Abelhas somem misteriosamente e acendem alerta no Brasil e na Europa
Gustavo Nadeu Bijos poderia ser apenas mais um caubói em Campo Grande (MS). Mas ele resolveu inovar, e em vez de gado ou cavalos, decidiu criar abelhas. "Eu praticamente me vi sozinho", contou a Ecoa, em depoimento para nossa série Oeste, que você pode assistir no vídeo acima.
Gustavo tornou-se, assim, um caubói solitário. Era um dos poucos apicultores no estado e trabalhava isolado. O esquema funcionou até o surgimento de um crime incomum: o roubo de colmeias. O delito se constitui em ladrões invadindo fazendas e levando caixas com mel, própolis, cera e milhares de insetos, geralmente quando anoitece. Há denúncias do crime no Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste.
O material furtado pode ser vendido por até R$ 5 mil na internet. Os criminosos, claro, sabem evitar picadas na hora do roubo, já que dominam técnicas de apicultura. "Para mim, apicultor é quem produz. Quem rouba, é ladrão", diz Gustavo.
'Centinela' contra roubos de colmeia
Para se proteger, Gustavo testou um moderno "chip gringo" em suas colmeias. O dispositivo "Centinela", criado na Espanha, capta movimentações estranhas nas colmeias, notifica o apicultor pelo celular e rastreia a carga roubada. "Nem todos os apicultores dizem onde o chip é instalado [na colmeia] para dificultar ainda mais [para o ladrão]", conta Gustavo.
Parecia uma ideia promissora, mas com um problema bem brasileiro. Por aqui, nem sempre há sinal de internet no campo. Conectar uma colmeia é ainda mais difícil, pois elas geralmente são instaladas em uma área afastada para dificultar acidentes.
Sem abelha, sem comida
As abelhas são polinizadoras, o que ajuda na formação de frutos e sementes. "Sem abelha, sem comida", resume Gustavo. Em um roubo, milhares delas podem ser mortas durante o manuseio desastrado.
Para salvá-las, Gustavo precisou deixar de ser um caubói solitário. No final dos anos 90, o ramo era incomum na universidade. Nem os professores entendiam. "Quem fosse masculino, ia para a veterinária de gado de corte", diz.
Assim, ele uniu forças com a figura de um "xerife" de Mato Grosso do Sul: o apicultor Adriano Adames.
Dupla dinâmica
Autodidata, Adriano vendeu uma criação de gado para investir em abelhas no início dos anos 2000, quando instalou colmeias em Campo Grande (MS) e Bodoquena (MS). Depois, lançou uma linha de mel e de roupas de proteção. "Parece que você não envelhece perto das abelhas", diz.
A dupla usou as redes sociais para alertar os apicultores e descobriram que alguns nem sequer sabiam que o sumiço era considerado um crime — e, consequentemente, nem registravam ocorrência. Adriano entendia o apelo das colmeias para os bandidos. "Dá um bom dinheiro. Uma caixa de colmeia hoje sai por R$ 600", diz.
Gustavo tinha receio de que a violência pudesse aumentar. Inclusive, na bala. "Se há uma invasão de fazenda, há risco de o proprietário tomar esse tipo de ação, sim", diz. Assim como ele, houve quem também tentasse métodos tão mirabolantes quanto um chip.
Em Santa Catarina, um apicultor instalou cadeados na colmeia após o vizinho ter 145 colmeias furtadas, em 2017. Em São Carlos, interior de São Paulo, outro apicultor organizou as caixas com abelhas bem próximas umas das outras. Caso houvesse uma tentativa de roubo, as abelhas da caixa ao lado poderiam ferroar um bandido solitário.
Na busca por uma solução mais técnica, Gustavo encontrou uma abordagem pacífica: orientou o cadastro de colmeias junto a órgãos ambientais para gerar um número de identificação. O procedimento é de praxe, mas nem todos eram cadastrados e poderia tornar uma investigação mais difícil.
Nessa altura, os crimes chamaram a atenção das autoridades. Em Maringá, no Paraná, a polícia investigou e encontrou material de apicultura roubado, em 2017. No ano seguinte, na cidade mineira de Nova Era, dois suspeitos foram presos durante a "Operação Zangão", da Polícia Civil.
Aqui nós tivemos um caso, em Sidrolândia [em Mato Grosso do Sul], em que houve justamente a colaboração entre os colegas apicultores e chegaram no ladrão. Gustavo Nadeu Bijos
Adriano instalou uma câmera em sua propriedade e toda a noite acordava com as colmeias reviradas. Mas no caso do Adriano quem derrubava as colmeias não era um ladrão. Era um tatu-canastra. O animal tradicionalmente se alimenta dos insetos voadores. O proprietário da fazenda, onde Adriano tinha suas colmeias, sugeriu que ele matasse o inusitado ladrão. Mas Adriano passou a usar as câmeras escondidas para monitorar os tatus.
O bando dos caubóis de zangão
Com a solução do roubo de colmeis em Sidrolândia e a união dos apicultores, Gustavo sentiu que era cada vez menos um caubói solitário e acreditava mais na força do enxame.
Na internet, começou a dar aulas e a gravar vídeos com orientações sobre apicultura e produção de mel. Tornou-se professor. Com o amigo Adriano, treinou apicultores de graça em Mato Grosso do Sul e tornou a vida dos ladrões de colmeia mais difícil.
Eu gosto da frase de que o apicultor é o guardião da humanidade: nós cuidamos das abelhas, elas produzem alimento, polinizam e ajudam a sustentar o planeta. Sem abelha, sem comida. Gustavo Nadeu Bijos
Reportagem Marcos Candido | Edição Fred Di Giacomo |
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