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Respeita o baiacu: Além de inchar, é o 2° vertebrado mais venenoso do mundo

Quando o baiacu é atacado, ele infla o estômago até ficar no formato de uma bola e com três vezes o seu tamanho normal - Reprodução/Twitter/@BiologoRangel
Quando o baiacu é atacado, ele infla o estômago até ficar no formato de uma bola e com três vezes o seu tamanho normal Imagem: Reprodução/Twitter/@BiologoRangel

Maurício Businari

Colaboração para Ecoa

07/06/2023 04h00

Já conta com mais de 440 mil visualizações um vídeo publicado recentemente no Twitter, que mostra um baiacu escapando de ser comido por um peixe pulmonado africano do gênero Protopterus, considerado extremamente agressivo, simplesmente inflando seu corpo como um balão.

As imagens, comentadas pelo biólogo Sergio Rangel, chamaram a atenção dos internautas. No vídeo, o baiacu expande seu corpo no momento em que é abocanhado pelo Protepterus, também conhecido como West African Lungfish, que acaba desistindo da caçada.

Os baiacus pertencem às famílias Tetrodontidae e Diodontidae, peixes que têm a capacidade de inflar o corpo para se defender dos predadores.

Segundo o biólogo e físico Roberto Vieira dos Santos Junior, o órgão que infla é o estômago do animal, que é extremamente elástico. Assim, ele adquire uma forma esférica e consegue aumentar seu tamanho em até três vezes. Isso acaba permitindo também que ele engula presas maiores, o que lhe dá um aspecto de "gordinho" após comê-las.

Quando o baiacu está completamente "cheio", uma válvula localizada na base da boca do peixe é pressionada em direção aos dentes. Dessa forma, ela fecha a saída da água armazenada no estômago.

"Ao aumentar de tamanho rapidamente, ao engolir rapidamente água ou até mesmo ar, o baiacu torna-se difícil de ser abocanhado, surpreendendo o predador. Algumas espécies possuem espinhos na pele que ajudam a tornar esse ato ainda mais surpreendente ao atacante", explicou a Ecoa.

Graças à sua pele também altamente elástica, o baiacu não se rompe quando inflado. Outra parte adaptável do corpo do peixe é a espinha. Flexível, ela pode se curvar para se adequar à nova forma do corpo.

Esse peixe também possui dentes que crescem o tempo todo e devem ser desgastados. Para isso, ele mastiga corais, mariscos e crustáceos, cujas cascas acabam lixando os seus dentes, evitando que cresçam a ponto dele não conseguir mais fechar a boca e ficar sem comer.

Os dentes do baiacu nunca param de crescer, por isso ele tem que ficar mastigando corais, mariscos e crustáceos - Reprodução/Twitter/@BiologoRangel - Reprodução/Twitter/@BiologoRangel
Os dentes do baiacu nunca param de crescer, por isso ele tem que ficar mastigando corais, mariscos e crustáceos
Imagem: Reprodução/Twitter/@BiologoRangel

Veneno pode matar

Inflar o corpo, porém, não é a única estratégia de sobrevivência apresentada pelo peixe-bola, como também é conhecido o baiacu. Afinal, ele é considerado o segundo vertebrado mais venenoso do planeta, perdendo apenas para uma espécie de rã, a Phyllobates terribilis, um anfíbio minúsculo, encontrado em algumas regiões da Colômbia.

A grande maioria é de baiacus é marinha, mas existe uma quantidade considerável de espécies que vivem em água doce. Para o consumo humano, são considerados perigosos devido ao veneno presente em seus fígados. A tetrodotoxina". Roberto Vieira dos Santos Junior.

A tetrodotoxina é um dos venenos mais poderosos encontrados na natureza. Para se ter uma ideia, bastam dois gramas da substância para matar uma pessoa.

Professor do Departamento de Dermatologia da Faculdade de Medicina da Unesp de Botucatu, e autor de diversos trabalhos científicos sobre o tema, Vidal Haddad Junior explicou a Ecoa que essa toxina bloqueia a capacidade dos nervos de transmitirem ordens para os músculos e acabam por paralisar os músculos da respiração, o que sem os devidos cuidados acaba em morte.

"A tetrodotoxina é, curiosamente, produzida por bactérias e acumulada pelos baiacus, especialmente as fêmeas em seus ovários, mas também na pele e órgãos internos", explica o especialista.

O sashimi feito com carne de baiacu, além de perigoso é caro: no Japão pode custar de R$ 400 a R$ 700 - Reprodução/Wikimedia Commons/Raita Futo - Reprodução/Wikimedia Commons/Raita Futo
O sashimi feito com carne de baiacu, além de perigoso é caro: no Japão pode custar de R$ 400 a R$ 700
Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons/Raita Futo

Iguaria perigosa

Apesar de sua periculosidade, os baiacus são muito apreciados por sua carne, como no Japão, onde um prato preparado com o peixe, lá chamado de fugu, pode custar entre R$ 400 e R$ 750. Mas o Brasil também figura entre os países consumidores. E os "acidentes" são comuns entre pescadores e apreciadores de sashimi (peixe cru).

Existem dois tipos de baiacu mais comuns no Brasil, segundo o professor: o arara e o pintado. O arara é menos tóxico e pode ser encontrado em mercados de peixes. Já o pintado tem doses altíssimas de tetrodotoxina, sendo responsável pela totalidade dos envenenamentos no País.

Já relatamos cerca de 70 intoxicações, com dez mortes. É um problema crônico, cultural, mas raramente atinge a população em geral, como no Japão, onde é uma iguaria. Pescadores são as vítimas principais". Vidal Haddad Junior.

À direita, o baiacu-arara e, à esquerda, o baiacu-pintado, a espécie mais venenosa encontrada no Brasil - Reprodução/Wikipedia/Wikimedia Commons - Reprodução/Wikipedia/Wikimedia Commons
À direita, o baiacu-arara e, à esquerda, o baiacu-pintado, a espécie mais venenosa encontrada no Brasil
Imagem: Reprodução/Wikipedia/Wikimedia Commons

A tetrodotoxina bloqueia canais de sódio, que agem transmitindo as ordens dos nervos para os músculos agirem. O bloqueio é progressivo e quando atinge os músculos da respiração, pode causar a morte por asfixia. "O paciente permanece lúcido o tempo todo, apenas não pode se mover. Chamamos isso de 'síndrome do cárcere'", explica o professor.

Inicialmente a vítima tem mal-estar, formigamento em volta da boca e em outras partes do corpo. Em fases posteriores, queda da pressão arterial, arritmias cardíacas e ocorre uma paralisia progressiva, que pode ser total.

Não há antidoto para a tetrodotoxina. O único tratamento é o equilíbrio dos sintomas, com controle da queda da pressão arterial, das falhas cardíacas e da paralisia (com respiração artificial). "Fica fácil entender que se não houver uma UTI por perto, dificilmente a paciente escapa. E como a maioria das vítimas são pescadores em locais afastados, o índice de letalidade é alto", conclui o especialista.

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