Suíça é condenada em decisão histórica sobre responsabilidade climática

A Suíça violou a Convenção Europeia dos Direitos Humanos com sua inação climática, decidiu hoje (9) um tribunal superior da Europa, em uma decisão histórica que estabelece a responsabilidade dos Estados diante do aquecimento global.

Ao incriminar a Suíça, a corte gera jurisprudência para os 46 países membros do Conselho da Europa.

"Este é apenas o início em termos de processos climáticos. Em todo o mundo, cada vez mais pessoas levam seus governos aos tribunais para que sejam responsabilizados por suas ações", celebrou a ativista climática sueca Greta Thunberg, que aguardou as decisões do lado de fora do tribunal acompanhada de outros jovens.

O TEDH (Tribunal Europeu dos Direitos Humanos) deu razão à associação suíça "Idosos pela Proteção do Clima", mas rejeitou outras duas demandas, apresentadas por seis jovens portugueses contra 32 países e por um ex-prefeito francês.

A associação suíça, formada por 2.500 mulheres com média de idade de 73 anos, denunciou ao tribunal com sede em Estrasburgo, nordeste da França, que as "deficiências" da Suíça em termos de proteção climática "prejudicam gravemente o seu estado de saúde".

No caso da Confederação Suíça, esta é a primeira vez que a corte, que aplica a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos, condena um Estado por sua falta de iniciativas para combater as mudanças climáticas.

O TEDH decidiu, por uma maioria de 16 votos contra um, que a Suíça violou o artigo 8 da Convenção (direito ao respeito pela vida privada e familiar) e, por unanimidade, uma violação do artigo 6 sobre o acesso a um tribunal. A corte afirmou que o artigo 8 consagra o direito à proteção efetiva pelas autoridades do Estado contra os graves efeitos adversos da mudança climática sobre a vida, a saúde, o bem-estar e a qualidade de vida.

Esta primeira decisão sobre a responsabilidade climática dos Estados era muito aguardada porque poderia estabelecer jurisprudência nos 46 países membros do Conselho da Europa, a organização internacional à qual pertence o tribunal pertence.

"O TEDH estabeleceu que a proteção do clima é um direito humano", declarou a advogada da associação suíça, Cordelia Bähr.

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Para Joie Chowdhury, da organização Center for International Environmental Law (Centro de Direito Ambiental Internacional), a sentença "influenciará a ação climática e os litígios sobre o clima em toda Europa e muito além".

"Não deixa espaço para dúvidas: a crise climática é uma crise de direitos humanos e os Estados têm a obrigação de agir com urgência e eficácia", acrescentou.

Stéphanie Caligara, advogada da ONG Global Legal Action Network (Rede Ação Legal Global), afirmou que o país precisará "revisar toda uma série de elementos que, até agora, não foram suficientemente ambiciosos em termos do que a Suíça deveria estar fazendo para cumprir suas obrigações, sob a Convenção Europeia de Direitos Humanos e sob a lei de mudança climática".

Anne Mahrer, copresidente da Associação Idosas pela Proteção do Clima, indicou que o próximo passo é pressionar para a Suíça aplicar a decisão. "São 300 páginas onde está escrito muito claramente tudo que é preciso colocar em prática e que não é feito", contou ao enviado especial da RFI a Estrasburgo, Raphael Moran, ao deixar a corte. "Um país como a Suíça não ter orçamento climático nem objetivo claros para chegar à neutralidade de carbono em 2050 é inacreditável. Um país rico, industrializado há tantas décadas, deveria ser exemplar - e não é", criticou.

Mahrer lembrou ainda que essa inação climática causa problemas para outros países do mundo: "Quem paga mais caro são os países do sul, que menos contribuíram para a catástrofe", acusou.

"Vitória para todo o mundo"

A jornada foi agridoce para os outros demandantes, em particular o caso do grupo de jovens portugueses com idades entre 12 e 24 anos.

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"A vitória delas (das suíças) também é uma vitória para nós e uma vitória para todo o mundo", declarou a portuguesa Sofia Oliveira, de 19 anos, "decepcionada" com o revés em seu caso.

Após os incêndios que devastaram Portugal em 2017 e mataram 114 pessoas, Oliveira e outros cinco jovens decidiram levar ao tribunal de Estrasburgo todos os países da União Europeia, além de Noruega, Suíça, Turquia, Reino Unido e Rússia, por sua inação contra a mudança climática.

A decisão do tribunal sobre a petição apresentada pelo grupo de portugueses era aguardada com expectativa, mas a corte alegou que falhas processuais justificavam a rejeição do pedido, já que os requerentes não haviam esgotado as vias judiciais disponíveis em Portugal antes de recorrerem à corte europeia.

A reclamação foi dirigida não apenas contra seu próprio país, mas também contra todos os estados da UE (União Europeia), além de Noruega, Suíça, Turquia, Reino Unido e Rússia - 32 países no total. Eles os acusaram de serem responsáveis pelas consequências atuais e futuras da mudança climática. As ondas de calor, os incêndios florestais e a fumaça de queimadas estão, segundo eles, afetando suas vidas, seu bem-estar e sua saúde mental.

Uma das jovens portuguesas que moveram a ação contra os países europeus, Catarina Mota, de 23 anos, ressaltou que a luta "não acaba aqui". "Obviamente, sentimos muito orgulho de todo o trabalho que foi feito durante sete anos - não apenas nosso, mas todos os cientistas e advogados que estavam conosco. E todo esse trabalho não foi perdido. Isso é apenas o começo", afirmou.

"É muito cedo para dizer concretamente o que vamos fazer a partir de agora. Precisamos de um tempo para refletir", complementou Martim Agostinho, de 21 anos.

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No caso do ex-prefeito ecologista de Grande-Synthe, Damien Carême, que denunciou a França no tribunal, ele não foi reconhecido como vítima por residir atualmente na Bélgica como eurodeputado.
Carême, que teme que sua localidade acabe sob as águas do Mar do Norte, já havia apresentado o caso como prefeito em 2019 ao Conselho de Estado francês, que deu razão à prefeitura em julho de 2021, mas rejeitou sua demanda individual.

Recorde de calor registrado

A decisão foi divulgada no mesmo dia em que o observatório europeu do clima Copernicus alertou que o mundo registrou um recorde de calor pelo 10º mês consecutivo em março.

O mês passado registrou uma temperatura média que foi 1,68°C superior à registrada em um mês de março típico durante o período pré-industrial (1850-1900).

Os países signatários do Acordo de Paris sobre o clima de 2015 se comprometeram a limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC na comparação com o período.

* Com informações de AFP e RFI

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