Enterro, cremação ou até 'virar adubo': existe forma certa de pós-morte?
Estima-se que a população mundial já esteja na marca de 8 bilhões. Pouco se pode prever sobre o futuro de cada um desses habitantes do planeta, mas uma coisa é certa: todas essas pessoas, em algum momento, irão morrer.
Pode soar estranho falar assim, mas é pensando no pós-morte, mais necessariamente em causar menos impacto com a partida, que empresas como a Recompose nos EUA criaram uma espécie de cápsula que age na compostagem "de seres humanos" ajudando na deterioração orgânica ao regular os índices de carbono e nitrogênio.
Na Itália, os arquitetos italianos: Anna Citelli e Raoul Bretzel criaram a Capsula Mundi, outra inovação em forma de cápsula biodegradável que tem como objetivo substituir os tradicionais caixões de madeira. Já a startup holandesa Loop desenvolveu o ecocaixão, feito de micélio, uma rede de fibras finas, o componente também é capaz de neutralizar substâncias tóxicas e fornecer nutrição para as plantas que crescem ao seu redor. O material do caixão se decompõe em seis semanas e ele auxilia na decomposição do corpo, acelerando o processo e permitindo que a natureza absorva nutrientes.
Mas será que ser enterrado é mais sustentável do que ser cremado? E o que existe no Brasil no ramo funerário quando se fala em "enterro sustentável"?
Existe enterro "sustentável" no Brasil?
No Brasil, a Valfer Tecnologia desenvolveu o Sistema de Cemitério Ecológico, uma inovação que é incorporada aos túmulos verticais, permitindo a decomposição natural dos corpos por meio da desidratação e evaporação do necrochorume. Essa tecnologia é amplamente adotada em diversos cemitérios no país.
O próprio Rei Pelé foi sepultado em um cemitério vertical que tem um sistema de tubulação que evita a contaminação do solo e dos lençóis freáticos, que ocorre, tradicionalmente, com o processo de decomposição do corpo.
"As substâncias tóxicas usadas nos caixões e no embalsamento dos corpos e o chorume (poluente) liberado na decomposição dos corpos infiltram nos solos e lençóis freáticos contaminando-os", explicou a geógrafa Lucila Freire para reportagem de Ecoa. De acordo com pesquisa realizada em 600 cemitérios, do geólogo Leziro Silva, entre 15% a 20% deles apresentam contaminação do subsolo pelo necrochorume. Quando em contato com a água, esse necrochorume pode causar febre tifóide e hepatite infecciosa. Nesse sentido, o tratamento de água e esgotos sanitários são fundamentais para evitar a proliferação de doenças originadas pela contaminação do solo em cemitérios.
Por esses motivos, os enterros sustentáveis, não convencionais — como as cápsulas desenvolvidas nos EUA, Itália e Holanda — são uma alternativa de impacto ambiental positivo, pois "diminui o uso de terras para sepultamento, evita o desmatamento de áreas para a construção de cemitérios, economiza energia, reduz os custos com a manutenção de cemitérios e, principalmente, evita a poluição dos solos e lençóis freáticos", afirma Lucila.
Em Cabrália Paulista, cidade do oeste paulista, conhecida por ser a 'capital do caixão' já existem pessoas pensando em uma "morte mais verde". Lá, o repórter de Ecoa Marcos Candido colheu depoimentos de profissionais da indústria de urnas funerárias sobre ideias sustentáveis (alças de caixão removíveis) ou não tão sustentáveis assim (caixões de plástico), que marcaram a cidade. Você pode acompanhar essa história no vídeo que abre essa reportagem.
Quais os benefícios de um enterro sustentável?
A Recompose, empresa que criou a cápsula de compostagem, afirma que o método tem o potencial de reduzir em uma tonelada as emissões de carbono em comparação com a cremação ou o enterro tradicional.
As emissões de dióxido de carbono desempenham um papel significativo nas mudanças climáticas, uma vez que contribuem para o efeito estufa, que retém o calor na Terra. Ou seja, até quando morremos contribuímos para o aquecimento global.
Além disso, os enterros tradicionais consomem recursos, como madeira, cimento, terra e tecido e deixam seus dejetos na natureza podendo contaminar lençóis freáticos e o solo. Os defensores da compostagem humana afirmam que essa abordagem não apenas é mais sustentável, mas também mais viável em áreas urbanas onde o espaço para cemitérios é limitado.
A aprovação desse procedimento em Nova York foi considerada um avanço significativo para tornar a morte ecológica mais acessível em todos os Estados Unidos, afirmou um provedor do serviço chamado Return Home, em entrevista ao New York Post.
Por outro lado, algumas pessoas têm preocupações éticas sobre o destino do solo resultante da compostagem. Bispos católicos do estado de Nova York expressaram oposição à legislação, argumentando que os corpos humanos não devem ser tratados como "resíduos domésticos".
E a cremação? É mais sustentável do que um enterro?
A resposta não é simples nem direta. Segundo estudo comparativo do impacto ambiental entre cremação e sepultamento, divulgado no 30º Congresso Nacional de Saneamento e Meio Ambiente, não se pode garantir que a cremação gera um menor impacto ambiental do que o sepultamento porque os processos são completamente diferentes e, portanto, difíceis de comparar.
No entanto, os resultados obtidos no trabalho evidenciaram que, aparentemente, o sepultamento gera um maior impacto ambiental do que a cremação, principalmente quanto às alterações da qualidade do solo e das águas subterrâneas.
Um corpo em processo de decomposição, quando sepultado, começa a gerar gases já nos primeiros dias de sepultamento, podendo levar anos. Geralmente os fornos crematórios possuem sistemas eficientes para controle da poluição atmosférica, evitando altas concentrações de poluentes. Além disso, a legislação ambiental relacionada a esta técnica é mais rigorosa em comparação ao controle das emissões geradas no sepultamento. Gabriela Cavion, engenheira ambiental.
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