Greenwashing: raspadinha une direita e esquerda contra o governo francês

A França lançou nesta segunda-feira (23) seu novo jogo de raspadinha, "Missão natureza", destinado a financiar cerca de 20 projetos de proteção ou de restauração ambiental selecionados pelo Escritório Francês da Biodiversidade. O bilhete unitário para raspar vendido nas lotéricas custa 3 euros (R$ 16), dos quais o governo irá recolher 43 centavos para destinar ao projeto estampado na raspadinha. A iniciativa, que poderia parecer bem intencionada, vem sendo duramente criticada.

A Autoridade Nacional de Jogos denuncia um estímulo ao vício, principalmente porque a "loto da biodiversidade", como já está sendo chamada, irá atrair um público jovem, preocupado com a redução drástica das espécies e as mudanças climáticas.

Estudos científicos mostram que os jogos de azar são viciantes, e os jovens particularmente vulneráveis a esse tipo de compulsão. O projeto chegou a ser rejeitado pelo Senado francês em novembro de 2022, mas voltou a figurar na nova lei orçamentária aprovada em 2023.

Com esta nova raspadinha, o governo francês pretende vender 14 milhões de bilhetes e arrecadar 6 milhões de euros (R$ 32 milhões). Os apostadores podem embolsar até 30 mil euros (R$ 160 mil) em prêmios. Os interessados podem escolher o projeto ambiental que desejam apoiar escaneando o código QR impresso no cartão de papelão, que dá acesso a imagens e informações sobre as áreas que serão beneficiadas.

Entre as iniciativas que podem inspirar uma boa ação do público estão a preservação de manguezais nas ilhas francesas do Caribe, a proteção do peixe-boi-marinho reintroduzido da Guiana Francesa, a reabilitação das populações de tartarugas de Hermann, na região do Var (sul), o salvamento da floresta marinha de Posidonia, no mar Mediterrâneo ou a recuperação da maior ave de rapina da Europa, o abutre barbudo.

Este projeto específico, apoiado pela Liga Francesa para a Proteção das Aves, tem como objetivo restaurar a população dessa ave de rapina nos Alpes e nos Pirineus franceses, que havia caído para apenas 79 casais reprodutores em 2021.

Direita e esquerda: unidos na crítica

Acusação de greenwashing. Parlamentares de direita e de esquerda condenam a nova raspadinha. Para a senadora socialista Angèle Prévilleo, o governo está fazendo greenwashing ao vender a ideia que adquirir um simples bilhete de raspadinha pode ajudar a conter a destruição acelerada de espécies animais e vegetais. O senador de direita Jean-François Husson chamou o projeto de "irresponsável".

Greenwashing: parece 'verde', mas não é. A tradução do termo é "lavagem verde" e se refere a ações que parecem amigáveis ao meio ambiente, mas, na verdade, apenas vestem essa roupagem de sustentáveis.

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A federação francesa de associações de defesa do meio ambiente - France Nature Environnement - denuncia um "golpe contra a biodiversidade" que gerará "centenas de milhares de cartões de papelão revestidos de plástico".

A entidade criou uma campanha paralela ao lançamento da nova raspadinha para alertar os jovens e defensores do meio ambiente sobre um jogo que considera "uma enganação, uma fraude" do Estado, principal acionista da empresa Française de Jeux, responsável pela comercialização do produto.

Contribuição à causa

Em seu site, a federação mostra que se o apostador fizer uma doação semanal de 3 euros à entidade, na mesma frequência do sorteio da raspadinha, em um ano a pessoa irá contribuir com 131,04 (R$ 700) euros para projetos ambientais, já descontados os impostos.

Por outro lado, com o bilhete de raspadinha em que apenas 0,43 centavos de euro são destinados à nobre causa de defesa da natureza, ao mesmo custo de 3 euros por semana, em um ano o apostador contribuirá com a módica soma de 22,36 euros para projetos ambientais.

"O restante vai para o caixa do Estado e da Française des Jeux", alerta a federação.

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