'Papa, a Igreja não fala de racismo?': Os missionários antirracistas na JMJ
"Papa, porque a Igreja Católica não fala do racismo?". Essa seria uma das perguntas que a líder de diversidade, equidade e inclusão Patrícia Jesus de Lima faria ao Papa Francisco, caso tivesse frente a frente com o pontífice.
Head de Diversidade e Inclusão da Furia, organização brasileira de eSports, ela foi convidada pela Educafro para liderar um grupo de 18 jovens que foram até a Jornada Mundial da Juventude, que termina hoje em Lisboa, para questionar a Igreja Católia sobre o que chamam de "passividade em relação a temas raciais".
"A religião fez parte da construção da sociedade que temos. É difícil entender uma organização que também molda, se omite a ajudar. É como diz a [cantora] Priscilla Alcantara: existe uma incoerência da fé que diz que Deus é amor, mas usa esse mesmo Deus em nome do temor contra determinados povos", diz Patrícia.
Enviados antirracistas para a JMJ
A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um encontro dos jovens de todo o mundo com o papa. Missas, vigílias e sequências de orações e celebrações marcam o evento, além de ações que debatem algumas pautas sociais, como sustentabilidade, finanças, educação e saúde.
De olho nas questões raciais, a Educafro enviou a comitiva liderada por Patrícia para incluir na JMJ debates e assuntos relacionados à população negra e indígena no país e no mundo.
No grupo de Portugal, há pessoas de diferentes frentes, como líderes de empresas, além de responsáveis de algumas entidades do terceiro setor, movimentos sociais, de membros do setor público e privado.
Com média de idade em 24 anos, os porta-vozes das minorias sociais brasileiras são quilombolas, indígenas, pessoas negras e das periferias de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas gerais, Goiás e Maranhão
Poucos negros na JMJ
Para Patrícia, a ideia de estar presente não é necessariamente prestigiar o evento ou fomentar as ações da Igreja, mas intervir nos debates que naturalmente são rasos.
Um dos exemplos citados por ela é o próprio evento. "Quando olhamos à nossa volta, não vemos muitas pessoas negras na jornada. É triste, mas é a realidade", comenta. "O nosso papel aqui é abrir conscientização".
Na prática, o grupo da Educafro está ativamente engajada nas rodas de debate, com posicionamentos sobre a discriminação de povos latino-americanos na religião e também do descaso da religião em relação às pautas sociais, como o machismo, o racismo.
Além disso, os enviados brasileiros entrevistam padres negros para compreender a perspectiva deles sobre as ações da igreja no sentido racial, além de criar relações com pessoas negras de diferentes partes do mundo a fim de de conhecer suas ações sociais e fortalecer a luta empreendida pela instituição no Brasil.
Deus é amor, mas na JMJ há homofobia e racismo
Apesar da esperança e do trabalho realizado na JMJ, desde que a comitiva da Educafro chegou em Lisboa, a equipe testemunhou situações de racismo religioso e estrutural, como um episódio de homofobia durante uma entrevista com um padre, além de terem sido alvos de acusações infundadas de roubo.
"Essas experiências revelam que o racismo está profundamente enraizado no público que frequenta o evento, e grande parte disso se deve à falta de diálogo aberto", resume Patrícia.
Ela defende que a igreja tem responsabilidade pela forma como seus seguidores se manifestam.
Para criar uma comunidade justa e não discriminatória, é fundamental trabalhar questões básicas como papel social, educação e diversidade.
Caso esses aspectos não sejam abordados adequadamente, será difícil estabelecer uma comunidade que promova a igualdade e a inclusão.
"O mundo se modifica o tempo todo. E a religião é parte fundamental dessa modificação. Precisamos nos atualizar e acolher as pessoas, independente de suas individualidades".
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