reconhece o potencial do Brasil diante de soluções climáticas dos próximos anos.
Mas para exercermos esse protagonismo, diz ele, nossos ecossistemas devem ser preservados. John também critica a prática econômica que desconsidera o meio ambiente e as mudanças do clima e vê a educação acessível como peça-chave para as mudanças. Confira:
Ecoa - No Brasil, já percebemos o avanço da crise climática com eventos extremos, o que nos leva a pensar na adaptação climática. Como aplicar o ESG nessas estruturas de adaptação?
John Elkington - Se as soluções forem inclusivas e os resultados forem genuinamente sustentáveis, elas nos levarão além da maior parte do pensamento ESG atual.
Quando penso no Brasil, penso em alguns dos experimentos mais intrigantes do mundo, incluindo o trabalho de agricultura regenerativa de pessoas como o [hub de agrofloresta] PretaTerra.
Quais potenciais climáticos você vê no Brasil? Sejam eles nocivos ou positivos, pensando que temos altas taxas de desmatamento, mas também diversas fontes de energia renovável, por exemplo.
Quando estive no Brasil há alguns anos, trabalhando para o Sebrae, conheci uma delegação local da Câmara Internacional do Comércio. Eles argumentavam que uma das maiores vantagens competitivas do Brasil são seus recursos naturais extraordinários, em lugares como a Amazônia e o Pantanal.
Tudo é verdade, mas se eles vão servir ao futuro do Brasil — e do resto do mundo — eles devem sobreviver. O ataque dos [políticos] populistas à natureza em tantos países será visto com escárnio pelas gerações futuras.
Muitos dos países mais afetados pela crise climática não são os maiores emissores de gases de efeito estufa. Como distribuir de forma justa essa responsabilidade climática, considerando o papel do setor empresarial?
Esta é uma questão muito difícil. O mundo tornou-se mais igualitário em alguns aspectos nas últimas décadas, à medida que as diferenças de pobreza diminuíram, mas também se tornou nitidamente mais desigual. Mas acho que o foco crescente em "perdas e danos" nas negociações da ONU é esperançoso.
Vemos consumidores mais conscientes e um mercado de comércio justo, mas também o avanço do fast fashion, por exemplo. Como engajar a sociedade e os cidadãos com a defesa do meio ambiente?
Estou terminando um novo livro, meu vigésimo primeiro, no qual faço uma retrospectiva dos 50 anos em que trabalhei nas áreas de meio ambiente e sustentabilidade até hoje, e depois 10 a 15 anos à frente. Minha conclusão é que nos próximos 10 a 15 anos virão mais mudanças, para o bem e para o mal, do que os últimos 50 anos juntos.
Os consumidores irão desempenhar papéis importantes em tudo isso, mas, na melhor das hipóteses, são "tropas de choque" — que podem ser mobilizadas por curtos períodos para exercer pressão sobre produtos, empresas ou setores problemáticos.
O verdadeiro desafio é garantir que o conhecimento relevante chegue à educação de massa, em todos os níveis — incluindo escolas de negócios. Algumas pessoas acham que é tarde demais para a educação, mas para mim é o maior investimento individual que uma sociedade pode fazer em seu futuro.
Seu conceito TBL é considerado por muitos como o embrião do ESG. Nos anos 1980, você previu esse boom?
Achei que viria antes. Para começar, o impacto foi confinado a empresas individuais como Shell ou Novo Nordisk, que publicaram a primeira geração de relatórios TBL.
Então, o TBL entrou no código genético de relatórios não financeiros, adentrando gradualmente os relatórios financeiros [...] agências de classificação como o Índice Dow Jones de Sustentabilidade foram focados em TBL desde o início.
Já o próximo grande passo veio com as corporações B (empresas que equilibram propósito e lucro). Então veio o ESG — e, de repente, todos queriam um pedaço disso.
Ao mesmo tempo que o ESG cresce no discurso corporativo, as emissões de gases de efeito estufa não diminuíram e os últimos painéis do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) não são animadores. Como explicar essa contradição?
O problema é que o ESG ainda se concentra em compensações, em vez de soluções integradas. A economia e os economistas ainda medem a criação de valor em termos de um único resultado final. E as externalidades, como um clima desestabilizado, são muitas vezes ignoradas.
A economia tem sido descrita como uma doença. Não é tão ruim assim, é claro, mas os economistas ainda têm um longo caminho a percorrer antes de merecerem um lugar à mesa.
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