Cão foi abandonado no lixo e virou herói em tragédias como a de Brumadinho

Não fosse pela postura atenta e o ar sereno, Resgate até passaria despercebido em uma esquina qualquer de uma grande metrópole como São Paulo. Mas o cão vira-lata de pelos negros e olhos brilhantes é como um ímã que atrai a atenção quando, vestido com seu colete laranja-vibrante, se coloca ao lado de uma faixa que diz: Pedágio da Ração.

"Resgate, a postos!" é o comando para ele ficar atento à movimentação no local. Ali, naquela estratégica área próxima a uma enorme loja de produtos para pets, Resgate tem uma missão.

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A posição de alerta é resultado do treinamento que recebeu, em inglês e português, de um policial voluntário e do tutor do cão, Benedito Rodrigues Corrêa. Militar da reserva, o ativista se dedica à causa animal desde 1979, e está à frente da ONG Resgate sem Fronteiras.

Segundo Corrêa, a organização não-governamental conta atualmente com a colaboração de mais seis parceiros diretos - e outras dezenas de profissionais voluntários, como médicos veterinários, que ajudam indiretamente a manter as ações.

O trabalho dos voluntários inclui prestar atendimento e cuidados a animais abandonados, feridos ou doentes, a realização de palestras educativas, distribuição de doações e até a organização de um bazar, com alguns dos itens doados para a ONG, como roupas, calçados e agasalhos, cuja renda é revertida para a manutenção da organização.

Em visita a regiões periféricas, os ativistas também levam materiais escolares, livros e brinquedos doados para distribuir às crianças da área. Mas as atividades vão bem além da ajuda material.

Do abandono ao estrelato

Diante de grandes tragédias, membros da Resgate Sem Fronteiras se oferecem para ajudar em buscas, apoiando as equipes em operações de localização de pessoas e bichos de estimação.

Após entrar em contato com a Defesa Civil e autoridades locais, explica Corrêa, os ativistas vão até a região do desastre para apoiar as ações humanitárias, tendo como guia o faro dos cachorros treinados pela ONG.

Foi assim na operação feita no litoral norte de São Paulo, quando fortes chuvas provocaram alagamentos e deslizamentos em fevereiro deste ano. Os cães farejadores foram levados ao local para auxiliar a equipe de bombeiros.

Com a ajuda do vira-lata Resgate e de outro cãozinho da ONG chamado Fronteiras, os socorristas encontraram uma criança que estava embaixo dos escombros de uma casa que veio abaixo com as chuvas.

Resgate não atua sozinho, mas se destaca entre todos os animais mantidos pela ONG por ser já bem experiente em operações do tipo. Em 2019, ele participou da extenuante procura por corpos das vítimas do desastre de Brumadinho, em Minas Gerais (MG), uma das maiores tragédias ambientais do Brasil provocada pelo rompimento da barragem de uma mineradora.

A experiência deixou como sequela uma alergia no corpo do cão-farejador, devido ao contato com a lama tóxica. Ele recebe tratamento veterinário, mas, vez ou outra, quando está a postos no Pedágio da Ração, Resgate se esfrega no muro na tentativa de aliviar a coceira.

Encontrado no lixo

Como se não fosse suficiente o seu faro para fazer o bem, o herói de quatro patas tem ainda uma história de vida impressionante. Quando era apenas um bebê, o cãozinho foi abandonado em uma caçamba de lixo. Adotado pela ONG, Resgate não demorou mais do que seis meses para revelar, nas primeiras atividades de treinamento, que tinha disciplina e potencial para ser um cão-farejador.

"Ele é mesmo muito inteligente, de uma sensibilidade fora do comum", resume Corrêa, enquanto exibe as habilidades que o animal tem para entender os comandos de voz, incluindo a capacidade de saltar e escalar o tronco de uma árvore para pegar algo que seu tutor coloca a quase dois metros do chão.

Aposentadoria merecida

Prestes a completar sete anos, Resgate deve se aposentar em breve. Segundo calcula o ativista, a partir do ano que vem, o cão-herói e símbolo da ONG que o batizou vai pendurar seu colete laranja-vibrante e não precisará mais ficar a postos na esquina do pedágio de doações.

"Fazer o bem ao próximo é tão bom, mas dá muito, muito trabalho", desabafa Corrêa, que diz passar mais de 10 horas no final de semana apenas se dedicando a arrecadar as doações. É também ele quem leva, na maioria das vezes, os pacotes com ração e outros itens até as áreas onde estão pessoas e animais em condições vulneráveis.

Os planos para o resto da vida do cão vira-lata que já atuou em operações de buscas complexas, auxiliando bombeiros e agentes da Defesa Civil em grandes tragédias, incluem apenas descansar no local que hoje o abriga, junto com os demais animais que estão sob os cuidados da RSF, na região de Guarulhos (SP).

Para saber mais sobre as atividades da ONG Resgate sem Fronteiras acesse a rede social do projeto.

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