Ambientalista salva crustáceos da extinção em mangue da Baía da Guanabara
Um derramamento de óleo no final da década de 1980 devastou um mangue localizado em plena Baía de Guanabara, na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro. O petróleo com cobertura de 10 cm a 12 cm acabou com qualquer possibilidade de vida para os crustáceos que, até então, viviam na região.
Quase 20 anos depois do desastre, o hoje ambientalista e técnico em meio ambiente da Fiocruz Roberto Viana, 52 anos, que nasceu naquela região, percebeu um indício de vida do mangue. "Em 2007, passeando com o meu pai, vi dois buracos do uca [espécie de caranguejo]. Pelo formato, era um casal", conta ele a Ecoa.
Os olhos dos dois brilharam. "Já que estes sobreviveram, era possível repovoar." E ele arregaçou as mangas. Escolheu algumas áreas, tirou o lixo e o óleo, cercou e depositou crustáceos fêmeas comprados na época da desova para formar viveiros reprodutivos.
Roberto não está de acordo com a venda na época do defeso (que é o período reprodutivo), mas "como estava comprando para o repovoamento não me sentia culpado".
Repovoamento
De 2010 a 2016, ele fez doze viveiros. Protegidas, as fêmeas desovavam e, semanalmente, o ambientalista soltava, em média, 60 animais na natureza, entre chama-marés, caranguejos-uçá, aratus e os guaiamuns.
O número de exemplares começou a crescer espontaneamente e logo o local também viu a volta de várias aves, que aproveitavam a sombra e o alimento novamente disponível para fazer ninhos, além de peixes, que voltaram a freqüentar o mangue para a desova.
A toda essa ação ele deu o nome de 'Projeto Caramangue'. E o objetivo do trabalho era justamente recuperar, ainda que 20 anos depois, a área que foi afetada pelo derramamento de óleo.
A lama engrossou, o lixo ficou acumulado e as margens de areia, pretas.
Roberto Viana
Nessas duas décadas até a chegada do projeto, a região foi um depósito de lixo vindo da Baía de Guanabara e as praias não se recuperaram mais.
Natural do mangue
Nascido na Ilha do Catalão, atualmente uma reserva ambiental da Ilha do Fundão, aos 4 anos Roberto ganhou um cesto de caranguejos do pai, que pescava para se sustentar. "Sem querer, eu os matei. Fediam e, para afastar o cheiro, espirrei desodorante", conta ele aos risos. Após o episódio, o pai o ensinou sobre os crustáceos e o presenteou com outro cesto.
Os aprendizados e a paixão por esses bichos fizeram com que o menino passasse a freqüentar o mangue sozinho. A partir dos 6 anos, já vivendo na Vila Residencial, aproveitava a companhia dos crustáceos para estudar. "Só assim consegui tirar boas notas na escola", relembra.
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Quero receberNa infância, antes do assoreamento provocado pelo desastre ambiental, ele frequentava a praia e mergulhava no mangue. Frustrado com o derramamento de óleo, Roberto, que já trabalhava como técnico de informática, no início de 1990 se mudou de lá e só voltou 15 anos depois, naquele passeio com o pai.
Casado e com dois filhos, ele já gastou até o dinheiro das compras domésticas para comprar crustáceos para o repovoamento do mangue.
Uma vez, estava na Maré para fazer a feira e comprei tudo em guaiamum [espécie de caranguejo]. Levei uma bronca ao voltar com as mãos vazias".
Roberto Viana
Árvores frutíferas e répteis
Em 2016, com a reprodução espontânea dos crustáceos e a chegada de outros bichos, o ambientalista deixou 'Caramangue' aos cuidados de voluntários e criou um novo projeto. O 'Horto da Vila' cultiva mudas para o reflorestamento de terrenos abandonados.
Com a ajuda de alunos da vizinha Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), limpou um terreno antes utilizado como lixão e o matagal deu lugar a árvores frutíferas e tanques de peixes.
Entusiasmado, Roberto mostra o local e comemora a natureza renascida ali. "Aqui tem goiabeira, ingá de corda, graviola [...] salsinha, coentro [...]. De peixe tem o espada, paulistinha [...]. Também já vi o réptil ameiva [...]. Passam por aqui sabiá, mico, canário [...]".
Enquanto guiava a reportagem de Ecoa pelo local, foi interrompido por um policial. "Ele quis comprar um coqueiro", explicou na volta. Além de doar plantas para associações de moradores, como a do Complexo da Maré, com o objetivo de incentivar espaços verdes em favelas, a iniciativa vive da venda de mudas.
Abandono e resistência
"O período de glória do projeto foi entre 2018 e 2019, quando ele funcionava com voluntários da universidade", conta. Após a pandemia, a ajuda diminuiu. O mangue, que está vivo novamente, foi de novo invadido pelo lixo da Baía de Guanabara e apenas Roberto resiste no local e mantém o seu horto.
Apesar do cansaço, o ambientalista não tem a intenção de parar. Ele vê o mangue como um berçário da fauna. "Com o repovoamento de crustáceos e o rio limpo, a cadeia alimentar gira. Peixes aparecem, aves fazem ninhos. Ver o mangue vivo é a minha maior alegria."
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