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Famílias do sertão baiano fazem cerveja de umbu com ajuda de energia solar

Caio Mendonça
Imagem: Caio Mendonça

Adriana Amâncio

Colaboração para Ecoa, no Recife (PE)

15/07/2023 06h00

Cerca de 280 famílias do sertão baiano, região de clima semiárido, onde as chuvas se concentram em quatro meses do ano, usaram a criatividade para transformar frutos locais em produtos como cerveja, sucos, doces e geleias para gerar renda para a comunidade.

Em 23 estados e até em outros países, como Alemanha, França, Áustria e Itália, já há clientes que se renderam ao sabor marcante da cerveja feita a partir do umbu e ao aroma e ao frescor da geleia de maracujá da Caatinga.

As famílias de agricultores são integrantes da Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc) e trabalham a terra de maneira sustentável, sem uso de defensivos químicos, sem promover desmatamento e usando a água de modo racional, por meio da irrigação por gotejamento.

Depois do cultivo, a cooperativa também transforma os frutos em produtos na agroindústria. E toda a estrutura funciona à base de energia renovável, gerada por um sistema fotovoltaico que funciona com captação de luz solar.

"A nossa produção é toda de acordo com os critérios necessários para garantir a certificação de produção orgânica", afirma Dailson Andrade, coordenador de vendas da Cooperativa. Para a região semiárida, essa cadeia produtiva livre de defensivos químicos e de desmatamento faz a diferença.

Desertificação

O estudo "Áreas Prioritárias de Restauração da Caatinga", divulgado na revista Journal of Applied Ecology, aponta que metade dos 60 milhões de hectares que compõem o bioma foi desmatado. Esse desmatamento gerou outro problema grave, que é a a desertificação, que, segundo o relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), de 2021, atinge uma área três vezes maior do que o estado do Rio de Janeiro.

Sabores da caatinga - Coopercuc - Coopercuc
Famílias cooperadas trabalham na agricultura orgânica e depois na agroindústria
Imagem: Coopercuc

De acordo com Dailson, em cada safra, as famílias da cooperativa lucram, em média, R$ 1.987, ou seja, um salário mínimo e meio. Em seguida, na agroindústria, uma equipe formada por 15 trabalhadores, dos quais cinco são cooperados, põe a mão na massa e transforma os frutos em produtos.

Na etapa seguinte, os produtos são distribuídos por 23 estados do Brasil, por meio de uma rede de revendedores apreciadores de sabores exóticos e apoiadores da produção orgânica. "As vendas por meio dessa rede responde por 90% da nossa receita e a venda por e-commerce corresponde a 1%", explica Dailson.

Curiosidade pelo sabor exótico

A primeira exportação aconteceu em 2006. Antes disso, as próprias famílias passaram a oferecer degustações em feiras como forma de divulgar os produtos e conquistar os clientes pelo estômago.

A curiosidade é o que desperta o cliente para experimentar as iguarias. O agricultor diz que as pessoas se surpreendem com uma cerveja feita de umbu, mas quando provam se encantam com o sabor.

Sabores da caatinga - Caio Mendonça - Caio Mendonça
Cooperados fizeram degustações em feiras para apresentar os sabores exóticos a turistas
Imagem: Caio Mendonça

"Muita gente diz que no Sertão não dá para viver, mas a gente [Coopercuc] é resultado do trabalho que mostra que é possível conviver com o Semiárido. Nós provamos, com a nossa história, que é possível aproveitar os frutos daqui, produzir de forma sustentável e gerar renda", afirma Dailson.

Além do sabor, os produtos têm um significado forte para a cultura local, segundo ele. O umbu possui raízes que armazenam água durante o período de estiagem, mantendo a planta viçosa e saudável. Essa característica fez do fruto um símbolo do povo sertanejo, também estocam água e alimento para manterem suas raízes fincadas na terra mesmo nos períodos de estiagem.

Trabalho e renda perto de casa

Por muito tempo, a agricultora Marluce Gonçalves da Silva, de 44 anos, que mora na comunidade Caldeirão dos Lalaus, área rural do município de UaUá, teve que sair da sua terra para trabalhar fora. "Na nossa região sempre teve dificuldade com água para beber, cozinhar, lavar roupa. A gente tinha que andar muito para buscar essa água", recorda a agricultora.

Ela conta que, ao fazer parte da cooperativa , descobriu alternativas para conviver com a escassez hídrica e foi incentivada a produzir. "Eu recebi um bioágua [sistema de reúso de água] e um mini sistema de irrigação e fui incentivada a começar a produzir", explica. Inicialmente, ela plantou forragem animal e viu o resultado: os animais gordos e nutridos mesmo na estiagem.

Ao lado do irmão, ela cultiva uma área com maracujá da Caatinga e fornece para a Cooperativa. Em 2022 ela também plantou e comercializou umbu. A renda tem sido o sustento de Marluce e do filho.

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