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Indígena LGBTQIA+ é coordenadora de políticas públicas do governo Lula

Larissa Pankararu - Reprodução
Larissa Pankararu Imagem: Reprodução

Caroline Apple

Colaboração para Ecoa

28/06/2023 06h00

Antes de começar a entender sua sexualidade, a coordenadora de políticas para indígenas LGBTQIA+ do Ministério dos Povos Indígenas, Larissa Pankararu, já havia se "casado" cinco vezes em ritos feitos em sua aldeia, que fica em Jatobá, na divisa de Pernambuco, Alagoas e Bahia.

A primeira cerimônia foi aos nove anos de idade quando participou pela primeira vez do ritual espiritual chamado Menino do Rancho, momento em que a família "entrega" um indígena jovem a um encantado para que este seja seu protetor.

Entre as inúmeras ritualísticas está a escolha simbólica de uma noiva na espiritualidade, união que pode ou não acontecer na "vida real". Mas este não foi o caso de Larissa.

Aos 27 anos, ela saiu de sua cidade para assumir o cargo de coordenadora no ministério, em Brasília, onde ela recebeu da ministra Sonia Guajajara o desafio de colocar no mapa do governo federal as reivindicações e necessidades da população indígena LGBTQIA+.

Porém, a nomeação para este cargo foi uma surpresa, uma vez que sua sexualidade ainda estava sendo desenhada após anos de repressão, além de nunca a ter usado diretamente como bandeira política.

"O que me importava quando entrei no movimento político é que mais mulheres ocupassem esses espaços, principalmente as mais jovens. Era essa minha ideia. Então, receber o convite para coordenação LGBTQIA+ foi uma surpresa, até porque, minha sexualidade era uma questão forte para mim e para minha família", conta.

Larissa Pankararu - Reprodução - Reprodução
Larissa Pankararu
Imagem: Reprodução

Desafios familiares

Reconhecer e viver sua sexualidade não foi tarefa fácil, principalmente dentro dos dogmas religiosos de seus pais, que são indígenas, mas vivem sobre preceitos ortodoxos da Igreja Católica e da Evangélica, que condenam a prática da homossexualidade.

"Minha sexualidade sempre foi vista como algo errado. Passei anos sendo reprimida ao ponto de, até hoje, eu não conseguir me definir, apesar de não gostar de rótulos. Mas a Sonia [Guajajara] conversou comigo e mandou um áudio para os meus pais, que passaram a me apoiar em partes, porque minha mãe, por exemplo, não consegue, sequer, falar a palavra 'homossexual'", diz.

Do ritual para o governo federal

Até assumir o cargo de coordenação no Ministério dos Povos Indígenas, Larissa travou uma verdadeira batalha com a sua família, da qual se afastou por um período para viver à sua maneira com a sua nova namorada em Aracaju.

"Eu morava na casa de um tio, onde a filha dele vivia fazendo fofoca sobre minha vida e causando muitos conflitos com a minha mãe. Então, tranquei a faculdade e voltei para casa, onde consegui a revelação e o direcionamento que eu precisava na espiritualidade", conta.

Larissa participou do ritual Corrida do Imbu, que acontece durante a Quaresma, fruto do sincretismo dos ritos Pankararu com o catolicismo. Neste evento, as forças espirituais anunciam para a aldeia como será o próximo ano.

Na época, a coordenadora havia prestado o vestibular para a UnB (Universidade de Brasília) e havia passado na prova, mas ainda faltava a entrevista. E foi no último dia de ritual que Larissa teve mais clareza dos próximos passos que um dia a levariam a atuar dentro do governo federal.

"No momento da saída do General Mestre Guia, que é o dono de todo território Pankararu, é a hora que toda a comunidade faz os seus pedidos e agradecimentos e renova as energias para um novo ano. Então pedi para que me dessem uma resposta para iniciar novos caminhos e me preparar para eles. No dia seguinte eu tinha a entrevista. Fui praticamente direto do ritual. E fui confiante e passei. Assim começou minha história em Brasília", relembra.

Larissa Pankararu - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Larissa Pankararu
Imagem: Reprodução/Instagram

Foi na UNB que Larissa conheceu outros indígenas LGBTQIA+ e viu que não estava sozinha. Assim passou a fazer parte dos movimentos estudantis indígenas e começou a frequentar eventos e reuniões.

Um desses encontros foi no ATL (Acampamento Terra Livre), o maior evento político indígena do Brasil. Na ocasião, em 2022, foi lançada a Bancada do Cocar. E como uma jovem indígena lutando por espaço na política, lá estava Larissa.

"Quando eu vi estava ao lado de Célia Xacriabá, Sonia Guajajara e outras lideranças indígenas mulheres. Pensei em trilhar esse caminho desde que vi, em 2018, a Sonia com o Boulos, durante a campanha para presidente em que ela era vice. Foi um choque de representatividade. Mas o convite mesmo para trabalhar com ela [Sonia] veio no ATL, mas não sabia ainda como. Fiquei apenas na expectativa e, depois, aconteceu", conta.

E foi assim que Larissa assumiu a coordenação de políticas para indígenas LGBTQIA+ do MPI. Modesta, ainda sem equipe, a jovem sabe que os desafios são grandes, mas que pode contar com o apoio da equipe ministerial. "Não é porque sou uma pessoa só que essa coordenação é menos importante dentro do ministério."

Agora, a jovem coordenadora faz planos para o futuro com a namorada indígena Pankará, Amanda, de 25 anos, que mora em São Carlos (SP). O casal, que está junto há dois anos, pretende ficar mais perto em breve, quando Amanda terminar a faculdade e entrar para um mestrado em Brasília.

"Meus pais tratam a Amanda muito bem, mas apresentei ela só como 'Amanda' [risos]. Nossa conexão é incrível. Nos falamos o tempo todo. Quando eu entrei para a vida pública eu conversei com ela para ver se ela queria continuar namorando. Ela sempre me apoiou. Estou apaixonada", finaliza.

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